Líder da oposição sérvia detido e espancado pelos serviços secretos

Nikola Sandulovic encontra-se detido há uma semana e a família diz que está parcialmente paralisado. Foi preso por pedir perdão por massacres cometidos contra albaneses durante a guerra do Kosovo.

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Protestos em Belgrado no final de Dezembro após as eleições legislativas REUTERS/Zorana Jevtic
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O líder de um dos partidos da oposição na Sérvia foi brutalmente espancado enquanto se encontrava detido pelos serviços secretos, de acordo com uma denúncia da família.

Nikola Sandulovic foi detido a 3 de Janeiro pouco depois de ter publicado um vídeo gravado meses antes no qual pedia desculpas públicas por crimes de guerra cometidos pelas forças sérvias contra os albaneses durante a guerra pela independência do Kosovo, no final dos anos 1990.

A detenção de Sandulovic, líder do partido Republicano Sérvio, foi feita por agentes da Agência de Segurança e Informação (BIA) e só ao fim de cinco dias é que a família o pôde visitar. Encontraram-no parcialmente paralisado e suspeitam de que, além de ter sido espancado, possa ter sido envenenado.

“Ele está comunicativo, mas totalmente paralisado do lado direito, está numa cadeira de rodas e numa condição clínica muito, muito má”, disse a sua filha Karla, através de um comunicado divulgado pelo advogado e activista britânico Michael Polak, citado pelo Guardian.

No vídeo publicado, que foi gravado em Fevereiro do ano passado, Sandulovic deposita flores na campa de Adem Jashari, fundador do Exército de Libertação do Kosovo, morto em 1998 pela polícia sérvia, que também foi responsável pelo massacre de 57 membros da sua família. Nesse momento, o político pediu desculpas pelos abusos cometidos pelas forças sérvias durante a guerra da independência do Kosovo.

“Sou o único político da Sérvia que veio prestar homenagem às vítimas inocentes albanesas, à família Jashari, em Prekazi. Pedi desculpas e pedi perdão em nome dos sérvios que não cometeram isto”, escreveu Sandulovic na rede social X a 2 de Janeiro. O acto de Sandulovic foi muito criticado por políticos do partido no poder, o Partido Progressista Sérvio (SNS), e pela generalidade dos meios de comunicação social.

Depois de ter estado detido durante alguns dias, Sandulovic voltou a casa, porém, apenas um dia depois, voltou a ser levado pela polícia sérvia e só recebeu visitas da família na quarta-feira.

Um tribunal deu ordem para permanecer 30 dias de prisão, depois de ser julgado in absentia, por incitamento ao ódio nacional, racial e religioso, um crime cuja pena pode variar entre seis meses e cinco anos, segundo o Código Penal sérvio.

Polak apresentou um pedido urgente junto do Comité Contra a Tortura da ONU para que Sandulovic seja transferido para um hospital civil, dizendo que o político foi “apanhado pelo serviço de informações sérvio e depois arbitrariamente detido e torturado”.

Imagens que circulam nas redes sociais mostram Sandulovic com a face cheia de ferimentos e aparentemente inconsciente. “Ele foi gravemente espancado”, disse Polak. “Tem uma costela partida, quando voltou a casa ficava inconsciente frequentemente e queixava-se de não conseguir mexer o lado direito do corpo”, acrescentou o advogado.

O ex-director da BIA Aleksander Vulin confirmou, numa entrevista ao jornal Novosti, ter dado ordem para a detenção de Sandulovic, embora tenha saído do cargo quase dois meses antes. “Sandulovic foi detido por ordens minhas, que se mantiveram válidas mesmo depois da minha demissão. Ele foi detido por suspeita de prejudicar a ordem constitucional e de trabalhar activamente no apoio à secessão do chamado Kosovo”, afirmou.

Vulin demitiu-se em Novembro depois de ter sido alvo de sanções pelos EUA, que o acusaram de apoiar as actividades da Rússia na Sérvia.

O Governo sérvio não fez qualquer comentário público à detenção de Sandulovic.

O episódio surge numa altura sensível na Sérvia. No final de Dezembro, milhares de pessoas organizaram uma série de protestos em Belgrado para denunciar alegadas fraudes nas eleições legislativas de dia 17, ganhas pelo SNS.

A oposição diz que houve múltiplas irregularidades durante a votação, sobretudo em Belgrado, onde o sentimento antigovernamental é mais forte, e pediu o anulamento dos resultados.

A detenção e a agressão de um líder político da oposição também vêm complicar ainda mais as relações entre a Sérvia e a União Europeia, numa altura em que Belgrado esperava relançar o processo de adesão ao bloco.

A Comissão Europeia disse estar “em contacto com as autoridades e partes relevantes” no que respeita ao caso de Sandulovic e recordou que qualquer detenção deve respeitar os procedimentos legais. “Quaisquer alegações de violência devem ser acompanhadas de forma efectiva pelas autoridades competentes”, acrescentou.

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