Cartas ao director

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Dívidas?

O partido Chega entende que o Presidente da República traiu o país quando considerou que Portugal está em dívida com os países das ex-colónias. O partido Chega com estas declarações está a condicionar o debate sobre uma matéria que tem sido debatida nos países europeus ex-colonizadores. Todos sabemos que, como colonizadores, explorámos aqueles países com o trabalho escravo, o tráfico da escravatura e o trabalho forçado, durante centenas de anos. Também sabemos que Portugal explorou as matérias-primas, como o petróleo, o ouro e muitas outras. Os bens culturais desses países foram recolhidos, trazidos, e estão expostos nos nossos museus. Também é verdade que enquanto lá estivemos desenvolvemos infra-estruturas destinadas à exploração das riquezas desses países e que hoje os beneficiam. Sem esses investimentos não teria sido possível explorar muitas daquelas riquezas. Parece-me que o partido Chega, ao levantar esta questão desta forma, está não só a pôr em causa um debate que se quer sério, como a afastar no futuro esses países de Portugal, ou não será?

Mário Pires Miguel, Reboleira

O ser e o nada

O líder da extrema-direita quer à força que pensar a História seja proibido, e, por isso, crime. As histórias da História são o que são, porque alguém as viveu e contou. Se contar como foi não servir para pensar – como serviu ao longo da História da Humanidade – e como não há Saber sem Juízo e não há Justiça sem Verdade, subtrair a estes quatro vértices da sanidade mental colectiva a possibilidade de aferir no presente o que foi feito no passado é condenar-nos a todos ao vazio. Afirmava Kant que pensar é julgar, e o verbo “pensar”, em latim, significa curar. E Sartre, na sua obra O Ser e o Nada, dedica um capítulo ao tema “A má-fé”, e divide-o em “má-fé e mentira”, “as condutas da má-fé”, e “a fé da má-fé”. Como uma luva para este falso profeta.

Maria Afonso, Lisboa

Virar o bico ao prego

A noção de que os ataques contra imigrantes são uma resposta natural ao aumento do número de imigrantes é uma falácia perigosa e que deve ser combatida. O recente ataque no Porto e as reacções seguintes (incluindo de Rui Moreira) foram apenas mais um exemplo. Argumentar que mais imigrantes trazem mais insegurança para os nacionais é simplista e não tem respaldo nos dados que conhecemos. É como “virar o bico ao prego”. A verdadeira causa dos ataques a imigrantes está na intolerância e na falta de educação dos que os cometem, não nas vítimas geralmente pobres, exploradas e desprotegidas. Culpar os imigrantes é ignorar problemas sociais profundos, que persistiriam mesmo com políticas de imigração mais restritivas. Em vez de alimentar preconceitos, devemos promover a inclusão e a compreensão mútua, abraçando a diversidade como uma força, não como uma ameaça. Cabe aos políticos (a começar nos autarcas) contribuir para isso.

Tomás Júdice, Lisboa

Figuras de Estado versus opinion makers

Vamo-nos habituando a figuras de Estado que se esquecem do peso institucional que têm. A partir do momento em que um político passe a representar o Estado, o que profira publicamente, e mais quando a assistência seja ligada directamente ao(s) Estado(s), passa a ser uma declaração institucional. A informalidade de “opiniões” deixa de ter lugar em contextos institucionais. Quem não reconhece a responsabilidade de assumir seriamente o seu lugar deverá ter a hombridade de se retratar, e não, pelo contrário, adoptar a arrogância de se achar impune só porque, quase por acaso, se senta num lugar governativo.

Luís Filipe Rodrigues, Santo Tirso

O manifesto

Um grupo de 50 personalidades pensantes da pátria lusa está contra o “poder sem controlo do Ministério Público”. O manifesto dá pelo nome de “Por Uma Reforma da Justiça em Defesa do Estado de Direito Democrático”. Coincidência, ou não, este manifesto vê a luz do dia próximo do vislumbre do livro Identidade e Família, em que se pede a purificação da sociedade. É pena que o manifesto ao clamar pela reforma da justiça não esteja contra o uso e abuso dos recursos que travam o julgamento de colarinhos brancos. Se os magistrados estiverem ao lado dos políticos, está tudo bem. Se estiverem contra o tráfico de influências, está o caldo entornado.

Ademar Costa, Póvoa de Varzim

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