Vasco Araújo conseguiu: vamos ver o vídeo “não censurado” sobre o Portugal dos Pequenitos

Artista vai exibir a versão "não censurada" do vídeo Parque Temático, em que aborda o colonialismo a partir de esculturas que se encontram no Portugal dos Pequenitos. Inauguração é a 4 de Março em Lisboa

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Vasco Araújo

O artista Vasco Araújo vai exibir, a partir de 4 de Março, em Lisboa, a versão "não censurada" do vídeo Parque Temático, sobre o Portugal dos Pequenitos, em Coimbra, realizado após obter autorização da Fundação Bissaya Barreto (FBB).

Num comunicado enviado à agência Lusa, o artista revela que o projecto — uma exposição sobre a iconografia colonialista e a liberdade humana que inclui o vídeo — vai estar patente de 4 de Março a 21 de Abril, com entrada livre, no Teatro Cão Solteiro, em Lisboa. A história deste projecto remonta a 2016, quando Vasco Araújo pediu, e não obteve, da FBB — gestora do parque temático Portugal dos Pequenitos, criado em 1940, para o público infantil, num projecto do arquiteto Cassiano Branco — autorização para filmar as esculturas de africanos que se encontram à entrada dos pavilhões das antigas colónias portuguesas.

Vasco Araújo recorda que, mesmo não podendo filmar — porque "o pedido foi indeferido sem ser apresentada qualquer justificação", que classificou como "um acto de censura", acabou por apresentar, em Maio do ano passado, o vídeo, a negro, inserido na exposição E daqueles que não queremos saber, no Laboratório de Curadoria do Colégio das Artes da Universidade de Coimbra. De acordo com o artista, depois de várias insistências, recebeu, em Janeiro deste ano, autorização da Fundação para filmar, e obteve as imagens que pretendia.

Partindo da iconografia colonial existente no Portugal dos Pequenitos, em particular as esculturas que se encontram à entrada dos pavilhões das antigas colónias portuguesas, a peça em vídeo "aborda os problemas da existência e da liberdade do homem". "Ao tratar, também, as lógicas por detrás das relações de poder vigentes durante o colonialismo e o pós-colonialismo, mostra-nos o perverso jogo de submissão construído a partir da história da escravatura e segregação congelada na estatuária que representa figuras de negros, para sempre presos nessa condição", descreve o autor.

No Espaço do Cão Solteiro, Vasco Araújo vai mostrar "a versão não censurada de Parque Temático e toda a documentação associada a um processo institucional revelador do pensamento vigente". Em Maio, questionada pela agência Lusa, a FBB confirmou o indeferimento do pedido do artista, sublinhando que estava prevista uma expansão e requalificação do parque, em que serão introduzidos novos conteúdos sobre o património edificado, nomeadamente nos pavilhões das ex-colónias, Madeira e Açores. Como justificação da recusa, a fundação argumentou que "decidiu suspender, até ao final do ano, o atendimento de pedidos externos, visando quaisquer produções de exploração temática sobre o parque actual, para concentrar a estratégia de comunicação, em exclusivo, na divulgação da nova imagem e do projecto de expansão do Portugal dos Pequenitos".

Vasco Araújo nasceu em 1975, em Lisboa, e recebeu o Prémio Novos Artistas EDP em 2002, após a formação na Maumaus - Escola de Artes Plásticas e Fotografia e a licenciatura na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa. A reflexão sobre o colonialismo, um dos principais temas do seu percurso artístico, está patente noutros trabalhos, como os recentes Demasiado pouco, demasiado tarde, "É nos sonhos que tudo começa" e O inferno não são os outros, em que apela a obras de autores como Pepetela (Yaka) e Isabela Figueiredo (Cadernos de Memórias Coloniais).

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