Estado nunca aplicou multas aos jovens que faltam ao Dia da Defesa Nacional

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O Dia da Defesa Nacional foi instituído em 2004 pelo então ministro da Defesa, Paulo Portas João Guilherme

Mais de 92 mil cidadãos recenseados dos 107 mil convocados cumpriram este ano o dever militar obrigatório participando na sétima edição do Dia da Defesa Nacional, segundo dados fornecidos ao PÚBLICO pelo Ministério da Defesa Nacional (MDN). A acção, que foi suspensa há uma semana, na sequência do acidente fatal que envolveu Ana Rita Lucas, uma jovem de 18 anos que sofreu uma queda num exercício de slide no quartel de Vila Nova de Gaia, terminaria amanhã.

Os números do MDN indicam que mais de 12 mil jovens faltaram à chamada sem apresentar qualquer justificação. Porém, apesar das coimas que variam entre os 249 e os 1247 euros e que estão previstas para os incumpridores, nenhum dos jovens deverá ser multado.

Desde 2004 - ano em que se iniciou a acção do Dia da Defesa Nacional por decisão do então ministro?da Defesa, Paulo Portas - não foi aplicada qualquer coima aos jovens que faltaram à convocatória. "Pugnamos por colocar a participação no Dia da Defesa Nacional numa dimensão de cidadania responsável e não meramente punitiva. [...]?No entanto, convém realçar que quem não cumpre este dever militar fica com a sua situação militar irregular, facto que só por si tem repercussões muito significativas na vida dos jovens, nomeadamente: impossibilidade de ingresso na Administração Pública, nas Forças Armadas e Forças de Segurança e mesmo algumas limitações em termos de mobilidade profissional para países estrangeiros", refere ao PÚBLICO fonte do gabinete do ministro da Defesa.

12 mil faltas injustificadas

Os jovens que faltaram sem apresentar justificação parecem ter escapado à multa, mas a situação "irregular" não é irreversível. "Estes cidadãos podem regularizar a sua situação militar até aos 35 anos (altura em que cessam as obrigações militares), mediante a solicitação de marcação de data para cumprir o Dia da Defesa Nacional", lembra o MDN.

Maria - que, por motivos óbvios, prefere não avançar com o nome verdadeiro - foi uma das mulheres chamadas para se apresentar no Dia da Defesa Nacional e faltou sem apresentar justificação. A história passou-se há dois anos, quando ainda não estava estabelecida a obrigatoriedade de participação das mulheres e as chamadas ao sexo feminino aconteciam por sorteio. "Recebi uma carta em casa. Percebi que no dia em que era suposto apresentar-me tinha uma explicação importante para um exame. Decidi faltar. Falei com os meus pais, que concordaram e disseram que mais tarde se trataria do assunto", lembra a estudante de Design que reside em Lisboa.

Maria confessa que ficou à espera da multa, mas, "até hoje, nunca mais soube de nada". "Tenho várias amigas que faltaram e que também nunca receberam nada", conta. Por fim, percebendo que poderá deixar de esperar um aviso indesejado na caixa de correio, Maria não esconde o alívio e suspira: "Fico contente".

No que respeita aos números referentes apenas à sétima edição do Dia da Defesa Nacional, a tutela nota que foram registados 12.612 casos de faltas sem justificação. De resto, 1840 pediram dispensa - "a maioria por residirem no estrangeiro" - e, de acordo com os dados fornecidos pela Comissão Nacional de Objecção de Consciência, 274 cidadãos solicitaram o estatuto de objectores de consciência e não participaram, por isso, nas actividades.

Cumprir o dever cívico

"As elevadas taxas de participação no Dia da Defesa Nacional, muito motivadas pela sua atractividade e pela forma flexível como é gerida a participação dos jovens, demonstram que este dever, apesar de obrigatório, não tem tido a necessidade de ser implementado de forma impositiva, pois tem valor por si mesmo", conclui o esclarecimento enviado ao PÚBLICO pelo MDN.

Rui Borges, estudante de Direito na Universidade do Porto, foi um dos que não faltaram à chamada e lembra a viagem a Maceda (Ovar) feita há três anos sem grande saudade. "Cumpri o dever cívico. Não acho mal. É um dia e é uma forma de cativar jovens que queiram ir para as Forças Armadas." Ana Pinto respondeu este ano à chamada e, apesar de sublinhar que não tem qualquer vocação para as Forças Armadas, encolhe os ombros à obrigação de se apresentar: "Se fosse algo voluntário, só iam os que já estão interessados e assim eles podem captar alguém que esteja em dúvida".

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