Câmara de Benavente atribui poluição da Vala Nova a descargas de fábrica de tomate

Águas estão negras, oleosas e com cheiros intensos desde 10 de Agosto. Análises do Ambiente só deverão ter resultados definitivos no final desta semana. Mancha de pouluição está muito perto do Tejo.

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Na segunda semana de Agosto, a Vala Nova passou de uma coloração verde para uma coloração completamente negra
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Há quase quatro semanas que as águas de boa parte da Vala Nova de Benavente estão completamente negras e a libertar cheiros intensos que se espalham pela região envolvente. A situação já motivou inúmeras queixas da população e sucessivas recolhas de amostras para análise, mas só no final desta semana deverão ser conhecidos os resultados globais da “bateria” de análises promovida pela Administração da Região Hidrográfica Tejo-Oeste (ARHTO). Técnicos do serviço de ambiente da Câmara de Benavente assumiram, no entanto, na sessão camarária desta segunda-feira, que uma situação com estas características e esta dimensão “terá como raiz as emissões de descarga da fábrica da Sugal”.

Sublinhando que não há mais nenhuma unidade industrial ou actividade na região que pudesse ter este tipo de impacto, os técnicos do serviço de ambiente da Câmara de Benavente admitiram que não têm capacidade nem meios para averiguar se a estação de tratamento de águas residuais industriais (ETARI) da fábrica de transformação de tomate da Sugal-Idal (uma das maiores do país) está a funcionar correctamente. Mas referiram que uma responsável da Sugal-Idal já lhes disse que a ETARI “estava a funcionar normalmente e que não era razão para isto estar a acontecer”.

Certo é que Ricardo Espírito Santo, arquitecto do serviço de ambiente da Câmara de Benavente, mostrou, numa apresentação feita esta segunda-feira aos eleitos locais com base também em imagens do satélite Copernicus, que, na segunda semana de Agosto, a Vala Nova passou de uma coloração verde para uma coloração completamente negra. Esta Vala Nova é uma linha de água artificial que funciona como um braço do Tejo e tem uma dúzia de quilómetros de extensão. Foi construída para alimentar a rega nesta área e para ajudar a drenar as terras nos períodos de maior pluviosidade. Mas é uma linha de água sem saída. Quer dizer que termina a este de Benavente e não é alimentada por nenhuma nascente. Também por isso, em determinados períodos, a renovação de água é escassa e terá levado neste caso a uma acumulação de matéria orgânica que, conjugada com água salobra do Tejo e nove dias consecutivos de temperaturas acima dos 38 graus, provocou o apodrecimento rápido dessa matéria orgânica e a sua acumulação na vala.

Só no passado fim-de-semana é que ocorreram marés de 4,2 metros no Tejo, que terão contribuído para fazer entrar e sair mais água na Vala Nova. O problema, referiu Ricardo Espírito Santo, é que também por isso, a mancha de águas negras está a dirigir-se e a aproximar-se do Tejo, onde deverá chegar nos próximos dias.

Ricardo Espírito Santo acrescentou que só a Vala Nova foi atingida por esta situação e que a afectação da qualidade da água não terá sido demasiado grave, porque as aves continuam a frequentar a linha de água. Mas admitiu que uma quantidade significativa de peixe terá morrido nos primeiros dias, porque “este processo de transformação da massa de água terá sido rápido, terá ocorrido em poucas horas, o peixe terá ficado sem oxigénio e não teve hipóteses de fugir”.

O técnico da Câmara de Benavente considera que poderá ter havido aqui uma conjugação de situações e admite que os valores das emissões impostos na licença ambiental da Sugal-Idal (1998) até estejam a ser cumpridos, mas, se assim for, recomenda a sua revisão pelas entidades competentes, devido às alterações do clima. “A conjugação das águas da Vala Nova com as descargas contínuas de efluentes da unidade industrial da Sugal terá accionado um conjunto de circunstâncias que resultaram em alterações das características biofísicas da água. A matéria orgânica oriunda da unidade industrial terá ficado retida, a água salobra também terá ficado retida e uma grande quantidade de matéria orgânica apodreceu, gerando estas águas cada vez mais escuras e os maus cheiros”, precisou, prevendo que só com chuvas fortes a situação da Vala Nova voltará à normalidade.

Crime ambiental?

Luís Feitor, vereador do PSD, quis saber se haverá aqui uma situação de crime ambiental. Ricardo Espírito Santo explicou que só a ARHTO e a Agência Portuguesa do Ambiente têm condições para o determinar. “Admitindo que a Sugal está a proceder correctamente, não há um crime ambiental. Mas talvez os valores definidos como limite já não sejam os correctos com as mudanças no clima. Tivemos nove dias seguidos de Agosto com mais de 38 graus nesta região, o que não é normal”, constatou.

Já Catarina Vale, vice-presidente da Câmara de Benavente, observou que a autarquia “está muitíssimo preocupada com aquilo que está a acontecer na Vala Nova” (passa a escassas centenas de metros da vila) e espera que a ARTHO e a APA forneçam, nos próximos dias, dados mais claros sobre o que aconteceu. “Alguma área mais punitiva não é da nossa competência, é da APA. Mas agiremos em conformidade na defesa do nosso território e da nossa população”, assegurou a autarca da CDU.

Junto à Vala Nova, alguns habitantes de Benavente mostram-se revoltados com o que está a acontecer. Um deles, que passa quase diariamente pela margem da vala situada junto ao parque de merendas e à ponte da Estrada Nacional 118, diz que há sete ou oito anos que não acontecia ali nada semelhante. Afirma que, nessa altura, a vizinha fábrica de tomate (então gerida pelo grupo Heinz) terá sido multada em 15 mil euros, mas que isso “não é nada” para uma empresa que movimenta centenas de milhões. Agora, garante, morreu muito peixe na Vala Nova, mas não acredita que a câmara e a os organismos da administração central façam alguma coisa de significativo, porque a empresa “tem muita influência”.

O PÚBLICO tentou obter mais esclarecimentos junto do gabinete de comunicação do Grupo Sugal, mas até ao fecho desta edição não teve resposta.

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