Furto de azulejo diminuiu 84% no país desde 2007

Nos últimos 16 anos, o furto de azulejos decresceu drasticamente, em resultado de políticas de preservação. Ainda assim, a SOS Azulejo lamenta a “banalização” da delapidação deste património.

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Foram os árabes que introduziram na Península Ibérica a arte da azulejaria Adriano Miranda

A diminuição de 84% dos furtos de azulejos é um dos resultados do trabalho do Projecto SOS Azulejo, lançado em 2007 pelo Museu da Polícia Judiciária e que continua activo na promoção da salvaguarda do património azulejar do país.

Este é um dos resultados quantificáveis do projecto, segundo o relatório de 2022, mas as perdas dos azulejos históricos e artístico do país são "incalculáveis" e "muito mais vastas na sua forma legal", alertou a coordenadora do SOS Azulejo, Leonor Sá, em entrevista à agência Lusa.

"Quando as pessoas pensam em delapidação azulejar, lembram-se mais dos furtos, mas estou convencida de que, se pudéssemos fazer uma análise quantitativa e comparativa, as perdas mais substanciais foram as realizadas por via legal do que por meio ilegal", avaliou.

O azulejo tem 500 anos de produção nacional e ganhou tradição em Portugal na arquitectura, revestindo inúmeras igrejas e palácios nobres, outros edifícios da paisagem urbana do país e nas artes decorativas.

"Os portugueses sempre viveram rodeados de azulejos e não lhes conferiram a devida importância. Quando os estrangeiros chegam a Portugal ficam absolutamente deslumbrados e assombrados. É um património que não existe na mesma expressão em qualquer outro país", sublinhou a mentora do projecto, lamentando a atitude negativa de "banalização deste património".

A arte da azulejaria criou raízes na Península Ibérica trazida pelos árabes, que produziram mosaicos para ornamentar as paredes de palácios e outras habitações. A técnica foi adoptada pelos artesãos, que conceberam padrões ao gosto local.

No virar do século XX para o século XXI, e sobretudo a partir dos anos 1980, este património azulejar foi alvo de demolições e remoções um pouco por todo o país.

"Estas perdas eram muito frequentes, e ninguém falava no assunto. Não havia sensibilização. Era uma matéria não abordada ou debatida, nem na sociedade civil, nem na academia, ou entre especialistas", disse à Lusa a conservadora do Museu de Polícia Judiciária (PJ), em Lisboa.

Foi neste contexto que surgiu o SOS Azulejo, um projecto que procurou ir além da responsabilidade do trabalho das brigadas de obras de arte da PJ, que têm a missão de investigar os furtos nesta área, para desenvolver a vertente da prevenção criminal e promoção da salvaguarda deste património.

Leonor Sá recordou que, desde que o projecto começou, há 16 anos, e sobretudo a seguir à aprovação, em 2017, de legislação no parlamento, "deu-se uma diminuição drástica das demolições e das remoções de azulejos, que passaram de frequentes para casos excepcionais, mas que não é possível quantificar exactamente, porque não existem números".

Antes de conseguir a aprovação de um conjunto de propostas na Assembleia da República, o projecto teve de percorrer um longo caminho que começou pela capital, onde apresentou, em 2011, propostas para incluir a protecção deste património no existente Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação de Lisboa (REMUEL).

"Propusemos duas medidas que interditaram a demolição de fachadas azulejadas e a remoção dos azulejos. Foi extremamente importante, porque os edifícios até então só eram possíveis de ser protegidos através de classificação, e tinham de ser especiais", recordou Leonor Sá.

A entrada em vigor do novo REMUEL, em Lisboa, em 2013, fez com que o património azulejar passasse a ser visto como um todo, e todos os seus elementos tivessem de ser protegidos.

"Antes da entrada em vigor desse regulamento, as demolições eram praticamente semanais em Lisboa. Era um massacre", lamentou a coordenadora do projecto, lembrando que este património azulejar "é absolutamente identitário da cultura portuguesa e nele se pode ler a História de Portugal".

Um passo seguinte foi sensibilizar as autarquias de todo o país, através da parceria com a Associação Nacional de Municípios Portugueses, com 300 membros, para adoptarem o mesmo regulamento. Mas como "ao longo de três anos pouco ou nada aconteceu", o SOS Azulejo preparou propostas para apresentar no parlamento a partir de 2015.

Dois anos mais tarde viu concretizado o objectivo da aprovação da lei 79/2017, que interdita a demolição das fachadas azulejadas e remoção de azulejos a nível nacional.

De acordo com a coordenadora do SOS Azulejo, "de um modo geral, e paulatinamente, os municípios têm estado a interiorizar esta sensibilidade, nova maneira de valorizar o património, e a cumprir a lei, mas ainda há uma ou outra excepção".

"Esta legislação veio estancar a sangria de delapidação azulejar que tinha havido até 2017. No entanto, é preciso continuar a chamar a atenção dos municípios para este património", reiterou, apontando que não é função do projecto fazer fiscalização, fora do âmbito das suas competências.

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