Tribunal Constitucional não dá razão a Marcelo e valida nova lei da droga

Presidente da República tinha pedido fiscalização do decreto por “falta de consulta” dos órgãos de Governo das regiões autónomas. Agora vai promulgá-la, mas com um reparo ao Governo.

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José João Abrantes, presidente do Tribunal Constitucional Rui Gaudêcio

O Tribunal Constitucional (TC) validou, nesta terça-feira, a constitucionalidade do decreto do Parlamento que descriminalizou as drogas sintéticas e fez uma nova distinção entre tráfico e consumo, na sequência do pedido de fiscalização preventiva apresentado pelo Presidente da República.

Na leitura pública realizada no Palácio Ratton, em Lisboa, o juiz conselheiro relator Carlos Medeiros Carvalho anunciou que o “TC decidiu por unanimidade não se pronunciar pela inconstitucionalidade” de normas regulamentares do decreto aprovado pela Assembleia da República em 19 de Julho.

Desafios da insularidade

A explicação da decisão foi reforçada pelo presidente do TC, José João Abrantes, “por entender que, para efeitos do dever de audição prévia (...), a matéria não se apresenta como envolvendo questões respeitantes às regiões autónomas”, uma vez que Marcelo Rebelo de Sousa tinha justificado o envio com a “falta de consulta” dos órgãos de Governo das regiões autónomas da Madeira e Açores.

No acórdão lido ontem, os juízes conselheiros esclarecem que o TC não se pronuncia com o fundamento específico invocado pelo Presidente da República da violação do direito constitucional de audição prévia dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas, argumentando, entre outros aspectos, que a lei não vai implicar reformas de fundo que imponham a criação de serviços próprios de raiz, mas apenas que a lei “visa clarificar” uma matéria que já existe e que dispõe de “uma organização de serviços já estabelecida” nas regiões autónomas.

O acórdão refere ainda que “não se ignora que a insularidade pode colocar desafios acrescidos em matéria de prevenção e combate ao tráfico e consumo de drogas nem que os dados recentes revelam assimetrias regionais” no que respeita à prevalência de consumo actual e recente na Madeira e nos Açores. No entanto, conclui, “não pode confundir-se uma simples oportunidade de audição com o dever de audição”.

Na nota presidencial sobre o pedido de fiscalização ao TC, a 17 de Agosto, o Presidente da República indicara iria requerer ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva de constitucionalidade, por falta de consulta aos órgãos de governo próprio daquelas regiões, do decreto da Assembleia da República sobre “o regime sancionatório relativo à detenção de droga para consumo”, e que, por proposta do PS, descriminaliza a posse de qualquer droga independentemente da quantidade detida.

E isto, dizia, “sem prejuízo de reservas sobre uma questão de conteúdo, e na linha do entendimento que já vem dos tempos do Presidente Jorge Sampaio, considerando, agora, em particular, a especial incidência dos novos tipos de drogas nas regiões autónomas, o regime sancionatório nelas adoptado e a regionalização dos serviços de saúde, fundamentais para a aplicação do novo diploma”.

Marcelo vai promulgar

Pouco depois de a decisão do TC ser tornada pública nesta terça-feira, o Presidente da República anunciou que vai promulgar a nova lei. “O Presidente da República, depois de o Tribunal Constitucional ter decidido desatender a posição da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, assim esclarecendo uma questão que importava para a aplicação do diploma, procederá à sua promulgação, mal ele lhe seja remetido” lê-se na nota enviada à comunicação social.

Mas não deixa de fazer um reparo: “Ao fazê-lo [promulgação], não deixa de chamar a atenção para o facto de a Assembleia da República ter divergido do Governo no ponto sensível da definição da quantidade de droga detida por quem tenha de ser considerado mero consumidor ou efectivo traficante.” ​

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