Marcelo pede “máximo rigor” e sindicato quer substituto de Gago proveniente do MP

Presidente pede cuidado com a “percepção comunitária” da actuação do Ministério Público, no dia em que o presidente do sindicato dos procuradores deixou um recado ao poder político.

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Lucília Gago, a procuradora-geral da República, e Adão Carvalho, presidente do Sindicado dos Magistrados do Ministério Público LUSA/EDUARDO COSTA
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Adão Carvalho, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) acabou de dar um aviso à navegação no que respeita à escolha do próximo Procurador-Geral da República (PGR). No XIII Congresso do SMMP, que terminou este sábado nos Açores, o dirigente, que também disse que não se ia recandidatar ao cargo, defendeu que o sucessor de Lucília Gago deve ser um magistrado do Ministério Público (MP).

A actual procuradora-geral da República termina o seu mandato em Outubro. “Temos, por recomendável, a bem do Estado de direito, nestes tempos de enorme pressão e crítica sobre investigações em curso, com protagonistas e responsáveis políticos a manifestarem uma clara vontade de conformar a actuação do Ministério Público a uma espécie de tutela política, que esse processo decorra da forma mais transparente possível”, começou por dizer o dirigente sindical, sublinhando que, “com a publicitação dos motivos atinentes à escolha, com conhecimento do projecto que o escolhido tem para o MP, e com respeito pelas recomendações ao nível do Conselho da Europa de que essa função, seja qual for o sistema do MP, deve recair sobre um magistrados do próprio Ministério Público, a bem da independência e autonomia desta magistratura, enquanto garante da própria independência do sistema judicial”.

Isto apesar da lei dizer que a escolha para o cargo não está vinculada a qualquer área de recrutamento ou sequer a especiais requisitos de formação.

Depois, em relação aos temas que foram debatidos no congresso, Adão Carvalho destacou algumas ideias, nomeadamente “a de que o Ministério Público tem um papel de proximidade e de facilitador do acesso aos tribunais, caracterizado como uma magistratura de “porta aberta” e de “rés-do-chão”, onde o cidadão pode entrar, falar e ser ouvido e que o descurar dessa sua vertente nuclear e a sua redução ao exercício da acção penal poderão fazer perigar a concepção do Ministério Público enquanto magistratura”.

Além disso, o presidente do SMMP sublinhou que, “ao contrário da vontade de alguns que querem levar o Ministério Público para guerras e guerrinhas, no MP e na Polícia Judiciária, entre o MP e os juízes, existe entre esta magistratura e os órgãos de polícia criminal, a Polícia Judiciária, mas também a PSP, a GNR, a Autoridade Tributária (AT), etc., uma relação de estreita colaboração com uma finalidade comum – a realização de uma melhor justiça penal”.

Porém, Adão Carvalho salientou que, “para isso importa que o MP assuma a direcção efectiva do inquérito, tomando a iniciativa para que essa estreita colaboração ocorra em todos os inquéritos”. “Deverá, contudo, equacionar-se uma eventual regulamentação do funcionamento das equipas de investigação, atenta a falta de cultura e formação para o trabalho em equipa, havendo ainda um longo percurso a trilhar neste âmbito”, sustentou.

Já no que toca “à actividade de investigação criminal”, o sindicalista destacou a ideia de que “já se encontram disponíveis ferramentas tecnológicas com vista a desenvolver um trabalho mais célere e eficaz, tais como aplicações de inteligência artificial que auxiliam na análise de prova, o projecto AIDA e o guia prático da justiça”.

No entanto, concluiu-se, segundo o dirigente sindical, que “para haver aplicações de inteligência artificial nos tribunais terá que haver mais formação, autonomia e capacidade financeira para gerir os dados que fazem funcionar as mesmas, pois desconhece-se como é que os dados são processados e indexados”.

Presidente alerta para “percepção comunitária das actuações”

O Presidente da República, que foi convidado para o congresso mas entendeu não ir devido ao período pré-eleitoral, enviou ainda assim uma mensagem escrita em que apela aos magistrados do Ministério Público que reflictam sobre os novos desafios que se colocam ao sistema judicial. Marcelo Rebelo de Sousa chama a atenção para o “tempo em aceleração e a sua repercussão na própria justiça da Justiça” e, consequentemente, para “as estruturas, os procedimentos e as opções de percurso que melhor conciliem o máximo rigor com a máxima prontidão de resultados”.

O chefe de Estado também insta os procuradores a não abdicarem de uma “constante sensibilidade à percepção comunitária das instituições e das actuações” e termina a mensagem com um alerta para que se evite a “politização” do poder judicial e a “judicialização” dos restantes poderes do Estado.

Os avisos de Marcelo não estão dissociados das fortes críticas públicas de que o Ministério Público tem sido alvo nos últimos meses, devido ao que alguns responsáveis políticos consideram ter sido um excesso de meios empregues nas buscas da Madeira e falta de consistência na condução da Operação Influencer, que levou à queda do Governo.

com João Pedro Pincha

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