Subida do IVA será "trágica" para sector cultural privado

Proposta do OE prevê subida da taxa de IVA dos espectáculos de 6 para 23%. Produtores privados dizem que reduzir a despesa, cortando no orçamento geral, seria mais justo

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As produtoras falam de uma previsível quebra gigantesca nas vendas Enric Vives-Rubio

Uma quebra “gigantesca” nas vendas, menos espectáculos disponíveis, menos público, mais desemprego no sector e mais dificuldades. São estes os efeitos previstos pela indústria cultural em relação à anunciada subida do IVA dos bilhetes de espectáculos – música, teatro, dança, cinema, espectáculos desportivos  de 6 para 23%.

A proposta consta no Orçamento de Estado (OE) para 2012 e apenas deixa os livros, que vão continuar a ser taxados a 6%, de fora. “Já estamos a viver um momento em que as famílias têm pouco dinheiro disponível, em que têm que poupar e por isso investem menos em cultura. Se ainda aumentarmos o preço, estamos a matar o produto”, analisa o produtor de espectáculos Álvaro Covões.

É que, reforça José Barreiro, também produtor musical, “não há margem para não reflectir este aumento do IVA no preço dos bilhetes”. Ou seja: “Quem acabará por pagar esta diferença são as pessoas”.

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Os produtores de espectáculos dizem que preço dos bilhetes vai, necessariamente, aumentar Manuel Roberto

Sector reúne-se quinta-feira

Na próxima quinta-feira, os profissionais do sector vão juntar-se para debater a apresentação de medidas alternativas. Ao P3, Álvaro Covões adiantou que uma das medidas propostas deve ser a “diminuição das verbas do OE geral”, mantendo a taxa de IVA inalterada.

“Sabemos que os tempos são difíceis e percebemos que temos de fazer esforços, mas os sacríficos têm de ser comuns. O que nos parece mais indicado é reduzir a despesa e não aumentar a receita”, diz, lamentando o facto de o sector privado sair mais prejudicado.

Álvaro Covões já fez as contas. Analisou os dados do Instituto Nacional de Estatística dos últimos cinco anos e chegou à conclusão de que um aumento do IVA de 6 para 23% significaria um encaixe de 23 milhões de euros para o Estado. Por isso, a solução que propõe tem um número: “Reduzir a despesa em 23 milhões”.

Bilheteiras são fonte de receita

O produtor lembra que “a maioria das pessoas ligadas à cultura vive exclusivamente de bilheteiras” e que, por isso, uma medida destas seria “trágica”. José Barreiro concorda: “À partida, o aumento do IVA aumenta a receita do Estado. Mas o número de empregados do sector vai diminuir, vai haver desemprego, as pessoas vão comprar menos bilhetes. É mais uma medida avulsa e não estruturante, como é preciso”.

É uma realidade que será especialmente sentida pelas produtoras mais pequenas, diz Vanda Noronha, da Chifre. “Se aumentarmos o preço dos bilhetes vamos perder o público que temos, por isso, quem vai acabar por suportar isto somos nós e as bandas”, analisa.

 

Isto pode significar a “desistência de novos músicos”, lamenta. Em Lisboa, “é cada vez mais difícil arranjar salas para bandas pequenas”, porque, em média, “uma sala de 500 pessoas não custa menos de 1000 euros” para uma noite. “É praticamente insustentável”. 

Medida não afecta todos igualmente

O sector da cultura em Portugal é “altamente subsidiado”, diz Álvaro Covões. Para ele, “não é correcto penalizar o sector todo e manter estes oásis [estruturas estatais] com a sua fortuna”. Não defende a extinção das estruturas, que “são boas”, mas acusa-as de estarem “dimensionadas ao nível de um país rico, que não somos”.

Por isso, a gestão das estruturas públicas tem de mudar, diz Covões, que não aceita a ideia de as bilheteiras “não pagarem o custo do espectáculo”: “Faz lembrar o Khadafi, quando contratava a Shakira para os amigos verem”, compara.

Notícia actualizada e corrigida no dia 17 de Outubro, às 19h50

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