Ministro da Cultura sobre Monumental: “Nós precisamos de cinemas com porta para a rua”
Pedro Adão e Silva classifica como “sensível” a desafectação das salas do Monumental e diz que pediu à IGAC para avaliar o estado em que se encontram. Gabinete já reuniu com o dono do imóvel.
O ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, não tem dúvidas de que as salas de cinema são um “bem escasso” e de que manter as poucas que ainda restam fora dos centros comerciais é uma garantia de diversidade da oferta de que importa não abdicar.
“Nós precisamos de ter cinemas com porta para a rua, precisamos de ter cinemas que garantam a diversidade da programação”, disse ao PÚBLICO e à Lusa Pedro Adão e Silva esta quinta-feira à tarde, à saída da conferência internacional Book 2.0, organizada pela Associação Portuguesa de Escritores e Livreiros (APEL), e que está a decorrer esta quinta e sexta-feira no Picadeiro Real, em Lisboa. “Por alguma razão está inscrito na lei que uma sala de cinema precisa de ser desafectada por decisão de um ministro da Cultura.”
Adão e Silva respondia, assim, às perguntas dos jornalistas sobre a possibilidade de o edifício renovado no lugar onde funcionara o velho Cinema Monumental vir a deixar de ter salas destinadas à actividade cinematográfica, de acordo com um pedido feito em Julho pela sua proprietária, a imobiliária espanhola Merlin Properties.
“Esse pedido de desafectação [das salas para projecção de filmes] chegou muito recentemente. É uma situação sensível”, reconheceu Adão e Silva, lembrando em seguida que o Monumental tem uma longa tradição na exibição e que, depois de demolido o edifício original em 1984, perante um coro de críticas dos agentes culturais ligados tanto ao cinema como ao património, o que ali nasceu ficou com a “obrigação de construir [novas] salas de cinema”.
Pedro Adão e Silva tem vindo a reunir informação sobre o Monumental desde que o pedido da Merlin Properties chegou à sua mesa. Hoje mesmo, garantiu, o seu gabinete reuniu com representantes da empresa.
O ministro da Cultura estabeleceu esta quinta-feira como prazo limite para a recepção de propostas de eventuais interessados em explorar os cinemas naquele espaço no centro da cidade. Também pediu a membros da Secção do Cinema e do Audiovisual (Seca) do Conselho Nacional de Cultura que se pronunciassem sobre a situação até hoje.
Esta tarde, Adão e Silva optou por não divulgar se há interessados em ficar com as salas do Monumental, nem adiantou em que sentido vão os conselhos que recebeu dos elementos da Seca. E naturalmente, da reunião com a Merlin Properties nada disse.
Recorde-se que Luís Urbano, um dos sócios da empresa de exibição Cinetoscópio, disse esta semana ao PÚBLICO que estava interessado em explorar a oportunidade de apresentar um projecto de exploração das salas.
Defendendo que o destino a dar àquelas quatro salas de cinema fechadas há quatro anos não é uma “decisão que se tome de forma ligeira, precipitada e rápida”, o ministro garantiu que o importante nesta fase é averiguar as condições de conservação em que se encontram, uma vez que as informações são divergentes: “Pedi à IGAC, a Inspecção-Geral de Actividades Culturais, que muito brevemente se desloque ao Monumental para verificar in loco o estado daqueles cinemas.”
Contactada pelo PÚBLICO na quarta-feira, a empresa de comunicação que representa a imobiliária espanhola afirmou, então, que “as salas de cinema não foram intervencionadas e estão tal e qual como estavam em 2019”.
Contraditória é também a informação que tem vindo a público para valores de uma eventual reabilitação dos espaços, sublinhou o ministro, que aponta para números muito díspares. “Qualquer solução depende da vontade partilhada dos proprietários e de eventuais investidores”, acrescentou, sendo que nessa decisão pesa o montante a despender para devolver as salas à sua actividade original.
“É um factor de empobrecimento num quadro em que até há números interessantes de recuperação de espectadores de cinema se tudo o que é programado tiver uma certa homogeneidade. As salas abertas para a rua tendem a ter uma programação distinta”, concluiu, evocando o bem-sucedido caso do cinema Batalha, que reabriu recentemente no Porto. “[O Batalha] mostra como é possível ter uma programação alternativa com público.” Com Isabel Coutinho