Actriz iraniana condenada a um ano de prisão e 90 chibatadas

Foto
Marzieh Vafamehr no filme "My Tehran for Sale" DR

A actriz iraniana Marzieh Vafamehr foi condenada a um ano de prisão e 90 chibatadas por ter protagonizado um filme australiano banido no Irão, que aborda os limites dos artistas e em especial das mulheres naquele país.

Marzieh Vafamehr, mulher do realizador Nasser Taghvai, foi detida em Julho depois de “My Tehran for Sale”, realizado por Granaz Moussavi, ter chegado ao Irão de forma clandestina. Um ano e 90 chibatadas foi a sentença anunciada esta semana e que tem provocado ondas de apoio à actriz. As mensagens no Facebook de Marzieh Vafamehr multiplicam-se e surgem de todo o mundo.

Num comunicado enviado na terça-feira ao site de cinema “The Wrap”, os produtores do filme, Julie Ryan e Kate Croser, explicaram que o envolvimento de Marzieh Vafamehr resumiu-se ao seu papel de actriz. “Ela não esteve envolvida de forma alguma na realização do filme. Como produtores do filme “My Tehran for Sale” gostaríamos de expressão o nosso choque profundo e a nossa tristeza com esta sentença imposta pelo governo iraniano.”

O filme, realizado pela iraniana Granaz Moussavi, que aos 23 anos emigrou para a Austrália, é o retrato de jovens de classe média que vivem em Teerão, sufocados pelo regime e pelo ambiente que os rodeia. Há festas clandestinas, violentamente interrompidas pela polícia dos costumes, há grupos de teatro que também trabalham de forma clandestina e lutam pela sobrevivência, há uma juventude que consome cultura ocidental, mas que não encontra formas de se expressar dentro do seu país.

Marzieh Vafamehr representa uma actriz que tenta fugir para a Austrália por não conseguir exercer a sua profissão em Teerão. Em várias cenas, aparece com a cabeça destapada, sem véus e com o cabelo rapado. A cena onde a actriz surge no filme a beber álcool foi também duramente criticada pelo regime iraniano. A sua personagem, que a certa altura descobre que está infectada com HIV, decide leiloar todo o conteúdo da sua casa para ter dinheiro para a viagem - também clandestina - para a Austrália, onde acaba por não conseguir entrar.

A realizadora explica num texto de apresentação do filme que Marzieh, sua amiga de juventude, foi uma inspiração para o filme pela sua luta "para sobreviver como actriz no Irão".

Apesar de ter estreado há dois anos no Adelaide Film Festival e de ter integrado a programação de outros tantos festivais de cinema (em Portugal foi exibido em 2010 no festival Visões do Sul, em Portimão), no Irão o filme nunca chegou a estrear, permanecendo banido.

Parviz Jahed, um crítico de cinema a viver em Londres, disse ao “The Guardian” que a sentença de Marzieh Vafamehr é uma “vergonha” para as autoridades iranianas e uma “tragédia” para a indústria cinematográfica do país.

“É uma tragédia para uma actriz ser chicoteada e presa somente por ter um papel num filme. O Irão está a criar uma atmosfera na qual um actor tem medo pelo seu futuro depois de entrar num filme”, explicou o crítico iraniano, lembrando que “os outros actores no mundo estão a aproveitar as suas carreiras enquanto os actores iranianos devem-se preocupar com as consequências de aparecer em filmes”.

Para Parviz Jahed, esta sentença é uma vingança do governo iraniano por não ter tido acesso a toda a produção do filme, uma vez que esta é australiana.

Durante o processo, as autoridades do Irão alegaram que o filme foi ilegalmente filmado dentro do país, no entanto a realizadora garante que não é verdade, tendo mostrado em tribunal a documentação passada pelo governo. “Estas acusações contra a Marzieh não tem razão nenhuma”, disse Granaz Moussavi a um jornal australiano, explicando que mesmo as queixas que surgiram por a actriz não usar qualquer véu não têm fundamento, uma vez que “não é necessário ter o véu convencional, uma vez que tecnicamente não há cabelo”.

O governo australiano veio esta terça-feira a público manifestar-se preocupado com a situação da actriz e disponibilizando todo o apoio necessário.

Este é só mais um dos casos que afecta a indústria cinematográfica iraniana que vive sob grande repressão. Em Setembro quatro realizadores de documentários e um distribuidor foram detidos, acusados de estarem a trabalhar em segredo no canal persa da BBC. Foram libertados duas semanas depois.

Um dos casos mais mediáticos e falados em todo o mundo é o do realizador Jafar Panahi, condenado a seis anos de prisão e impedido de filmar durante 20, aguardando em casa, onde tem residência fixa pelas autoridades iranianas, a decisão sobre o recurso que interpôs. Com A.P.C.

Sugerir correcção
Comentar