Quando se atravessa uma crise não se deve esquecer o Estado social, avisa Adriano Moreira

Livro O Direito ao Quotidiano Estável, do constitucionalista José Fontes, foi apresentado por antigo presidente do CDS e pelo presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz.

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Adriano Moreira Joana Bourgard

O antigo presidente do CDS Adriano Moreira disse na terça-feira que não se deve esquecer o Estado social em alturas de crise, sublinhando que a Constituição garante ensino e saúde gratuitos.

"Estamos a atravessar a maior das crises (...).Não nos devemos esquecer nunca de falar do Estado social, porque o Estado social é uma convergência de deveres que são normativos e a Constituição portuguesa até faz isso de uma maneira claramente normativa, porque diz: o ensino gratuito na medida do possível, a saúde na medida do possível", recordou.

Adriano Moreira falava na apresentação do livro O direito ao quotidiano estável - Uma questão de direitos humanos, do constitucionalista José Fontes, que teve lugar na Fundação Mário Soares, em Lisboa. "Neste momento, a negação do Estado social ofende todo o esforço no sentido de encontrar um paradigma comum", acrescentou, sublinhando que esse "esforço tem que ser igual para que todos possam construir a sua vida de acordo com o seu projecto".

A apresentação do livro esteve ainda a cargo do presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz, Alfredo Bruto da Costa, que considerou "extremamente grave" que os direitos "adquiridos e consagrados" estejam a ser "postos unilateralmente em causa".

"Discutem a sustentabilidade da segurança social, mas não discutem a obrigação de o Estado pagar pensões [em troca das contribuições que recebe]. Imaginem se em vez do Estado fosse uma companhia de seguros, o que acontecia? A gente levava-a para tribunal", exemplificou Bruto da Costa. “José Fontes pensa que há direitos que não podem regredir – e eu também. Uma crise pode recomendar o ajustamento da jurisprudência, mas nunca anular o Direito, como aconteceu entre nós".

Em O Direito ao Quotidiano Estável, José Fontes observa que a democracia sempre esteve ligada a níveis diversos de equidade e de justiça e à possibilidade de acesso a bens e a serviços primários por parte de todos. “Quando se coloca em crise o direito ao quotidiano estável coloca-se em causa o próprio regime democrático. Quando os Estados renunciam ao exercício da soberania que os povos com eles contrataram e o transferem, unilateralmente, para o sistema de negócios desaparecem os princípios da justiça e da equidade, ou pelo menos a sua percepção é perigosamente colocada em crise”, argumenta o constitucionalista, para quem não é razoável que as pessoas possam ser sujeitas a políticas que as impedem de responder com dignidade às exigências mínimas do dia-a-dia. Por isso, defende, os Estados devem assegurar reservas, financeiras e não só, que garantam a manutenção de tais direitos.

“Em função do fraco desempenho económico imaginamos o regresso à escravatura ou ao trabalho sem salário? Aceitaremos no futuro a eliminação dos dias de descanso ou das férias?”, interroga José Fontes, que exige maior transparência nos gastos do Estado. “Todos devemos conhecer os valores pagos a consultores e a grandes escritórios de advogados, as transferências efectuadas para entidades privadas (como os partidos políticos), os benefícios fiscais atribuídos a particulares e as entidades que fraudulentamente solicitam o reconhecimento do interesse público”.

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