No Turquemenistão, fazem-se testes de virgindade nas escolas sem autorização dos pais

A Amnistia Internacional diz que estes testes são “uma forma de tortura” e a Human Rights Watch descreve-os como “degradantes e discriminatórios”.

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Alunos de uma escola no Turquemenistão vestidos com os seus uniformes escolares Kalpak Travel, CC BY-SA 4.0 <https://creativecommons.org/licenses/by-sa/4.0>, via Wikimedia Commons
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Os testes de virgindade não são uma novidade no Turquemenistão, mas agora uma das províncias desta antiga república soviética decidiu impô-los a todas as alunas das escolas secundárias. Num país da Ásia Central onde o Estado procura controlar muitos aspectos da vida dos seus habitantes, “as mulheres e as raparigas têm visto os seus direitos e liberdades, incluindo a autonomia sobre os seus corpos, crescentemente restringidos”, lê-se na página do site da Amnistia Internacional dedicado à nação da Ásia Central.

“Nas cidades de Balkanabat e de Turkmenbashi [ambas na província costeira de Balkan], todas as alunas do 9.º ao 11.º ano são forçadas a submeter-se ao exame ginecológico”, disse à Rádio Europa Livre (RFL/RL) um funcionário dos serviços de educação que pediu o anonimato. “Uma lista das raparigas que são identificadas como tendo tido relações sexuais está a ser partilhada com a polícia local e com o Ministério da Segurança Nacional”, explicou.

Segundo outros funcionários ouvidos pela RFL/RL, a polícia verifica depois frequentemente os telemóveis das raparigas que estão nessa lista, à procura de informações sobre as suas supostas relações. “Os agentes explicam que isto é feito para identificar e levar à justiça pessoas que tenham relações íntimas com menores.”

Os testes são realizados sem o consentimento das adolescentes ou dos seus pais, disseram várias alunas e pais à Rádio Europa Livre.

“É como perder a dignidade”, contou uma estudante que fez o teste ao site de notícias BNN Breaking. “Eles dizem-nos que é para o nosso próprio bem, mas como é que a humilhação pode ser uma coisa boa?” A Amnistia Internacional pede o fim imediato dos testes, que descreve como “uma violação dos direitos humanos e da autonomia corporal”.

O Governo não explica o porquê desta nova política, e as autoridades da província de Balkan não responderam às perguntas da Rádio Europa Livre, mas o funcionário de Balkanabat que falou à emissora financiada pelo Governo dos Estados Unidos sugere que a medida se deve às notícias que nos últimos meses deram conta de um aumento das gravidezes entre adolescentes na região, com seis casos nesta cidade.

“Esta informação chegou ao Ministério da Educação, que fez uma severa reprimenda ao chefe do departamento de Educação regional de Balkan. Logo depois disso, começaram estas verificações de ‘pureza moral’ nas grandes cidades”, descreveu.

O que agora acontece nesta província já se passou em anos anteriores noutras zonas. Em 2018, em Dashoguz, uma das cinco províncias do país, era comum a polícia aparecer sem aviso nas escolas com ginecologistas que realizavam os testes, enquanto os agentes procuravam vídeos de pornografia nos telefones dos rapazes, recorda a RFL/RL. Na altura, um responsável da polícia disse à emissora que a intenção era combater a prostituição entre os adolescentes.

Um ano depois, foram as escolas da província de Mary, no Sudeste do país, a ordenar testes de virgindade para todas as alunas entre o 8.º e o 11.º ano, “independentemente do consentimento dos pais”.

Estes testes ainda são habituais em várias nações africanas, asiáticas e do Médio Oriente e em alguns casos continuaram a ser realizados pelas autoridades em países onde já foram proibidos pela justiça, como no Egipto.

Num manual publicado em 2014, a Organização Mundial de Saúde recomendou aos profissionais de saúde nunca fazerem testes de virgindade, salientando que “não têm validade científica” e defendendo que “quaisquer exames físicos” só devem ser realizados “com consentimento informado”. A Amnistia Internacional diz que estes testes são “uma forma de tortura” e a Human Rights Watch descreve-os como “degradantes e discriminatórios”.

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