Bloco assume que as suas promessas eleitorais violam metas orçamentais

Manifesto eleitoral com base na reestruturação da dívida e não cumprimento do Tratado Orçamental será construído até ao final de Junho.

Foto
Enric Vives-Rubio

A reestruturação da dívida pública e a rejeição das metas do Tratado Orçamental serão os princípios de base do manifesto eleitoral que o Bloco de Esquerda vai levar às legislativas. Sem medos, Catarina Martins diz que o partido vai assumir, “de forma clara” perante os portugueses que aquilo que propõe “não cumpre as metas orçamentais” impostas por Bruxelas.

“Não nos propomos cortar no orçamento do Estado, a cada ano que passa, mais de 5 mil milhões de euros. Rejeitamos esse corte e assumimos a responsabilidade de pôr no primeiro plano da negociação europeia a reestruturação da dívida do país”, descreveu a porta-voz bloquista este domingo, em conferência de imprensa, depois da reunião da mesa nacional do Bloco.

Sobre o manifesto, Catarina Martins realçou que as propostas do documento, que estará em preparação até ao final de Junho, pretendem mostrar que é possível “construir um programa fora dos constrangimentos da austeridade” e romper com a “bipolarização entre duas formas de fazer mais austeridade” protagonizadas pela coligação de direita e pelo PS.

Porque, argumentou a bloquista, na verdade, as propostas socialista e da direita partem do mesmo quadro: cumprir o tratado e não mexer na dívida. O que significa que “mantêm, as duas, a obrigação de o país cortar o equivalente a 5,5 mil milhões de euros no orçamento, o equivalente ao que se gasta na escola pública”.

As bandeiras do Syriza, na Grécia, eram muito idênticas às do BE, mas o Governo de Atenas não conseguiu convencer os parceiros europeus a aprovarem uma renegociação da sua dívida. Catarina Martins reconhece as “dificuldades” de uma proposta da natureza da do Bloco, e defende que é preciso é “assumir a responsabilidade das propostas” que se fazem. “Não estamos a fazer promessas fáceis. O que não fazemos é promessas que sabemos que são desditas a seguir às eleições”, vincou.

Apesar dos obstáculos, tem esperança numa mudança de mentalidade a nível europeu. “É essencial no quadro europeu juntar forças para uma alternativa à austeridade. Quanto mais força tivermos nos governos e parlamentos nos diversos países contra a austeridade, quanto mais forças se levantarem pela urgência da renegociação da dívida e recusarem os constrangimentos da austeridade perpétua que o Tratado Orçamental impõe aos vários países, mais facilmente se poderá encontrar um caminho para a saída da crise.”

“Estes anos de austeridade fizeram a dívida pública aumentar até aos 130%. Considerar que ela é sustentável é uma irresponsabilidade”, defendeu ainda a porta-voz. Para logo a seguir admitir: “No Bloco não desconhecemos as dificuldades de, no actual quadro europeu, se propor uma política que vá contra a austeridade. Mas consideramos que essa é a única forma de proteger o país, de existir investimento, de haver criação de emprego e de defender o Estado social enquanto garante de igualdade e democracia.”

Catarina Martins enumerou a situação excepcional do actual cenário, com juros de 0%, o petróleo em preços historicamente baixos e o euro desvalorizado – mas nem assim Portugal criou emprego ou gerou o investimento necessário para fazer crescer a economia. “Se não foi possível neste quadro internacional, então permanecer na austeridade só irá aprofundar os problemas” e uma alteração de qualquer daqueles factores trata dificuldades acrescidas à economia. E depois das eleições, avisou a bloquista, levará o partido vencedor a renegar as promessas eleitorais. “Serão promessas com pés de barro.”

Para 30 de Maio está prevista a apresentação das grandes linhas do manifesto com as propostas sobre a reestruturação da dívida, política fiscal e sistema financeiro. No debate que se seguirá até à conferência nacional do Bloco, a 21 de Julho, serão desenvolvidas as propostas sobre o trabalho e a recuperação de direitos de trabalho – há dias o BE entregou um projecto de lei para a redução do horário de trabalho para as 35 horas semanais -, criação de emprego e eficiência do Estado social, igualdade de direitos e combate à corrupção, controlo público de monopólios. A mesa nacional reúne novamente a 5 de Julho para ratificar o manifesto.

Questionada sobre a posição do Bloco acerca dos apelos do Livre/Tempo de Avançar e do MAS para uma convergência à esquerda, Catarina Martins disse que o Bloco “tem respondido favoravelmente a todas a conversa para que tem vindo a ser solicitado” e que mantém “toda a abertura para todas as conversas”, mas esquivou-se a ser mais específica. “A pergunta não deve ser posta ao Bloco de esquerda. Deve ser posta a quem fala em diálogos à esquerda e que de facto ainda não foi capaz de dizer se assume ou não esses programas”, apontou.

E sobre se foram discutidas as presidenciais no encontro, Catarina Martins disse que o Bloco considera que o “essencial neste momento é o percurso para as legislativas” e que a decisão da mesa nacional é que só depois das legislativas o partido se deve pronunciar sobre as presidenciais.

Sugerir correcção
Ler 13 comentários