Chuvada, perdão, Paredes de Coura: um festival molhado, mas, diz-se, abençoado

Esta quarta-feira muitos festivaleiros terão respirado de alívio. Apesar do céu cinzento, a chuva parou, finalmente. Em Coura, aguenta-se a intempérie à boa moda portuguesa: o "desenrasca"

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Os sacos do lixo ajudaram a contornar obstáculos Paulo Pimenta

Galochas de mil cores (das habituais verde-tropa às da Hello Kitty), uma caixa de Macieira na cabeça, guarda-sóis, sacos do lixo como sapatos, como chapéus, como coletes e ponchos, até uma touca de natação. A necessidade aguça o engenho e, como tal, a chuva no Festival EDP Paredes de Coura, que só deu tréguas já a noite ia longa, despertou, e bem, a criatividade dos festivaleiros.

"Sacos do lixo nos pés é melhor do que nada", dizia, ao início da noite de terça-feira, Marta, provavelmente ainda a convencer-se a si própria. A lama que se acumulava no campismo assim o ditou. Veio do Porto dia 8, juntamente com três amigos (Sónia, Manel e Pedro), reunidos no festival pela sexta vez. Ainda tiveram a sorte de "apanhar sol à beira-rio", mas agora estão rendidos aos "sobretudos" que Sónia ainda conseguiu comprar na vila de Paredes de Coura (os impermeáveis acabaram por praticamente esgotar durante o segundo dia). No acampamento já foram mais precavidos - "o ano passado tivemos uma má experiência, por isso este ano já trouxemos um toldo decente", conta Manel, que se diz "ansioso" pelo último dia do festival.

"Umbrella, ella, ella, eh, eh, eh", ouviu-se, a dada altura, no concerto de PAUS. Nada mais apropriado. "Paredes é Coura é isto", repete, entusiasmado, Hugo Machado, relembrando a mítica, de tão abençoada, edição de 2004. Já Luís Namora não parece tão optimista: "nunca vi tanta chuva assim aqui". Mas não esmorece: "há ainda mais espírito". Chega um outro amigo, João, e grita: "somos o grupo das tartarugas ninja". Percebe-se: estão de verde da cabeça aos pés, vestidos a preceito para esta noite, das galochas ao impermeável. "Equipámo-nos. Já sabíamos que isto podia acontecer", diz Luís. E o que vieram ver? "Mulheres nuas, cavalos e anões." Balanço, de um desiludido João: "Temos encontrado anões e mulheres nuas; os cavalos nem por isso."

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Rui e Piruças, companheiros em Paredes de Coura desde 2008 Amanda Ribeiro

A chuva não parava e, no campismo, muitos cruzavam a saída à procura de um leito sem água: o carro. Isto apesar de a própria organização ter anunciado que um parque de estacionamento da vila estaria aberto para os festivaleiros.

Piruças, o verdadeiro

Sorte do Piruças, o cão amarelo de Rui Ferreira, totalmente de plástico, totalmente impermeável, a caminho de se converter numa mascote quase oficial de Paredes de Coura. "Em 2008, fui a todos os festivais menos ao Sudoeste (a que nunca hei-de ir) e decidi trazer o cão a passar férias comigo a Paredes de Coura. E a partir daí nunca mais deixou de vir comigo", conta o protector dono, enquanto, carinhosamente, afaga a pálida barriga do animal, onde escreveu o seu número de telefone para eventuais emergências (ou desencontros).

"Já é um marco do festival", orgulha-se. "O ano passado o próprio Jarvis Cocker [dos Pulp] perguntou, a meio do concerto, o que era aquela coisa amarela e o público respondeu: é o Piruças." Claro que a fama tem sempre sequelas. Rui não poupa as acusações: "este ano anda aí um falso Piruças". Como? "É uma cabra com um chapéu a tapar a cara para as pessoas pensarem que é o Piruças", critica. "É um 'wannabe', é 'fake'", argumenta, admitindo, no entanto, que ainda não houve lugar para o confronto.

O P3 bem viu, por escassos momentos, uma pequena cabra de peluche a sobrevoar o público, que se acotovelava no Palco - coberto - Vodafone FM, mas não conseguiu encontrá-la em tempo útil. Vislumbrou, isso sim, um obstinado balão do Sponge Bob, que - invejámos - teve no ar uma vista privilegiada para todos os concertos.

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