Crime da discoteca Luanda já tem autores

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Público

A ausência de um acordo de extradição entre Portugal e Cabo Verde é um dos principais obstáculos à detenção dos responsáveis pelo atentado à discoteca Luanda que provocou a morte de sete pessoas e quarenta feridos, em Abril do ano passado.

Este problema poderia ser superado, mesmo não havendo acordo, se não se verificasse também aqui a habitual resistência que a generalidade dos países oferece à extradição de cidadãos nacionais para serem julgados no estrangeiro. É neste quadro que foi aberta pelo Governo português uma negociação conduzida por via diplomática para superar este impasse, num caso em que não foi pedida qualquer extradição, emitido um mandado de captura internacional ou expedida uma carta rogatória a pedir a colaboração das autoridades locais.

Os suspeitos da autoria do atentado foram identificados poucos dias depois, mas de imediato se colocou a questão da sua localização. Enquanto em Lisboa o caso continuava a produzir alguns estilhaços, que viriam a culminar numa forte polémica dentro do próprio Governo devido às declarações de Fernando Gomes, então ministro da Administração Interna, os suspeitos escapavam para fora do país. Fernando Gomes, recorde-se, afirmou que se esperavam detenções nas "próximas horas", mas estas nunca viriam a concretizar-se, provocando um conflito com o ministro da Justiça, António Costa. Fernando Gomes clarificou mais tarde, já depois de ter sido demitido do Governo, que as declarações então proferidas tiveram por base documentos oficiais da PSP e a luz verde do próprio António Guterres.

A Polícia Judiciária realizou depois do atentado diligências no continente africano visando a localização dos quatro operacionais envolvidos no golpe contra a discoteca Luanda, acabando por concluir que estes se encontram em Cabo Verde. Mas não está excluída a possibilidade de um dos indivíduos envolvidos se encontrar na África do Sul.

Os investigadores suspeitam que a concorrência que a discoteca Luanda estava a fazer a um estabelecimento análogo tenha sido o móbil do crime. A PJ ainda estará a recolher indícios para requerer a emissão de um mandado de captura internacional contra os suspeitos, alegadamente membros da comunidade de imigrantes cabo-verdianos em Lisboa.

Este caso tem-se revelado de grande complexidade, devido à lei de silêncio que impera nos meandros da noite e às polémicas que tem desencadeado em esferas políticas. Na semana passada, coube a vez ao primeiro-ministro, António Guterres, de fazer uma declaração controversa na Assembleia da República que gerou uma reacção violenta do bastonário da Ordem dos Advogados, António Pires de Lima. "Os criminosos da discoteca Luanda estão identificados, são cidadãos estrangeiros, não estão em território nacional e há aspectos diplomáticos delicados a este respeito", garantiu Guterres.

Não configurando uma violação objectiva do segredo de justiça, como chegou a ser sustentado por alguns advogados, a declaração tem aspectos enigmáticos, nomeadamente a alusão aos "aspectos diplomáticos delicados". As primeiras especulações apontaram para a possibilidade de um dos suspeitos ser angolano e portador de estatuto diplomático. Esta versão, apesar de alimentada em sectores governamentais, acabou por ser afastada aos poucos. Colocou-se depois a dúvida sobre se haveria ou não um pedido de extradição. De acordo com dados recolhidos pelo PÚBLICO, não foi feito qualquer pedido de extradição, não foi emitido nenhum mandado internacional de captura, nem expedida uma carta rogatória para as autoridades cabo-verdianas, instrumento que seria essencial para que a polícia local fizesse alguma diligência.

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