Anúbis era um dos galgos esqueléticos de João Moura — agora está assim

Quando foi resgatado pela GNR, o cão estava subnutrido e com várias zonas do corpo sem pêlo. Patrícia pagou-lhe os tratamentos e, meses mais tarde, acabou por adoptá-lo. “É um cão muito tranquilo.”

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Anúbis foi resgatado em Fevereiro de 2020 DR
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Em Fevereiro de 2020, o cavaleiro tauromáquico João Moura foi acusado de maus tratos a animais depois de 18 dos seus galgos, que fugiram da Herdade de Monforte, em Portalegre, apresentarem sinais visíveis de subnutrição.

Anúbis, na altura com três anos, fazia parte desta matilha utilizada para corridas de galgos. Além de estar esquelético, os veterinários descobriram que tinha um fungo transmissível que lhe provocava queda de pêlo, assim como feridas e irritações na pele. O animal foi rapidamente resgatado pelo Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (Sepna) da GNR, e o caso noticiado. Patrícia Babo, 32 anos, assistiu a tudo pela televisão.

“Fotografei um dos cães que apareceu e percebi que estavam a pedir padrinhos para ajudar a pagar as despesas. Entrei em contacto com o Cantinho da Milú no próprio dia, enviei a imagem em anexo e disse que queria apadrinhar o cão e ajudar nas despesas”, começa por explicar ao P3. Não consegue especificar o motivo de ter escolhido o cão de pêlo cinzento, mas aponta “o olhar” do animal como uma justificação possível. O nome Anúbis, deus da morte, foi cuidadosamente escolhido.

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Anúbis foi adoptado há quatro anos Patrícia Babo

“Se ele sobreviver a isto tem o seu significado”, recorda a dona que também é treinadora de cães em Vila do Conde. Em declarações ao P3, o Cantinho da Milú adianta que acolheu nove galgos e que todos foram adoptados em 2020.

Apesar de ser "madrinha", adoptar o cão não estava nos planos de Patrícia e do marido, uma vez que o casal já tinha cinco cães. Meio ano depois, um novo email da associação alterou-lhes os planos: Anúbis já podia ser adoptado e a associação estava a ter dificuldade em perceber se o interesse demonstrado por outras pessoas era verdadeiro ou se o animal ia ser novamente utilizado para caça ou corridas. Com Patrícia, sabiam que estaria seguro.

Segundo a treinadora, apesar dos maus tratos, Anúbis sempre se mostrou um cão sociável — e quando conheceu a nova dona, em Setembro de 2020, só precisou de alguns minutos até ganhar confiança e começar a correr. “Parece que percebeu que estávamos lá por causa dele”, adianta, acrescentando que só há poucos meses começou a contar que João Moura era o antigo dono.

Em casa da nova família, Anúbis melhorava a cada dia: o fungo já tinha desaparecido, o pêlo crescia e recebia mimos a toda a hora. No entanto, também tinha momentos em que ficava estático durante meia hora e não reagia à chamada ou ao toque, situações que os veterinários nunca conseguiram explicar.

O único problema, conta a dona, era a competição em que entrava quando corria com Olívia, o outro galgo da família. “Não mordia, mas dava-lhe encontrões para provocar o afastamento dela da corrida e isso teve que ser trabalhado”, recorda.

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Olívia e Anúbis (da esquerda para a direita) Patrícia Babo

Corridas continuam a ser permitidas em Portugal

Dos 18 galgos resgatados da herdade de João Moura, 17 sobreviveram. O caso reacendeu o debate sobre as corridas destes animais em Portugal e a forma como os mesmos são tratados. Na altura, em declarações ao blogue Farpas, o cavaleiro tauromáquico desvalorizou a situação afirmando que “tinha uns cães magros” mas reforçando que nunca os tinha tratado mal.

No entanto, o Ministério Público não pensou da mesma forma e, em 2022, acusou João Moura de 18 crimes de maus tratos a animais de companhia, um dos quais na forma agravada. Além disto, PAN e Bloco de Esquerda procuraram proibir as corridas, mas sem sucesso.

Questionada sobre as competições, Patrícia diz não ter uma “opinião extremista”, mas reconhece que falta legislação sobre esta actividade, que, entre outros aspectos, permite o uso de esteróides e coleiras de choque nos animais.

“No meu trabalho, tanto falo com pessoas que fazem corridas de galgos e caçadores como com associações que resgatam estes cães. Faço reabilitação de galgos no contexto de caça e corrida e é claro que nem todos são maltratados, mas infelizmente há uma grade percentagem que o é”, alerta.

Apesar de nunca mais ter participado em corridas, Anúbis, que está prestes a celebrar sete anos, costuma correr “pelo menos duas vezes por semana” na companhia dos donos. Actualmente, pesa 33 quilos. “Toda a gente que o conhece acha-o amoroso. É um cão muito tranquilo.”

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