Os esqueletos no armário de Paulo Portas

É decisivo para Paulo Portas que, quando um dia terminar a sua liderança, o CDS não se transforme num cadáver político.

Oliveira do Bairro é este fim-de-semana transformado em local de primeiro plano da política nacional ao ser palco do 25º Congresso do CDS. Em vez de reunir o partido num grande centro urbano ou mesmo numa das cidades cuja câmara o seu partido ganhou nas autárquicas, Paulo Portas vai realizar a reunião magna do CDS numa das cidades que integram o círculo eleitoral de Aveiro, o “seu”, pelo qual tem sido eleito desde que, em 1995, pela primeira vez, se candidatou à Assembleia da República.

A escolha de Oliveira do Bairro para palco do congresso, embora seja uma questão menor, exemplifica como Paulo Portas gere o CDS: à sua imagem e semelhança. É um líder. Um chefe partidário que não deixa margem a hesitação nem a oposição. Dirige o partido sem que haja espaço para contestação interna. Lançou já uma nova geração e deu protagonismo político a vários militantes do CDS, sem nunca, porém, lhes dar espaço para voarem sós. Na presidência do CDS desde 1998, Portas apenas abriu mão da liderança em 2005, depois da derrota eleitoral provocada pelo desgaste do fim da coligação governamental com o PSD de Pedro Santana Lopes.

Num congresso surpreendente, quando tudo indicava que o sucessor indigitado Telmo Correia ia ser eleito e a noite ia alta no primeiro dia de trabalhos, José Ribeiro e Castro subiu ao palco para protagonizar uma candidatura alternativa e sair vencedor e líder do CDS por dois anos. Ribeiro e Castro mostrou que ainda havia vida partidária e que era possível gerar alternativas. É certo que foi então ajudado pelo facto de Paulo Portar ter saído das urnas derrotado por uma vitória eleitoral de José Sócrates que deu ao PS a primeira e única maioria absoluta deste partido. Mas a verdade também é que passados alguns meses Paulo Portas fez saber que queria o seu partido de volta.

Desde de 2007, Paulo Portas é assim líder, pela segunda vez, de uma organização político-partidária que tem moldado à sua imagem e semelhança. É essa a imagem que passa para a opinião pública. A de um partido onde todos ou quase todos parecem obedecer à voz e à vontade do chefe e onde mesmo os que têm pensamento próprio, autonomia de acção e capacidade de iniciativa, não se atrevem a fazer a mais pálida sombra ao líder. Mesmo António Pires de Lima, na entrevista que na quinta-feira deu ao PÚBLICO, ao declarar que não concorda com que Paulo Portas seja considerado “um eucalipto” que seca tudo em volta, admite implicitamente que essa leitura é feita.

Ora, é esse partido, o CDS cujas lideranças foram sendo episódicas e falhando enquanto projectos políticos, que Paulo Portas transformou no seu partido e que muitas vezes parece funcionar como um objecto telecomandado, que este fim-de-semana está em Oliveira do Bairro a glorificar o líder que conseguiu mesmo a proeza de ser a voz discordante na coligação governamental e que durante os últimos dois anos e meio marcou a oposição ao executivo de que faz parte. O líder que se atreveu a proclamar a sua demissão do Governo como “irrevogável” para, dias depois, ser projectado a vice-primeiro-ministro. O líder que os militantes do CDS sabem ser a sua bóia-de-salvação na agitada maré política que o partido enfrenta e venha a enfrentar. E que com ele podem até vir a afogar-se de vez já que cada vez mais a questão é a de saber o que será o CDS no dia em que Paulo Portas decidir sobre o seu futuro pessoal ou político para além do partido.

Na entrevista ao PÚBLICO, António Pires de Lima abre a porta de forma explícita a uma futura candidatura de Paulo Portas a Presidente da República. Uma ideia que só poderá parecer estranha a quem anda distraído sobre a política portuguesa e o que tem sido a carreira política de Paulo Portas. Mas, se se pode equacionar a hipótese de o actual líder do CDS vir a lançar-se na corrida a Belém, por exemplo em 2021, para que tal possa vir a acontecer há esqueletos no armário de Paulo Portas que ele tem de começar a enterrar. Não só para dentro do partido, mas também para o país.

É certo que dificilmente Paulo Portas conseguirá explicar-se e anular o efeito negativo provocado pelas alegadas suspeitas e as insinuações que sobre si pairam devido ao caso dos submarinos. Mas há situações em que Paulo Portas pode claramente fazer um esforço para que deixem de ser um problema. Entre elas está precisamente o facto de ter causado uma crise política com a sua demissão em Julho. Assim como é decisivo para Paulo Portas que, quando um dia terminar a sua liderança, o CDS não se transforme num cadáver político.

A expectativa que resta para Oliveira do Bairro, onde apenas é previsível que os delegados cantem hosanas ao chefe, é a de saber qual destas questões Paulo Portas quer e é capaz de começar a resolver este fim-de-semana.

Sugerir correcção
Comentar