Cartas ao director

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Mudança à custa de outros

O novo primeiro-ministro quer à força que acreditem no que ele diz, mesmo que a realidade mostre que há promessas furadas no que aponta querer fazer. Como é possível que um governo garanta que o seu dito choque fiscal, aquele em que se apoia, esteja assente, afinal, em 90 por cento da dedução em IRS já aprovada pelo Governo anterior? Uma dedução em que pega, dá-lhe um acréscimo de 200 milhões para chamar a si um bolo de 1500 milhões, assim grande parte do qual com a chancela do anterior titular das Finanças, Fernando Medina?! Apanhado na curva o Governo, e quem o apoia, balbuciou alegado mal-entendido, mas a grande maioria das opiniões, posta perante o logro, divide-se entre a mentira e o embuste, qual deles dos piores motivos. E ainda: o que é que isto fará antever quanto a posturas e decisões futuras? Uma coisa é certa: lá para os da AD, afinal o governo anterior não foi assim tão mau... desde que as suas decisões possam ser assumidas pelo novo Governo como suas e de preferência que isso não conste. No meio disto tudo foi pena que não tivesse sido o próprio PS o primeiro a descobrir a marosca numa prova de que estaria desatento ou então de que não teria encontrado, à partida, suficiente prova da engenharia fiscal proposta. De uma maneira ou de outra, se isto é que é a mudança patrocinada pela AD e por Luís Montenegro, se não arrepiam caminho estamos conversados...

Eduardo Fidalgo, Linda-a-Velha

A semântica do poder

Num regime democrático, no qual, por definição, se faz mister negociar a divergência, a palavra emerge como o decisivo instrumento político. Ora, sendo o Parlamento a sua sede institucional, aí se exibe, por entre sombras florentinas, toda uma semântica do poder, cuja visibilidade aumenta, como é o caso da presente legislatura, quando se acentua o equilíbrio das forças partidárias. Neste cenário parlamentar de alta tensão, tenta‑se aprisionar o adversário numa rede vocabular unidimensional, com a consequente construção de um dicionário ad usum fidelis. Estabelecem‑se então putativas equivalências: quem não rejeita o programa do Governo só pode aprová‑lo; quem promete milhões e os transforma em tostões não está a mentir, mas a ajustar valores entre o passado e o presente; etc.. Tudo isto espelha a melhor estratégia de propaganda: pôr a verdade parcelar dos factos ao serviço do grande ardil dos interesses reaccionários do poder.

Eurico de Carvalho, Vila do Conde

Orçamentos

Muitas alterações se têm verificado no campo do estudo da Economia relativamente aos tempos em que a estudei e nela me licenciei. Até na terminologia utilizada quando falávamos de Orçamentos do Estado. Havia-os mais ou menos expansionistas, uns mais keynesianos, outros mais monetaristas, etc. De um modo geral, sabíamos do que estávamos a falar. Agora, nas discussões orçamentais no Parlamento, já ouvi e por mais de uma vez classificar as propostas de OE para 2025 como mais ou menos pipis ou mais ou menos betinhas! Que raio querem dizer Luís Montenegro e André Ventura com estas designações? O monumental erro ou fraude no chamado choque fiscal de Montenegro é mais pipi ou mais betinho?

Helder Pancadas, Sobreda

O logótipo armilar

É estranho que a ausência da divisa de um rei de Portugal no logótipo dos governos da República portuguesa seja motivo de tão acesa discórdia. A esfera armilar uma representação do cosmos foi adoptada como divisa pelo rei Manuel, o primeiro a assumir o título de Rei de Portugal e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor da Conquista do Comércio e Navegação da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia. Manuel (Le roi Épicier – lhe chamava Francisco I de França), venturoso sem que o merecesse expulsou os judeus e com eles boa parte da elite culta portuguesa, que assim foi beneficiar a concorrência e que não hesitou em casar com a noiva do filho.

A esfera armilar é o modelo geocêntrico do universo que já naquele tempo era anacrónico. É certo que foi com ela que se chegou à Índia, à China, ao Japão, a Ternate e se deu a volta ao mundo (La esfera de Ptolomeo era tan precisa que incluso hoy puede utilizarse para orientarse en la navegación marítima. Aunque sabemos que su sistema está equivocado), mas foi por se manter esse emblema errado da visão do universo que por ali ficámos. Como então, o “reino de despovoa” dos mais aptos e os que ficam e podem desfrutam o que deveriam deixar aos descendentes.

H. Carmona da Mota, Coimbra

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