Sud Expresso e Lusitânia perdem carruagem-restaurante

Ao fim de 125 anos acaba-se o serviço de restaurante a bordo do Sud Expresso. A partir deste domingo só se pode jantar sentado ao balcão

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Reduzir custos. Equilibrar contas. Estas são as razões que levaram a CP a acabar com a carruagem-restaurante no Sud Expresso e no Lusitânia Expresso, os comboios internacionais que ligam diariamente Lisboa a Hendaya e a Madrid.

Segundo fonte oficial da transportadora pública, esta decisão, que entra em vigor hoje, teve por base a “residual” utilização do restaurante, com um número médio de cinco refeições servidas por comboio. Sem a carruagem-restaurante, os dois comboios (que circulam acoplados entre Lisboa e Medina del Campo, seguindo depois um ramo para a fronteira francesa e outro para Madrid) passam a ter a um custo mais baixo, uma vez que o aluguer do material circulante tem em conta o número de veículos da composição. A CP explora o Sud sozinha e paga à homóloga espanhola Renfe o aluguer do comboio. No caso do Lusitânia a exploração é conjunta, pagando apenas metade do aluguer.

“A redução dos custos fixos terá, naturalmente, consequentes reflexos nos valores de tabela para os clientes, reduzindo os actuais preços das viagens”, diz a mesma fonte, adiantando que o serviço de refeições continua assegurado, mas agora apenas na carruagem-bar em lugares sentados ao balcão, como num snack-bar.

A título de exemplo, uma viagem entre Lisboa e Madrid em gran class (compartimento-cama com WC e duche privados), que ficava até aqui por 246 euros, passa a custar 120 euros devido à supressão da refeição. Já entre Lisboa e Hendaya o bilhete passa de 174 para 148 euros.

As carruagens-restaurante destes comboios internacionais eram as únicas que ainda circulavam em carris portugueses, desaparecendo assim uma tradição que remonta aos primórdios do caminho-de-ferro. Quando o Sud Expresso foi inaugurado, em 1887, as refeições a bordo eram servidas em talheres de prata e os passageiros – uma aristocracia endinheirada que viajava em luxuosas carruagens-cama – elogiavam a qualidade dos vinhos e da comida servida no restaurante.

Por toda a Europa, nos grandes expressos europeus cozinhava-se a bordo, em fornos alimentados a carvão (tal como as locomotivas) para servir almoços e jantares que constituíam o ponto alto das longas viagens. No séc. XIX, quando a viagem entre Lisboa e o Porto demorava 14 horas sobre carris, comia-se nas estações. Entroncamento e Pampilhosa guardam ainda hoje os espaços do que outrora foram restaurantes de luxo. Mas os primeiros rápidos da linha do Norte já passaram a incluir um vagão com cozinha e restaurante, tradição que durou até ao inícios dos anos 80 do século XX. Também os comboios para o Algarve levavam atrelados uma carruagem-restaurante, que só desapareceu nos ano 70.

Hoje as exigências em matéria de higiene e segurança alimentar e os custos com pessoal, tornaram incomportáveis a oferta destes serviços e a opção é o catering, como acontece na classe conforto do Alfa Pendular, em que a refeição é servida ao lugar.

O desaparecimento dos restaurantes no Sud e no Lusitânia podiam ser evitados se a empresa concessionária não fosse obrigada contratualmente a ter uma oferta de cinco pratos quentes quando, durante 100 anos, só houve dois pratos à escolha. Apesar da redução de custos prevista, não está estudado quantos clientes apreciadores do jantar a bordo se perderão. 

O Sud Expresso e o Lusitânia Expresso davam até há dois anos 8 milhões de euros de prejuízos, mas após a sua transformação em “comboio único” com um percurso comum entre Lisboa e Medina del Campo, o défice baixou para 2 milhões. Para isso também contribuiu a redução do número de carruagens que, a continuar, poderá levar à supressão do serviço gran class, ficando apenas as carruagens-cama e os lugares sentados.  O Sud sobrevive, mas com cada vez menos glamour. 
 

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