Do Cabedelo à Afurada, um passeio à descoberta da biodiversidade

O Cabedelo é uma das praias mais bonitas de Gaia, inserida numa reserva natural onde se observam espécies migratórias.

Foto

No final dos 18 quilómetros de costa marítima, há outros 18 quilómetros de rio para descobrir. Partimos da Praia do Cabedelo, onde o mar se junta ao rio, à descoberta das espécies que habitam na Reserva Natural Local do Estuário do Douro.

No extenso areal do Cabedelo destaca-se a área rochosa das chamadas Pedra Altas ou Pedras do Maroiço, por baixo da antiga seca do bacalhau, associada a antigas práticas de rituais de fecundidade. A Pedra de Escorregar é um desses lugares onde jovens moças tinham o hábito de escorregar do alto do penedo até ao chão, procurando assim a desejável fertilidade. Reza a lenda que, neste local, existia uma moura que um dia quando passeava pelo Cabedelo foi enfeitiçada por uma velha bruxa, transformando-a numa sereia. O feitiço apenas seria quebrado se uma mulher virgem lhe servisse pão e leite, numa das suas raras aparições no alto da Pedra, de 100 em 100 anos.

As rochas que se vão destacando consoante as marés, a confluência do mar e do rio, fazem da Praia do Cabedelo, uma das praias singulares do concelho de Vila Nova de Gaia. Um bom ponto de partida para um percurso entre a costa marítima e a zona ribeirinha, com o mar a perder de vista para o rio.

A pé ou de bicicleta siga o percurso da ciclovia junto ao rio, entre Canidelo e a Afurada, onde vai encontrar muitos motivos de interesse. Paredes-meias com a Praia do Cabedelo está a Reserva Natural Local do Estuário do Douro, que desde 2012 integra a Rede Nacional de Áreas Protegidas. Além de permitir que as espécies possam reproduzir-se ou servir de habitat para novas espécies, a reserva natural desempenha também uma função essencial na educação ambiental e de consciencialização para as questões da biodiversidade e de preservação da natureza.

Situada entre a zona arenosa do Cabedelo e a margem sul do Rio Douro, na zona da Afurada, este é o habitat de várias espécies migratórias como os guarda-rios, corvos-marinhos, garças-reais, garças brancas e papa-ratos, os maçaricos-das-rochas e rolas-do-mar, tarambolas e seixoeiras, piscos-de-peito-azul e gaivotas de diversas espécies, entre muitas outras aves.

Pode observar estas espécies migratórias que habitam a Baía de São Paio num dos dois postos de observação situados na Reserva e ainda ficar a conhecer a história destas aves e das suas rotas migratórias. Junto à baía está prevista a criação do parque de São Paio, projetado pelo arquiteto paisagista Sidónio Pardal, no âmbito do plano de recuperação “Encostas do Douro” levado a cabo pela autarquia.

À descoberta da história da vila piscatória da Afurada

Nos antigos armazéns de pesca funciona o Centro Interpretativo do Património da Afurada, que convida a uma viagem pela história da Afurada e das suas gentes.

Centro Interpretativo do Património da Afurada

“No museu recolhemos peças que valorizamos e, através dessas peças, tentamos chegar ao conhecimento de como era a vida na Afurada noutros tempos. Esse trabalho é complementado com a recolha das memórias das pessoas que cá vivem e que têm características muito próprias definidas pela própria vida que levavam neste local”, explica Francisco Saraiva, coordenador do Centro Interpretativo aberto desde 2013, com o objetivo de fazer a ponte entre a reserva natural e a comunidade local, e também como forma de preservar a história e tradição da Afurada.

Fruto dessa colaboração com os afuradenses, parte dos objetos que integram a coleção do centro foram doados por gente da terra, inclusive a coleção do padre Joaquim Araújo que dedicou 50 anos da sua vida à Afurada.

Aqui encontram-se alguns objetos que foram usados na pesca do bacalhau que enviava os homens durante meses para longe de casa e que perdurou até ao 25 de Abril. Objetos curiosos como os rádios usados nas comunicações dos barcos, uma sonda manual composta apenas por um peso preso a um fio para detetar a profundidade, ou os baús pintados à mão com os nomes da família inscritos e que serviam para levar a comida para alto mar. Assim como as embarcações usadas - existe uma exposição destes barcos em miniatura com mais de 30 exemplares – e também uma réplica em tamanho real da última caíca, o “Varina da Afurada”, e um exemplar da “Barca da Pregação”, uma embarcação que todos os anos, por altura das festas em honra de São Pedro da Afurada, estaciona no cais para que seja feita a bênção aos pescadores.

Neste espaço pode ainda ver a coleção malacológica de Marciano Azuaga, composta por um conjunto de conchas de todo o mundo e também de búzios, e ainda algumas exposições temporárias de fotografia ou pintura de diferentes autores que retratam esta vila pelos seus olhos. Até 9 de novembro está patente a exposição de aguarelas “Afurada, o Povo e o Mar”, de Américo Gonçalves

O coordenador do Centro Interpretativo acredita que, num contexto de mudança económica da Afurada, muito mais voltada para o turismo, o centro ganha ainda mais relevância como elemento de preservação das memórias e da identidade dos afuradenses. “O museu é o interface entre quem vem de fora e quem vive aqui, para que quem nos visita se sinta um bocadinho parte da comunidade. Um dos nossos principais objetivos é conseguir transmitir a outras gerações aquilo que nos foi legado pelas gerações anteriores, principalmente no que diz respeito à pesca”, conclui.

O centro está aberto todos os dias, incluindo fins de semana e feriados, tem entrada gratuita e muitas atividades para os miúdos e para toda a família, como as horas do conto ou a exibição de filmes.

Motivos de sobra para visitar a Afurada, terra de pescadores e de peixe fresco servido nos restaurantes locais – mais recentemente foi inaugurado o Mercado da Afurada – e a ofertas na restauração foram reforçadas com os novos restaurantes “Armazém do Peixe” e o “Madureira’s” . Termine o passeio a ver o por do sol na Douro Marina ou apanhe o barco Flôr do Gás, que faz a travessia entre a Afurada e Massarelos e desfrute da vista maravilhosa sobre o rio.