No País dos arquitectos: como se transforma uma garagem numa casa?

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No 67.º episódio do podcast “No País dos Arquitectos” (o último da quinta temporada), Sara Nunes, da produtora de filmes de arquitectura Building Pictures, conversa com o arquitecto Filipe Magalhães, do atelier Fala, sobre a Casa Garagem, em Lisboa.

Logo no início da conversa, o arquitecto recorda como o projecto nasceu: havia um casal que precisava “de saltar da elevada renda [que estava a pagar] para um empréstimo que lhe desse a possibilidade de comprar uma casa”. Para o atelier era “a encomenda de uma vida” e, para o casal – o Tomas e a Lia – a oportunidade de mudar de rumo: “Na altura, eles encontraram um agente imobiliário que, depois de quatro ou cinco visitas lhes disse: «Não vamos encontrar o que estão à procura. Por essa ordem de preços, comprem, antes, um armazém, uma garagem, ou um arrumo.»” Eles aprovaram a ideia e quiseram saber o que havia disponível naquela tipologia: “Nas semanas seguintes, visitaram algumas garagens. Quando encontraram aquela, especificamente, gostaram bastante”, lembra Filipe Magalhães.

O passo seguinte foi entrar em contacto com os arquitectos Fala. Queriam saber se o atelier estaria disponível para transformar um espaço de garagem numa casa confortável para habitar. O Tomas e a Lia receberam prontamente um “sim”. Durante a entrevista, Filipe Magalhães fala sobre o desafio do projecto: “Era um espaço que estava preparado para receber carros, tinha sido usado como armazém, durante algumas décadas, mas não estava preparado para ser uma casa. E aquilo que nos era pedido era isso. Mais do que uma questão formal, havia uma questão tipológica: «Como é que transformamos uma coisa que não é, naquilo que pretende ser?»”

Como o espaço tinha apenas 200 m2 , o casal sabia que aquela não seria “uma casa tradicional”, mas era a habitação possível com os recursos disponíveis. Em retrospectiva, o arquitecto sublinha que o orçamento reduzido foi uma vantagem e não um obstáculo: “Eu acho que, para fazer um bom projecto, é preciso uma série de factores: é preciso um bom cliente e um orçamento adequado à ideia que se pretende, mas aqui acabou por acontecer o contrário. A ideia adequou-se ao orçamento possível e foi melhor assim. Se nós tivéssemos o dobro ou o triplo do orçamento, acho que não teríamos um melhor projecto. Bem pelo contrário. Até o tínhamos piorado.”

Inicialmente, o armazém era iluminado por quatro clarabóias. Apesar do carácter industrial do espaço, Filipe Magalhães reconhece que “toda a arquitectura já lá estava” e não seria necessário mudar muito: “Quando o fundo acaba por ser tão neutro, [os outros elementos] – a cozinha, as cortinas, as duas portas da casa de banho – [tornam-se] os actores. E depois há também tudo o resto que veio a acontecer: os sofás, a mesa... Ou seja o que definia aquele espaço, como casa, não era o espaço em si, mas, sim, a ocupação. Onde estivesse uma cama, havia um quarto. Onde estivesse um sofá, havia uma sala, mas se eles mudassem a mobília – e fizeram-no várias vezes – o próprio espaço também se adaptava a isso.”

Apesar de várias pessoas terem visitado o espaço na 5.ª edição do Open House Lisboa, a Casa Garagem acabou por ter um curto tempo de vida, resistindo apenas seis meses: “No morro que fazia as costas da propriedade, na parte de cima, estava a ser feita uma construção muito violenta que, mais tarde, viemos a descobrir que era ilegal.” O arquitecto conta que essa construção provocou “o desmoronamento do morro” e afectou alguns dos edifícios circundantes, incluindo a própria casa. O Tomas e a Lia não sofreram danos físicos, mas depois desse acontecimento decidiram vender o imóvel: “Actualmente, a Casa Garagem não é Casa Garagem, é um café e funciona com uma lógica espacial muito idêntica. Se eu quiser ver o copo meio cheio, posso falar da flexibilidade outra vez porque aquele espaço continua a adaptar-se, mas preferia continuar a ir lá, de vez em quando, e a discutir com eles os vasos, as cadeiras e tudo o resto. Foram apenas seis meses.”

Depois deste projecto, o atelier transformou outras garagens e espaços do rés-do-chão em habitação. Filipe Magalhães acredita na importância desta componente prática: “Eu acho que só se aprende a construir, construindo. Nós, na faculdade, aprendemos muita coisa, mas gerir um cliente, acompanhar uma obra, fazer um licenciamento, perceber o que é um projecto de execução, perceber o que é responsabilidade civil... Acho que essas coisas todas só acontecem mesmo a sério quando nós estamos na posição de passar por elas.”

No final da conversa, o arquitecto fala sobre as colagens que o atelier desenvolve e revela o que cada projecto procura comunicar: “Eu acho que, acima de tudo, [os edifícios] falam sobre nós. Falam sobre as nossas obsessões, as nossas preocupações e os temas que nos interessam, enquanto arquitectos. Acabam por ser só um reflexo da nossa personalidade, em certa medida: por um lado, muito básicos, muito simples, muito baratuchos; por outro lado, exuberantes e, às vezes, expressivos. Também falam de uma certa pluralidade porque [neste atelier] somos dez numa lógica profundamente horizontal. O que quer dizer que não ganha quem fala mais alto e por isso acaba por haver uma espécie de homogeneidade na inconsistência dos projectos. (...) Eu acho que é isso que nós queremos que os projectos comuniquem: uma espécie de consistente inconsistência.”

Para saber mais sobre a história da Casa Garagem e o trabalho desenvolvido pelo atelier Fala, ouça a entrevista na íntegra.

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