Câmara de Braga gastou meio milhão em rendas de cineteatro que agora vai comprar

Edifício do S. Geraldo é da arquidiocese, à qual a autarquia paga uma renda de 12.500 euros, desde 2017. Após queixas do PS sobre o alegado desperdício de dinheiro, câmara anunciou aquisição imóvel.

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O imóvel é propriedade da Arquidiocese de Braga, à qual a câmara paga uma renda de 12.500 euros mensais Marco Duarte/Arquivo
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A autarquia de Braga vai avançar para a aquisição do edifício do antigo cineteatro S. Geraldo. O imóvel é propriedade da arquidiocese de Braga, entidade com a qual o município estabeleceu, em 2017, um contrato de arrendamento por dez anos de 12.500 euros por mês, por forma a reabilitar o espaço, devoluto há quase três décadas. Após as críticas lançadas nesta segunda-feira, em reunião pública de executivo, pelo vereador sem pelouro do PS, Adolfo Macedo, de que o dinheiro já gasto em rendas foi “deitado ao lixo”, o presidente da câmara, Ricardo Rio (PSD), anunciou que já conversou com o arcebispo de Braga, D. José Cordeiro, com vista à compra do imóvel.

O anúncio surgiu na sequência das críticas de Adolfo Macedo, que fez as contas e concluiu que, nos seis anos desde a entrada em vigor do contrato de arrendamento, a autarquia gastou, em rendas completas, 765.625 euros.

Ao longo dos anos, Ricardo Rio sublinhou que o contrato de arrendamento prevê uma opção de direito de compra e que as rendas já pagas à arquidiocese seriam descontadas no valor a pagar numa eventual aquisição do imóvel, mas Adolfo Macedo pôs em causa a veracidade dessa afirmação.

“O que está no contrato, preto no branco, é que apenas uma percentagem destas rendas já pagas é descontada no valor da compra. À data de hoje, apenas 273.750 euros serão descontados no valor da hipotética compra. Ou seja, 491.865 euros foram directamente para o lixo. Não há volta a dar, são quase 500 mil euros que desapareceram, que se esfumaram”, assinalou o também vocalista dos Mão Morta. E acrescentou: “Não vejo motivo nenhum para estarmos a continuar a atirar este dinheiro ao lixo ou, pior, a fazer deste contrato de arrendamento uma espécie de plataforma giratória de distribuição directa do dinheiro público municipal para a arquidiocese.”

Em resposta, Ricardo Rio revelou que já conversou com o arcebispo de Braga “há já alguns meses” e que houve “disponibilidade para falar” por parte da Igreja. Apesar de ainda não avançar com datas para quaisquer procedimentos na aquisição, o autarca declarou que o primeiro passo será “delinear uma metodologia para estudar o assunto” e avançar para “alterações contratuais e realização de avaliações” no processo.

Concurso para reabilitação avança até final do ano

O contrato de arrendamento do S. Geraldo estabelecido entre a câmara municipal e a arquidiocese surgiu depois de a Igreja ter anunciado um projecto, em 2016, que iria alterar a configuração do edifício centenário, recordado como o primeiro cineteatro de Braga, prevendo-se para lá, com recurso a parcerias com privados, a construção de uma área comercial e um hotel de quatro estrelas.

O projecto da Igreja deu origem a queixas da população e a câmara acabaria por tomar conta do espaço através do arrendamento, prometendo requalificar o imóvel e antecipando para o local a criação de um centro de Media Arts, que se tornasse âncora nas candidaturas de Braga a cidade criativa da UNESCO e Capital Europeia da Cultura. “Na altura, a câmara foi sensível aos reptos de muitos cidadãos, de várias associações, de praticamente todas as forças políticas, no sentido de que esse processo fosse travado e que se optasse por uma outra solução mais de cariz cultural. Isso tem um custo”, recordou nesta segunda-feira Ricardo Rio. Para o autarca, que não rebateu os números adiantados por Adolfo Macedo, os 500 mil euros gastos em rendas até hoje “não são um desperdício”.

“Quem defendia que a câmara municipal tomasse conta do edifício sabia que havia um preço a pagar. E esse preço a pagar traduz-se nas rendas. Ao contrário do que ele [Adolfo Macedo] diz, não é nenhuma forma de financiamento da Igreja. Por acaso, o proprietário do edifício é a Igreja, mas podia ser qualquer outro indivíduo privado”, justificou o autarca.

Desde 2017 até hoje, o imóvel ainda não foi alvo de qualquer intervenção, mas Ricardo Rio assegurou na segunda-feira que o concurso público para a reabilitação do edifício será lançado até ao final do ano. “O projecto teve várias vicissitudes: a fase de auscultação com entidades externas, o período covid e um conjunto de avaliações estruturais com a Universidade do Minho. Neste momento, está em fase final para que até o final do ano seja lançado o concurso.” Este fixar-se-á em 250 mil euros e a previsão é de que, até 2025, ano da conclusão, a renovação custe 6,4 milhões de euros à autarquia.

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