Novo Hospital do Oeste: um tiro no SNS

A confusão está instalada no Ministério da Saúde no que diz respeito à saúde no Oeste, na pressa de responder a interesses locais que colocam em risco o SNS e a saúde nacional.

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A construção de um novo hospital do Oeste, proposto para ser construído na vila do Bombarral, constitui mais uma machadada no SNS. Temos assistido à aplicação de um conjunto de medidas que poderiam constituir um manual para encerrar o SNS, desde a falta de condições dos seus trabalhadores, a contratação de serviços a peso de ouro, ou a concentração de serviços, que contribuem para o aparecimento de serviços privados.

Até hoje, o Oeste de Portugal é servido por três hospitais, organizados num Centro Hospitalar do Oeste que serve ainda concelhos como Rio Maior. O atual Plano Regional de Ordenamento do Território do Oeste e Vale do Tejo prevê, para esta zona, duas áreas de saúde que corresponderiam a eventuais Unidades Locais de Saúde: o Oeste Norte e o Oeste Sul. Áreas que, por conveniência, têm vindo a ser redefinidas à medida de critérios pouco claros, redistribuídas para criar apenas uma ULS, justificando assim a localização da nova unidade de saúde no Bombarral.

Esta redistribuição congestiona ainda mais os serviços dos hospitais centrais de Leiria e Santarém, já extremamente saturados, prejudicando ainda de forma muito séria o acesso à saúde dos concelhos mais a norte de Leiria que, com o aumento dos habitantes servidos pelo Hospital de Santo André, terão acesso a ainda menos recursos. Ora, se por um lado se aumenta a dimensão da população abrangida por esses hospitais, por outro lado constrói-se ainda mais distante desses mesmos hospitais o único que poderia cooperar de forma próxima.

A política de definição da localização de novos hospitais do Ministério da Saúde é dúbia e incoerente. Se no Oeste se opta por um hospital central, decidido pelos municípios inidóneos na área da saúde, em Barcelos a decisão é totalmente diferente. Neste caso, o Ministério da Saúde criou um grupo com perfil adequado para definir o novo hospital, abrangendo uma população de mais de 150.000 habitantes, espalhados por 474 km2.

No caso do Oeste, foi combinado um estudo realizado por uma entidade externa, sem a presença de representantes dos agrupamentos de saúde e outras entidades relevantes, para responder a cerca de 300.000 habitantes distribuídos por uma área de 1516,32 km2. Enquanto Barcelos tem direito a um hospital de proximidade que responderá rapidamente às necessidades da população, o Oeste, de acordo com os mesmos critérios, não terá hospitais de proximidade mas antes um hospital central com distâncias absurdas para as várias localidades que serve. De uma forma muito concreta, na área de abrangência do Oeste caberiam três hospitais de Barcelos.

Devemos questionarmo-nos sobre o motivo pelo qual em Barcelos o processo é claro e objetivo, baseado em equipas técnicas com conhecimento e, no Oeste, não só não é o Ministério da Saúde que estuda a localização e o seu perfil como ainda se permite ficar refém de estudos inconsistentes e incongruentes. A este respeito, é importante relevar a opinião que o ex-secretário de Estado da Saúde, António Lacerda Sales, expressou recentemente, considerando essencial rever a organização da Unidade Local de Saúde e, eventualmente, a própria de escolha do local, pelo facto de freguesias de Mafra terem passado para outras Unidades Locais de Saúde.

O grupo criado pelo Ministério da Saúde para estudar a localização, perfil e financiamento deste novo hospital do Oeste respondeu tão mal ao que lhe foi solicitado que já é necessário contratualizar um novo serviço externo para a definição do financiamento, o que consome ainda mais tempo e recursos. O referido grupo de trabalho avaliou apenas uma alternativa de localização, de forma pouco rigorosa, definiu um perfil de hospital central para uma área de mais de 1500 km2 e não conseguiu definir uma forma de financiamento. A falta de uma informação clara e a pressa em construir num local ermo e sem condições leva o Ministério da Saúde a lançar um concurso para um estudo, pasme-se, para análise do tipo de financiamento do novo hospital sem haver uma certeza do local para a sua construção nem de um orçamento aproximado.

A confusão está instalada no Ministério da Saúde, no que diz respeito à saúde no Oeste, com um elevado nível de desorganização e inconsistência, na pressa de responder a interesses locais que colocam em risco o SNS e a saúde nacional. Agora que uma legislatura termina abruptamente, surge a oportunidade de corrigir erros e estruturar um processo coerente, justo e isento.

Os autores escrevem segundo o novo acordo ortográfico

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