A pintura de Júlio na terra dos surrealistas

O que é que faz a pintura de Júlio, o pintor e poeta que em certos meios é mais conhecido por ser irmão de José Régio do que por ser um autor com nome próprio, no acervo de um museu do surrealismo? A resposta pode ser encontrada, a partir de hoje, às 18h30, na Fundação Cupertino de Miranda, em Famalicão, sede do Centro de Estudos do Surrealismo (CES) e detentora de uma das mais importantes colecções dedicadas a este movimento em Portugal.

Por Toda a Parte - Júlio é o título da exposição, que mostra pela primeira vez ao público mais de uma centena de obras do pintor recentemente adquiridas pela fundação.

"O Centro de Estudos do Surrealismo da Fundação Cupertino de Miranda manifestou sempre o seu interesse por incorporar ao seu acervo do surrealismo português obras representativas de nomes que, como os de Júlio, Vieira da Silva ou António Pedro (...) incorporaram o sonho e o desejo de revolução total por que o surrealismo se bateu sempre na altura em que a sua presença em Portugal não passava de uma ou duas simples referências - aliás, quase sempre negativas - em livros, jornais e revistas", escrevem Perfecto E. Cuadrado e António Gonçalves, respectivamente coordenador do CES e director artístico da fundação famalicense, num dos textos no catálogo da exposição. Júlio é o desdobramento da persona criativa, na pintura, do engenheiro civil Júlio Maria dos Reis Pereira (1902-1983), que, na poesia, assumiu o pseudónimo Saúl Dias e pontificou no movimento Presença - e da qual Jorge de Sena disse caracterizar-se por "uma delicadeza e uma pureza de expressão que levam a uma depuração excepcional numa linha poética que vem directamente de Camilo Pessanha".

Mas é normalmente aceite que a vertente mais relevante da criação do artista está na pintura - é isso que explica Fernando Cabral Martins, noutro texto do catálogo, onde localiza a criação de Júlio - ao lado da de Edmundo de Bettencourt - no surrealismo português dos anos 30, tomando lugar, "ainda que virtual, nesse terramoto das imagens (pintadas ou ditas) que atravessa o século XX".

A pintura de Júlio revelou-se na década de 30 e foi evoluindo, entre as marcas do expressionismo e do surrealismo, com várias piscadelas de olho à obra de Chagall, até à década de 60. Foi nesta altura que Manoel de Oliveira ajudou a tornar as suas criações mais conhecidas com o documentário As Pinturas do Meu Irmão Júlio (1965), comentadas por José Régio.

Provém destas duas décadas, aliás, o maior número das obras adquiridas pelo CES e que agora vão ficar expostas em Famalicão até 25 de Fevereiro.

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