No hotel do chocolate, derrete-te e dorme bem

Será isto um sonho doce ou um pesadelo com calorias que nos perseguem por todo o lado? É possível haver chocolate a mais? Se calhar é, mas não neste mundo encantado de Viana do Castelo. Deixa as dietas de lado e mergulha de cabeça nesta Fábrica do Chocolate em forma de hotel, restaurante e museu

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Adriano Miranda

Puseram-nos no quarto Willy Wonka. É verdade, há um quarto Willy Wonka. Sem Oompa-Loompas. E mal chegámos deixaram-nos logo comer um dos chocolates que enchem o boião de vidro na recepção. E no quarto há mais bombons. Bombons num prato pequeno. Um pequeno chocolate pousado ao lado. Isto é um sonho? Ou é um pesadelo? É possível haver chocolate a mais? Se calhar é, mas não na Fábrica do Chocolate, em Viana do Castelo. Há chocolate por todo o lado, mas na medida certa. Vamos lá mergulhar de cabeça.

Voltamos ao início: puseram-nos no quarto Willy Wonka e carregamos a chave magnética até ao primeiro piso sem sabermos exactamente o que vamos encontrar. Na Fábrica do Chocolate, os quartos são temáticos, sempre em torno do cacau e do chocolate, e quem leu ou viu o filme Charlie e a Fábrica de Chocolate, de que o mestre chocolateiro Willy Wonka é a personagem central, sabe que só pode estar prestes a entrar numa orgia de doces. Repito: sem Oompa-Loompas (e se não sabem do que estou a falar, vão ler o livro ou vejam o filme e logo percebem por que é importante não ter estas criaturas por perto).

Uma das paredes do quarto recria a Sala de Chocolate por onde Johnny Depp (Wonka na versão cinematográfica de Tim Burton, de 2005) passeia as crianças que encontraram o bilhete dourado que lhes deu acesso à fábrica do milionário doceiro. Deitados na cama temos, à nossa frente, a recriação da cascata de chocolate, os relvados cobertos de bengalas doces, de drageias de chocolate, de cogumelos de açúcar… Uma árvore de bengala doce, às riscas vermelhas e brancas, destaca-se, a três dimensões, da pintura, e é entre os seus ramos que está a televisão. 

Mas o universo Willy Wonka não se fica por aqui — as mesas-de-cabeceira são réplicas da cartola que ele usa, na casa-de-banho está gravada, a negro, a silhueta do mestre chocolateiro, e numa das paredes do chuveiro a sua frase: “If you want to view Paradise, simply look around and view it”. Assim mesmo, em inglês, que é como quem diz: “Se queres ver o Paraíso, simplesmente olha à tua volta e vê-o”. Para que nos sintamos, sem sombra de dúvida, como visitantes da fábrica de chocolate de Wonka, a cabeceira da cama é uma reprodução do famoso bilhete dourado que cada criança tinha de encontrar dentro de um chocolate para poder aceder ao misterioso mundo que se escondia para lá dos portões da fábrica.

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Suite Casa Grande Chocolatier DR

A parede a imitar chocolate na recepção já nos fizera sorrir, mas o quarto colorido, as toalhas com a fachada do hotel gravada e os produtos de higiene de cacau deixam-nos a derreter. E ainda não provámos o chocolate frio que nos ofereceram e que há-de ser servido numa taça de pé fino, uma bebida que se podia comer às colheres, de textura macia e fresca, pontuada por crocantes pepitas de chocolate negro. E ainda não visitámos o museu. E ainda não participámos no workshop de bombons recheados. E ainda não jantámos. E ainda não tomámos o pequeno-almoço. E ainda não experimentámos a chocoterapia. Ufa!

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Adriano Miranda

Goretti Silva, uma das três mulheres por trás da recuperação do antigo edifício da fábrica Avianense, na Rua do Gontim, diz que, no hotel, “não se oferecem dormidas, mas experiências”. E di-lo no final da visita ao museu interactivo, instalado no piso -1 do prédio que ainda mantém a fachada, totalmente recuperada, da fábrica que se instalou ali em 1922 (tinha sido criada em 1914) e que fechou as portas em 2004.

Aliás, Pedro Araújo, o chef do restaurante do hotel, dissera-nos, ainda há pouco, que na história da transformação do antigo edifício da Avianense num novo espaço, a primeira ideia a ser delineada foi a do museu. “Mas ele só ocupava o -1, pelo que foi preciso pensar o que fazer com o resto do prédio.” E assim surgiram o hotel e o restaurante. A loja, onde se podem encontrar chocolates da Arcádia e da Casa Grande, da Caffarel, da Valrhona ou da Amatller, abriu cerca de um mês e meio depois da inauguração do hotel.

O museu é, por isso, um espaço que os hóspedes do hotel não podem deixar de visitar, até porque, para eles, o acesso é gratuito. Tudo no museu é interactivo — há ecrãs tácteis, um filme de animação em 4D, a simulação de uma roça, explicações sobre a forma como o cacau se expandiu pelo mundo e sobre os mestres chocolateiros, e a oportunidade de descobrir como e quando é que o chocolate foi representado, do cinema à literatura, passando pela música. No final, novos e velhos são convidados a fazer de conta que estão a produzir um verdadeiro chocolate, saindo do museu com uma pequena tablete na mão.

“Fizemos um trabalho de pesquisa muito grande em torno do chocolate, do cacau e do edifício”, explica Pedro Araújo, enquanto desfia um conjunto de informações de que nos vamos querer lembrar da próxima vez que formos comprar chocolate. É preciso verificar, por exemplo, que ele tem, no mínimo, 25% de cacau, e que não tem qualquer gordura hidrogenada e, de preferência, também não tem gorduras vegetais (a União Europeia só permite até 5% destas últimas na confecção do chocolate). Também é divertido pensar, enquanto deixamos que um quadradinho de chocolate se derreta na boca, que só no final do século XIX é que o chocolate passou a ser consumido desta forma, uma vez que até aí era apenas uma bebida.

Depois da visita ao museu, juntamo-nos aos aprendizes que querem descobrir como se fazem bombons recheados e antes de dormir provamos as delícias que o chefdesenvolve, diariamente, no restaurante da Fábrica do Chocolate. No final de um dia cheio de experiências doces, a cereja no topo do bolo (ou do chocolate): dormimos bem. Mesmo não sonhando com chocolates.

Como ir

Não vale a pena deixar a Fábrica do Chocolate para ir jantar. Aliás, podes bem arrepender-te se o fizeres, porque a cozinha que o chef Pedro Araújo desenvolve no restaurante do hotel é de comer e chorar por mais. E sempre com um traço de chocolate, o que não significa que seja doce. Mas é bem provável que encontre grué de cacau em todo o lado (a própria semente do cacau, depois de fermentada, seca e torrada), além de uma série de produtos da região. Quando leva o arroz de robalo para a mesa, Pedro Araújo afirma: “Pescado na nossa costa, apresento-lhe o pescador e a filha dele, quando quiser.” O naco de carne barrosã é tenro, mas as batatas fritas da Apúlia que o acompanham roubam a cena, de tão boas que são. O gelado de polpa de cacau com grué é leve e seria o fim ideal para uma noite que começara com várias entradas, mas o chef diz que não podemos ir embora sem provarmos o bolo-mousse, que é tão bom quanto bonito. Ao pequeno-almoço, a cozinha da Fábrica do Chocolate também não desilude. A estrela é o pão de grué criado pelo chef, mas os bolos caseiros, os vários sumos naturais disponíveis e a fruta laminada coberta com o chocolate que sai da fonte instalada sobre a mesa também ajudam a passar largos minutos à mesa.

Workshops

Há vários workshops a decorrer na Fábrica do Chocolate ao longo do ano. Desde a decoração de bolos à confecção de bombons recheados, passando pelas bolachas de Natal, o melhor é consultar o site do hotel (www.fabricadochocolate.com) e ver as datas e condições do próximo. Mas fica já a saber que derreter chocolate de cozinha em banho-maria, encher formas e deixá-lo arrefecer não é, de todo, a forma correcta de fazer bombons. Isso, aliás, nem são bombons. Há todo um universo relacionado com a temperatura certa e a consistência que é preciso aprender, se algum dia quiser mesmo oferecer uns bombons a sério, feitos por si, aos amigos e família.

Chocoterapia

No 2.º piso do hotel, num espaço discreto, que podia ser apenas mais um quarto, está instalada uma sala onde são aplicadas massagens, esfoliações e envolvimentos corporais. Tudo, é claro, à base de chocolate. Os preços das massagens de corpo inteiro começam nos 50 euros, mas é possível fazer massagens localizadas ou experimentar, por exemplo, a esfoliação com o sugestivo nome de Tentação de Chocolate (45 euros). Na prática, só tens de deixar que a tua pele seja limpa de tudo o que tem a mais com a pasta granulosa à base de chocolate. Depois disto, não é aconselhável que te vás sentar num sítio com formigas por perto, porque o aroma a chocolate vai permanecer contigo durante bastante tempo.

Preços: Variam entre os 90 e os 130 euros, para um quarto duplo. As suites familiares, que recebem até quatro pessoas, estão disponíveis a partir dos 260 euros.

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