Cartas ao director

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Votos respeitáveis? Nem todos!

A propósito dos votos que alimentaram o crescimento exponencial da extrema‑direita (mais de um milhão, aliás), há quem tenha posto a circular a tese de que, em democracia, merecem o mesmo crédito todas as cruzes dos eleitores. São muito fortes as razões, porém, que mostram a inânia desse ecumenismo deslavado. Primo: entre quem vota e o seu voto, sob pena de estarmos perante casos de vil oportunismo ou acefalia, não pode haver dissenso ideológico. Secundo: todo aquele que toma a decisão de votar num partido racista e xenófobo torna‑se responsável, ipso facto, pela "normalização" do racismo e da xenofobia, cujos mecanismos de ostracização do outro são obviamente incompatíveis com valores democráticos. Tertio: dos argumentos aduzidos resulta o corolário (e eis o grande paradoxo da democracia) de que existem votos antidemocráticos. Enquanto tais, por conseguinte, não devem merecer respeito algum por parte dos democratas, a não ser que eles queiram transformar‑se nos seus próprios coveiros, o que não seria (ai de nós!) novidade histórica.

Eurico de Carvalho, Vila do Conde

Populistas, precisam-se

Entre todas as “explicações” para o estrondoso êxito eleitoral de André Ventura, importa destacar uma que me parece fundamental: o monopolismo que ele exerce sobre o mercado à sua disposição. Não que não existam muitos outros populistas, embora a maioria deles se acoberte, para já, no Chega. Valha a verdade, também, que o talento, a inteligência e a desfaçatez de Ventura, inegáveis, não se encontram por aí ao desbarato. Estou convencido, no entanto, de que, quando começarem a aparecer outros mentores intelectuais do vazio mental até aqui ocupado pelo Chega, a “chama” começará a esmaecer. Pode ser que, à falta de melhor, dentro do partido se encontrem “ideólogos” que se julguem pelo menos tão capazes como Ventura de pesquisar e arrebanhar as “pepitas de ouro” que se transformarão em chorudos votos em próximas eleições. Saiam da toca, desertem, e formem novos partidos populistas, vão à luta, que o vosso partido é que será o “autêntico”! E quanto mais depressa, melhor, não se acanhem.

José A. Rodrigues, Vila Nova de Gaia

Governo com baixo quilate

O XVI Governo Constitucional não tem uma forte figura de referência. Paulo Macedo como ministro das Finanças seria marca de diamante. Com tantas confusões e baixo vencimento, quem com provas dadas aceita dirigir um ministério? Uma nuvem bolorenta de um passado recente paira sobre os escolhidos. Falta um pagador de promessas perante tantas promissões feitas por Luís Montenegro durante a campanha eleitoral. Foram tantos os picos de confiança que Montenegro a cada cumprimento fazia uma promessa. Foram tantas que ainda se vai esquecer de alguma. A pasta da Educação deve seguir o aumento do bullying nas escolas. É de lá que vão sair os próximos dirigentes políticos.

Ademar Costa, Póvoa de Varzim

Comissão da Verdade ou mais uma causa fracturante?

Na página 12 do PÚBLICO de 29 de Março, o doutorando em História José Moreira da Silva ocupa toda esta página em defesa da criação de uma Comissão da Verdade do Colonialismo Português, que tenha como prioridade a investigação dos massacres coloniais, a história das pessoas que sofreram a repressão do Exército português ou da PIDE, que conduza os pedidos de desculpa oficiais, construção de monumentos, revogação de leis, revisão de manuais escolares, reparação das vítimas, etc., questionando se esta comissão deverá cingir-se ao século XX ou também a todo o período da nossa presença em África desde o século XV.

Termina o artigo lamentando que até agora apenas o Bloco de Esquerda tenha uma proposta nesse sentido. Ora isso não admira, pois o BE, à falta de mais causas fracturantes, terá de tentar encontrar mais alguma que lhe garanta mais algum tempo de relevância política.

O autor do artigo invoca o caso sul-africano para justificar a sua opinião. Ora aqui tratava-se de um regime de apartheid, e essas comissões surgiram logo após a queda do regime e da tomada do poder pela maioria negra, e no sentido de conciliação interétnica que impedisse a violência racial e perseguição da etnia branca e consequentes efeitos negativos na mais pujante economia de África. A situação das ex-colónias de Portugal em nada era semelhante e não faz qualquer sentido que se criem comissões cujo efeito e quiçá o objectivo mais provável será apenas criar mais uma grave fractura não apenas na nossa sociedade, mas também entre Portugal e as ex-colónias, que têm hoje em dia relações amistosas e pacíficas.

Armando Carvalho, Barcarena

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