A montra londrina da arquitectura mundial pertence a Lina Ghotmeh este Verão

Para fazer o pavilhão da Serpentine Gallery, a arquitecta franco-libanesa cruza a copa de uma árvore com a arquitectura do Mali. O espírito de Kensington Gardens também passa por aí e à boleia do chá.

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O pavilhão é construído em madeira, um material natural HARRY RICHARDS/Cortesia Serpentine Gallery
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O pavilhão de Lina Ghotmeh abre esta sexta-feira e é visitável até final de Outubro Iwan Baan/Cortesia Serpentine Gallery
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A arquitecta Lina Ghotmeh no exterior do pavilhão HARRY RICHARDS/Cortesia Serpentine Gallery
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"À table", o título do pavilhão, é “um convite a sentarmo-nos à mesa e a entrar em diálogo” Iwan Baan/Cortesia Serpentine Gallery
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O padrão dos painéis que constituem as paredes-biombo do pavilhão é inspirado nas folhas das palmeiras, tal como a cobertura Iwan Baan/Cortesia Serpentine Gallery
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A arquitecta franco-libanesa Lina Ghotmeh é a última coqueluche da Serpentine Gallery, em Londres, que todos os anos, sob a direcção do curador Hans Ulrich Obrist, encomenda um pavilhão de Verão, uma arquitectura efémera, numa lista que inclui nomes sonantes como Oscar Niemeyer, Zaha Hadid, Álvaro Siza (com Eduardo Souto de Moura), Sou Fujimoto ou Francis Kéré. A premissa desta iniciativa que começou em 2000 é que sejam arquitectos internacionais que nunca tenham construído em Inglaterra.

O pavilhão de Lina Ghotmeh abre esta sexta-feira e é visitável até final de Outubro.

Lina Ghotmeh, 46 anos, que cresceu em Beirute durante os anos da guerra e tem um atelier em Paris, quis trazer para o relvado dos jardins de Kensington a experiência do convívio do Mediterrâneo que, sabemos, se faz à volta de uma mesa com comida. À table, o título do pavilhão, é “um convite a sentarmo-nos à mesa e a entrar em diálogo”, escreve o comunicado de imprensa da Serpentine Gallery.

No interior, então, o pavilhão recebe-nos à volta de uma grande mesa circular, que, na prática, é constituída por 25 mesas e respectivos 57 bancos. "Considerando a comida como uma expressão de afecto capaz de oferecer um momento de convívio em torno de uma mesa, Ghotmeh recebe-nos para compartilhar ideias, preocupações, alegrias, insatisfações, responsabilidades, tradições, memórias culturais e histórias que nos unem.” Com o seu projecto, acrescenta o comunicado, Ghotmeh também presta homenagem ao edifício da Serpentine, que originalmente era uma Casa de Chá, antes de ser transformada numa galeria de arte nos anos 70.

A Serpentine lembra que na sua prática de arquitectura Ghotmeh desenvolve a aproximação ao projecto à volta do conceito de “arqueologia do futuro”, ampliado por uma preocupação em desenhar espaços sustentáveis em diálogo com a história do lugar. A forma do pavilhão explora a protecção que a copa de uma árvore pode oferecer num jardim, numa paisagem, cruzada com um conceito pedido emprestado à arquitectura vernacular do Mali — as "togunas" —, casas de madeira, profusamente esculpidas, em que a comunidade se encontra para discutir os assuntos que dizem respeito a todos. “Os telhados baixos dessas estruturas incentivam as pessoas a permanecerem sentadas pacificamente e a fazerem pausas durante as discussões”, acrescenta a Serpentine Gallery. (Francis Kéré, o primeiro Prémio Pritzker africano, também trabalhou o conceito da "toguna" num pavilhão em madeira que construiu em 2019 no Montana, EUA).

Arqueologia do futuro

O pavilhão de Lina Ghotmeh é construído em madeira e procura deixar em Kensington Gardens uma pegada de carbono tão próxima do zero quanto possível. O material orgânico entra em diálogo com o ambiente natural, tal como o padrão dos painéis que constituem as paredes-biombo do pavilhão. “A madeira é um material magnífico. Vivo, emana da natureza, reflecte-a. Construir em madeira significa ouvir o material para desenhar as formas”, explicou a arquitecta ao jornal francês Le Monde em 2021, a propósito de um projecto para uma torre ecológica em Paris.

No último mês, a arquitecta terminou um edifício na Normandia para a Hermès, onde a marca de luxo francesa tem localizadas as oficinas dedicadas ao trabalho em pele. O conceito de “arqueologia do futuro” é bem visível aí: a equipa utilizou a terra retirada das escavações realizadas para fazer as fundações do edifício para produzir os 500 mil tijolos — moldados à mão — que foram necessários para erguer a fábrica-atelier da Hermès, uma marca que sublinha a importância do trabalho artesanal, da mão, na produção dos seus artigos. Ou, como nota o El País, “tijolos feitos à mão com barro de quilómetro zero”.

Em 2021, na Bienal de Arquitectura de Veneza, que teve a curadoria-geral do também libanês Hashim Sarkis, Lina Ghotmeh apresentou Stone Garden, um projecto para um edifício de apartamentos que é uma elegia à arquitectura que sobrevive à guerra. "Em Beirute", lembra a arquitecta no seu site, "somos convidados a alterar a nossa percepção do que pode significar uma abertura numa fachada." Será o vão de uma janela ou um buraco provocado por uma bomba? A história das cidades, como a guerra na Ucrânia voltou a recordar, também se faz através dos conflitos.

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