PSP enviou para o Ministério Público caso de comentários racistas na Internet

Em causa está a fotografia de um homem negro fardado, num anúncio de recrutamento para o curso de oficiais de polícia, que gerou vários comentários racistas nas redes sociais.

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A PSP diz que está a analisar e a recolher a informação necessária para "accionar os adequados mecanismos legais" José Sérgio/Arquivo
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A PSP classifica os comentários racistas a um anúncio de recrutamento colocado online, com a fotografia de um negro com a farda da polícia, como “tristes factos” e o porta-voz da instituição afirma que esta “repudia qualquer forma de discriminação, independentemente da sua natureza, nomeadamente racista”. O caso foi remetido ao Ministério Público e à Comissão para a Igualdade e contra a Discriminação Racial.

O anúncio sobre o 40.º Curso de Formação de Oficiais da Polícia foi colocado nas redes sociais da PSP na passada sexta-feira. Sob as frases “Queres tornar-te Oficial da Polícia? Esta é a oportunidade pela qual esperavas”, apelava-se à candidatura de interessados, mostrando a fotografia de um agente negro fardado.

Se no Facebook as reacções foram poucas, e maioritariamente positivas, no Twitter a publicação foi alvo de vários comentários com teor racista. “O concurso também está aberto a homens brancos portugueses?”, perguntava um dos comentadores, enquanto outro questionava: “Não quero ser racista, mas o que está um preto a fazer na polícia portuguesa?”

Alguém que se identifica como Graça comenta: “Mudámos para África e eu não sabia.” E outro comentador indignava-se: “A quantidade de comentários anti-racistas aqui é nojenta. D. Afonso Henriques está a dar voltas no caixão a ver como estes traidores não se importam de substituir o seu povo com africanos, nepaleses e mais o que for. Nojentos.”

Dois dias depois, e com o caso a saltar para as notícias, a PSP colocou uma nova publicação nas redes sociais, sem fazer referência ao caso, mas com a mensagem: “O discurso de ódio é crime e tem um impacto muito negativo nas vítimas, tanto a nível emocional como psicológico. Denuncie estes casos à #PSP. Siga os nossos conselhos e ajude-nos a travar o discurso de ódio.”

Já o post original do Twitter encheu-se de novos comentários, a criticar o teor discriminatório dos anteriores e a incentivar a polícia a identificar os seus autores e a agir em conformidade.

Em resposta ao PÚBLICO, na manhã desta segunda-feira, fonte da PSP garantia que era isso mesmo que estava a ser feito. “Estamos a analisar e a recolher a informação necessária para accionar os adequados mecanismos legais, de reporte às autoridades competentes para processar os tristes factos em questão”, afirmava, em resposta escrita. À tarde, em comunicado, a PSP actualizou a informação, dando conta que, após as primeiras averiguações, foi hoje mesmo “elaborado auto de notícia, já remetido ao Ministério Público, com referência aos factos apurados até ao momento e à informação que se considera ter relevância criminal”.

Além disso, a PSP enviou para a Comissão para a Igualdade e contra a Discriminação Racial “os comentários que consubstanciam infracção de natureza contra-ordenacional por ser da competência desta entidade.

ASPP sem queixas

A direcção nacional da PSP insiste que esta força policial “repudia qualquer tipo de discurso ou comentários de teor racista e reitera que todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei e que ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual, conforme consagrado na Constituição da República Portuguesa”.

Paulo Santos, dirigente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), diz estar convicto que os comentários polémicos não reflectem a realidade que enfrentam os agentes negros da corporação. “Nunca me foi reportada qualquer situação, nunca foi tema ou assunto colocado, que os agentes de cor [sic], quer na formação, quer no activo, se tenham sentido de alguma forma destratados pelos seus pares ou pela hierarquia”, diz. Sobre algum caso em que os agentes possam ter sido alvo de discriminação por parte do público, Paulo Santos também diz não ter conhecimento de qualquer caso.

Lembrando a polémica recente envolvendo a PSP e em que eram os agentes a ser acusados de assumirem atitudes racistas, Paulo Santos lamenta que o tema do racismo seja “discutido sempre de forma redutora” e recusa-se a valorizar as redes sociais. “Não consigo, enquanto responsável da ASPP, comentar o que se passa nas redes sociais, porque, apesar de ser preocupante, já vi o mesmo elemento com 20 perfis a lançar fogo. É uma situação que não me merece comentários, porque as redes sociais são algo de que me tento afastar para não pensar que há tanta gente com essas opiniões. A Internet é muito interessante e útil, mas muito má para discussões com muita responsabilidade”, observa.

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