O implicante destino

O destino tem a mania de estar em constante conflito com os nossos sonhos. Implica com qualquer devaneio que uma pessoa possa ter em relação ao futuro.

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Depois de uma discussão mais acesa, a Ana e o Eduardo reencontraram-se num abraço. Ela tinha ido buscar os seus pertences que ainda estavam na casa dele, com a intenção de terminar formalmente a relação, mas acabou por deixá-los onde estavam. O Flávio, quando soube, não quis acreditar, como assim, voltaste para ele?!, ainda quis gritar, mas o temperamento fleumático e tímido não concordava com gritos, por isso acabou por balbuciar uns “porquê?”, sem obter uma resposta satisfatória. Temos uma relação já com meses, disse a Ana, o que aconteceu connosco foi apenas um momento de hedonismo sem relevância ou profundidade, mas porquê?, perguntou ele, porque é assim, disse ela, mas porquê?, perguntou ele, bebemos demais nesse dia e a coisa deu-se, rematou ela. A Ana aproximou-se e deu-lhe um abraço porque ele tinha começado a chorar, ficando os dois assim durante uns segundos, envolvendo-se mutuamente na tristeza dele. O Flávio, no seu desespero tímido, ainda tentou aproximar os seus lábios dos lábios dela, gesto que a fez afastá-lo. O destino tem a mania de estar em constante conflito com os nossos sonhos. Implica com qualquer devaneio que uma pessoa possa ter em relação ao futuro, e quando vê a felicidade aproximar-se gosta de lhe dar uns pontapés na barriga. Às vezes consegue, outras não, mas tenta sempre. O Flávio viu a Ana afastar-se, dobrar a esquina, pensando no que poderia fazer para a conquistar, vindo-lhe à cabeça as banalidades do costume, perfume, flores e bombons, mas uma mulher como a Ana não se deixaria seduzir por esses artefactos românticos, gostava, isso sim, de gestos inteligentes, justos, corajosos, talvez também impetuosos, e palavras a condizer: nada disso é coisa que caiba num embrulho.

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