Gordos e flácidos

O meu irmão mais novo, criança com a mesma idade mas em 2014, anda de I-pod na mão e joga no I-pad. É o mesmo conceito, mas eu ainda perdia algumas calorias

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Marcus Kwan/Flickr

Vivi a minha infância na década de 90, época em que o telemóvel era algo extraordinário e a Internet crescia exponencialmente em popularidade.

Na altura, com 10 anos, andava de skate e jogava futebol. O meu irmão mais novo, criança com a mesma idade mas em 2014, anda de I-pod na mão e joga no I-pad. É o mesmo conceito, mas eu ainda perdia algumas calorias. Se calhar é por isso que o miúdo tem os dedos das mãos musculados, a barriga flácida e a pele cor de leite.

Tecnicamente falando, para além dos riscos futuros de doenças cardiovasculares, inerentes à falta de exercício numa fase prematura do crescimento, também há um acréscimo da probabilidade de vir a sofrer de osteoporose. Porquê? Facto interessante. A pouca exposição ao sol provoca um decréscimo de produção de vitamina D por parte das nossas células, o que diminui o nível de renovação dos nossos ossos. Ah! Não nos podemos esquecer da influência que o “não apanhar sol” irá ter na vida social futura das crianças da nossa sociedade. A minha excelente conclusão é que crianças sem cor, e no futuro adolescentes com a mesma condição, se irão ainda tornar adultos branquinhos e flácidos, que não vão conhecer alguém que goste deles. Para além disso, devido aos músculos que os futuros adultos vão criar nos dedos por passarem o dia a mexer no telemóvel, o próximo desporto rei vai ser o polegar-de-ferro.

Outro dia cheguei a casa e deparei-me com o meu irmão, já referido anteriormente, a jogar I-pad no sofá, de pijama. Isto num sábado à tarde, com o sol a bater na janela. Peguei no puto e fomos dar uma volta ao skate park para, como se diz de uma maneira “cool”, “get the blood pumping”. O do miúdo, não o meu, que eu sou um gajo desportista dos anos 90.

No fundo acho que é mesmo esse o papel de um irmão mais velho. O de perceber quando os seus entes queridos menos experientes se estão a tornar iguais aos outros gordos e brancos, não deixar que vejam vídeos de skate no computador, mas sim obrigá-los a ir partir um braço a fazer um “drop”.

Onde é que se imaginava, há uns anos, um miúdo que ainda imberbe andar a passear com um dispositivo electrónico cujo valor ronda os 600 euros, a mandar “posts”, “comments”, “likes”, “likes” nos “comments”, “likes” nos “posts” e “pikes” nos “losts”. A mandar “tweets”, instagrams e vines. Nasceram sem sequer perceber como é que as coisas funcionam e, ainda pior, sem interesse de saber. Se para mim o normal era acordar e ir ver o Pokémon na televisão, para a criança do século XXI é normal ir ver se a fotografia do Instagram fez sucesso ou não. Não será prematura uma criança que se preocupa com a sua imagem na sociedade? Estes são problemas que normalmente surgem mais tarde.

Talvez faça parte da evolução da espécie. Talvez o facto de termos evoluído tanto em tão pouco tempo esteja a refletir-se nos mais inocentes e ingénuos.

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