Como sempre, voltarei

Estarei fora durante uns tempos, alertou o Moisés, mas, como sempre, voltarei.

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Da janela via-se o Tejo. A Rosário sentada ao colo do Moisés pediu-lhe que contasse as suas histórias de mundos distantes e ele disse a frase que passaria a servir de introdução às suas fantasias, sempre que estava com a Rosário: Tapa-me com os teus olhos fechados. A Rosário fechou os olhos e ele, coberto pelas suas pálpebras cerradas, disse: Entrei no salão, percebi que nas traseiras se desenrolava o verdadeiro jogo. Jogavam-se vidas, países, jóias, honra, enfim, o que cada um julgava mais valioso. O sultão de Madahe estava na minha mesa quando se sentou um sujeito com cara de raposa, olhos encovados, anéis em todos os dedos, uma pulseira de prata com decorações beduínas, colocou em cima da mesa, para apostar, uma velha, pequena e enrugada. O homem de cara de raposa era Gomez, ditador da ilha de San Anastacio. Quando lhe perguntaram o que fazia a velha em cima da mesa, disse: Aqui apostam-se as coisas mais valiosas, países, jóias, vidas, eu aposto a minha mãe. E pediu mais duas cartas, antes de perder a mãe no jogo e se levantar com um desabafo: no fundo, o desapego das coisas materiais, como o dinheiro e as mães, cria um certo alívio. O sultão, que tinha ficado com a velha soltou uma gargalhada, e entre os broquéis de seda e o rosário na mão direita, sentou a velha no colo, pôs-lhe o tubo do narguilé na boca para que fumasse com ele. Encontrei-me várias vezes com o sultão que andava sempre com a velha. Chegou inclusive a fazer dela sua mãe adoptiva, e deixou o vício do jogo para não a perder para um ditador qualquer. O sultão tinha por ela um amor maternal.

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