Vermeer restaurado graças a digressão japonesa regressa a casa

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"Mulher de Azul Lendo uma Carta" (1663-64) Rijksmuseum

O Rijksmuseum de Amesterdão está prestes a reaver uma das suas obras-primas, "Mulher de Azul Lendo uma Carta" (1663-64), de Johannes Vermeer. Depois de mais de um ano de digressão pelo Japão, a pintura do mestre holandês vai voltar a casa, onde será exposta a partir de 30 de Março. Nada de novo na cedência de obras a museus estrangeiros, não fosse o facto de esta digressão ter ajudado a financiar o seu restauro, em 2010 (só depois do pedido de empréstimo nipónico os responsáveis do museu se atreveram a sonhar com os trabalhos de conservação).

A pintura, que representa uma cena do quotidiano, marcada pelo detalhe e a intimidade característicos de grande parte das obras do artista, está exposta no museu Bunkamura, de Tóquio, depois de ter passado por Quioto e Sendai.

Segundo o Art Newspaper, publicação especializada, esta pintura de Vermeer que mostra uma mulher jovem, com um casaco azul, a ler uma carta frente ao que se presume ser uma janela, recuperou os “tons cool” que teria originalmente, depois de removidas as camadas de verniz e os repintes de intervenções anteriores, duas delas em 1928 e 1962.

Ige Verslype, conservador do Rijksmuseum, admite que a obra “sofreu muitíssimo desde a sua criação”, há 350 anos. Um exame cuidado à pintura mostrou, por exemplo, que no restauro de 28, a perna de uma das cadeiras foi estreitada e três pontinhos brancos foram confundidos com pérolas – acessório a que Vermeer recorria, basta pensar no célebre "Rapariga com Brinco de Pérola", o retrato que primeiro deu um livro e depois um filme que tornou o artista ainda mais popular. O director do museu, Wim Pijbes, não tem dúvidas de que a transformação na obra é “espectacular”. A expectativa em relação à reacção do público do Rijksmuseum, um dos mais importantes museus holandeses, com uma colecção recheada de obras-primas da arte europeia, é enorme.

Apesar de menos conhecido e produtivo (são conhecidas apenas 36 obras) do que Rembrandt, seu contemporâneo, Vermeer é considerado um dos grandes pintores europeus do século XVII. A sua singularidade, escreve esta terça-feira o crítico do diário britânico The Guardian, está no facto de, sem deixar de representar de forma objectiva o que o rodeia, Vermeer procurar expor o mundo interior dos pensamentos e das emoções. Ao mesmo tempo que nos permite, através da sua pintura, ficar a conhecer com rigor o que seria o ambiente de uma casa de Delft há 350 anos, o artista “arrasta-nos para um mundo secreto”, garante Jonathan Jones: “As mulheres posam para ele, presumivelmente vestidas como aparecem nas pinturas. Mas, embora seja quase científico no tratamento dos fenómenos visíveis, é de paixões invisíveis e de ‘eus’ secretos que fala.”

Para Jones, "Mulher de Azul Lendo uma Carta" faz o tempo parar. A concentração do seu olhar sugere, diz o crítico, que a carta poderá ser de um amante ou de alguém que foi enviado para a guerra. Quem escreve pouco importa. O que é significativo, explica, é que “ela está noutro mundo, distante das cores e dos detalhes que nos atraem em toda aquela cena. Para ela existem apenas as palavras naquela folha de papel. Esqueceu-se de que está a ser observada por Vermeer enquanto lê. Está no seu lugar, um lugar na mente.”

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