De que é feita a crise do FC Porto?

Para uma equipa que venceu oito títulos nas últimas 12 títulos épocas, ser segundo (ou terceiro) equivale sempre a ser o primeiro dos últimos, mas já começa a ser cíclico surgir um ano “horribilis” no Estádio do Dragão

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AFP

Vinte e uma jornadas, 43 pontos, quatro derrotas, 3.º lugar na classificação e um fosso de nove pontos de distância para o Benfica, que lidera o campeonato. Falamos do FC Porto de Paulo Fonseca? Não. Em 2009-10, com Hulk, Falcao, Guarín, Bruno Alves, Meireles, Belluschi e Rolando, era este o cenário dos “dragões”, comandados por Jesualdo Ferreira, no início de Março. Quatro anos depois, esta parece uma realidade demasiado longínqua para os adeptos portistas. Jesualdo aguentou até ao final, mantendo a regra de Pinto da Costa, que nunca despediu nenhum treinador após Janeiro. Fonseca tem a mesma resistência?

A 10 de Junho de 2013, quando o FC Porto anunciou que Fonseca era o substituto de Vítor Pereira, foram poucos os adeptos portistas que torceram o nariz à escolha de Pinto da Costa. Apesar de ter conquistado o título nas duas épocas em que liderou os “dragões”, com apenas uma derrota, Vítor Pereira foi sempre mal-amado pela grande maioria dos adeptos “azuis e brancos”. Para o seu lugar, embora alguns considerassem a aposta “de risco”, chegava o “melhor treinador de 2012-13”, opinião quase consensual após Fonseca levar o Paços de Ferreira a um inimaginável 3.º lugar. Nove meses depois, numa cena tantas vezes repetida no mundo do futebol, Fonseca passou de bestial a besta. Mas de que é, afinal, feita a actual crise do FC Porto?´

Para uma equipa que venceu oito dos 12 títulos nacionais disputados neste século, ser segundo (ou terceiro) equivale sempre a ser o primeiro dos últimos, mas já começa a ser cíclico surgir, no meio de tanto sucesso, um ano “horribilis” no Dragão. José Mourinho chegou ao FC Porto após a equipa terminar a época de 2001-02 no terceiro lugar e necessitou de reconstruir o plantel (entraram Pedro Emanuel, Nuno Valente, Paulo Ferreira, Maniche, Derlei), André Villas-Boas precisou de reforços cirúrgicos (João Moutinho, James Rodríguez, Otamendi) para conseguir resgatar uma equipa portista herdada de Jesualdo sem rumo.

É verdade que Paulo Fonseca não terá os mesmos “skills” de Mourinho ou Villas-Boas, mas ao contrário dos seus antecessores, que entraram no FC Porto sem perder nenhum trunfo do plantel anterior e tiveram a injecção de reforços de qualidade inquestionável, o (ainda) treinador portista encontrou uma equipa que já dava, na época passada, sinais de fraqueza. E perdeu Moutinho, James e Atsu numa primeira fase, Otamendi e Lucho em Janeiro.

A subtracção de qualidade do plantel portista nos últimos anos é uma evidência. Da equipa que, há menos de três anos, maravilhou tudo e todos, já pouco resta. Olhando para o “onze” que Villas-Boas colocou em campo na final da Liga Europa, em Dublin, sobram Helton, Fernando e Varela. E que matéria-prima tem Fonseca agora?

A qualidade de Alex Sandro e Danilo é intocável, mas os dois brasileiros não têm substitutos e já levam três mil minutos nas pernas. Mangala é um dos mais promissores defesas do futebol europeu, mas não há memória de o patrão da defesa do FC Porto ser um jovem que assumiu essa responsabilidade aos 22 anos. Fernando continua a não saber jogar mal, mas em Janeiro tinha a cabeça em Inglaterra e o seu empresário já confirmou que o médio está de saída. Jackson disse em Novembro que tem a esperança de conseguir uma “boa transferência” e, desde que encerrou o período de transferência de Inverno, marcou um golo em oito jogos.

Estes cinco exemplos são apenas os mais óbvios da difícil gestão que Fonseca tem que fazer, mas o treinador está ilibado de responsabilidades? Olhando para a administração que tem sido feita do plantel, o técnico não se pode considerar apenas réu. É difícil de compreender a teimosia inicial de Fonseca nas opções para o meio-campo, onde o pecado mais flagrante foi a insistência em colocar Lucho em terrenos que não eram o habitat natural do argentino. Com Carlos Eduardo (e Quintero) como opção, Fonseca colocou o argentino fora do lugar e duplicou o erro ao apostar, de forma obstinada, em arranjar um parceiro para Fernando à frente da defesa. Os equívocos tácticos foram corrigidos, mas deixaram demasiadas feridas abertas e o treinador continua a pescar à linha (Josué, Herrera ou Licá), enquanto a concorrência utiliza um arrastão (Enzo Pérez, Gaitán ou Markovic).

Sem opções credíveis no plantel para substituir os “intocáveis”, Fonseca está num beco sem saída. O ambiente em torno da equipa torna-se, deslize após deslize, insuportável e, com o panorama para as próximas semanas bastante hostil (em apenas uma semana o FC Porto vai ter que defrontar o Nápoles, por duas vezes, e o Sporting), apenas os mais optimistas podem esperar que, uma equipa presa por arames, dê a volta à situação. Para já, a SAD “azul e branca” resiste, mas Fonseca dá cada vez mais sinais de fraqueza e, seja agora ou em Maio, a saída do (ainda) treinador do FC Porto parece irrefutável.

Seja qual for o capítulo seguinte, é claro que, em 2014-15, terá que começar quase tudo do zero no Dragão. Falta apenas saber se será colocado ao dispor do senhor que se seguir no banco “azul e branco”, as armas que Mourinho e Villas-Boas beneficiaram para devolver ao FC Porto a hegemonia do futebol português.

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