“Ouviu o que a Marta Temido acabou de dizer?”

Marta Temido, Sebastião Bugalho, Catarina Martins e Pedro Fidalgo Marques protagonizaram o último debate televisivo a quatro desta campanha para a Europa.

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Para todos os que não são “swifites” , e não estiveram acampados durante dois dias à porta da Luz e ficaram em casa, uma das opções televisivas desta noite de sexta-feira era o último debate televisivo a quatro entre cabeças de lista candidatos às eleições europeias. Um sortido de esquerda e direita (mais sabores de esquerda), numa combinação que ainda não tínhamos visto.

De Catarina Martins (BE) a Sebastião Bugalho (AD), com Marta Temido (PS) e Pedro Fidalgo Marques (PAN) pelo meio, foram cerca de 40 minutos de um conjunto de monólogos que se transformavam ocasionalmente em diálogos, algumas interjeições sussurradas, queixinhas e, pelo menos, um momento nonsense. Tudo embrulhado num debate mais nacional do que europeu. O que não é nada surpreendente. Nem novo.

Todos os políticos gostam de controlar a narrativa, seja numa entrevista, num debate a dois, a quatro ou (como irá acontecer na próxima terça-feira) a oito. Há uns que são mais subtis que outros na arte do “antes de responder à sua pergunta…”, o que não foi o caso de Sebastião Bugalho, ex-comentador feito candidato. “Com todo o respeito pela sua moderação, podemos falar de outra coisa”, foi uma das primeiras respostas do candidato da AD à moderadora. Levou logo raspanete. “Quem decide, sou eu”, respondeu Sara Pinto, a jornalista da TVI.

Não foi o único a tentar mudar a narrativa. A Pedro Fidalgo Marques, a moderadora pediu-lhe para contar até dez e ele respondeu azul. Senhor candidato do PAN, fale-me da sua posição sobre o alargamento do prazo de aplicação do PRR. “Se me permite alguma latitude, há um tema que tem ficado esquecido, a cultura. Os fundos são sempre mal usados, há 16 milhões que vão para as touradas. Cultura não é tortura.” Sara Pinto teve de voltar a impor alguma disciplina à mesa. “Quem comanda o debate sou eu.”

Começou-se por um tema nacional com (talvez) implicações europeias, sobre a situação judicial do ex-primeiro-ministro António Costa e das suas eventuais ambições no Conselho Europeu. “É uma excelente notícia para começar a noite”, reagiu Marta Temido à primeira pergunta do debate. Bugalho achou que era um “alívio para a democracia”, Catarina Martins aproveitou para criticar a situação da justiça no país, sem se esticar num apoio ou desapoio ao seu antigo parceiro de geringonça. “Mas sei que ele é diferente de Durão Barroso.”

Estes primeiros minutos foram uma cápsula do que são os candidatos enquanto políticos a falar para as câmaras. Catarina Martins, a mais competente no discurso e no debate (tem a experiência de muitos anos como líder do BE e de um passado como actriz), e a que sabe escolher melhor os seus alvos. Marta Temido, habituada à exposição pública por ter sido Ministra da Saúde em tempo de pandemia, a tentar manter-se na sua faixa programática. Sebastião Bugalho, especialista em confronto e em sussurros (a pedir para falar) enquanto os outros falam, nada fora de carácter de acordo com o seu passado recente de comentador. Pedro Fidalgo Marques, que não desperta antipatia a ninguém, a tentar passar a sua mensagem, sem o andamento dos outros três, mas com algumas bicadas interessantes.

Durante o tema de mais ou menos extrema-direita no Parlamento Europeu e na Comissão Europeia, Sebastião Bugalho passa a entrevistador e avança na direcção de Catarina Martins com um “há algum chefe de Estado ou de Governo do grupo Identidade e Democracia?”. “O Sebastião Bugalho vai-me desculpar, eu gostava de responder mais às perguntas da Sara, mas queria dizer o seguinte: registo que a direita e o PPE anda a dizer que há a extrema-direita boa e a extrema-direita má.” Fidalgo Marques mete-se no meio e avança com um “não é não em Portugal é não é não na Europa?” Bugalho garante: “As nossas linhas vermelhas são intransponíveis.”

Sobre a interrupção voluntária da gravidez e a sua consagração como direito na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, Sebastião Bugalho tentou fazer a defesa jurídica dos votos contra dos partidos que integram a coligação, PSD e CDS, e fez uma declaração pessoal de que reconhece esse direito às mulheres.

Mas não teve uma resposta convincente quanto ao sentido de voto dos futuros eurodeputados da AD em futuras votações sobre o assunto. Para os outros três, esse direito deve ser consagrado na carta. Também aqui, houve transporte de tema para a realidade nacional. “O Sebastião, ou está a contar com um mau resultado em que não elege ninguém do CDS, ou fala por eles e acha que eles vão contra tudo o que têm votado”, atirou o candidato do PAN.

Marta Temido quis mais explicações e também teve o seu momento de entrevistadora. “Vocês vão mesmo mudar o sentido de voto?”, questionou. Bugalho fez queixinhas à moderadora. “Ouviu o que a Marta Temido acabou de dizer? Ouviu-me a dizer o que a Marta Temido disse que eu disse?” A moderadora lá teve de lhe dizer para responder à pergunta e Bugalho respondeu à pergunta com outra pergunta – o tema, aparentemente, já tinha mudado para o tema inicial e ainda não tínhamos percebido. “Gostaríamos todos de saber se a Marta Temido continua a apoiar António Costa se este precisar do apoio de Viktor Orbán para o Conselho Europeu?”

Ainda se falou de corrupção. São todos contra.

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