Cannabis altera resposta sexual de ratos: fêmeas “procuram machos” fora da época reprodutiva

Investigadores da Universidade do Porto descobriram que o THC promove “uma procura pelo macho que não é comum”, fora da época tipicamente reprodutiva.

Foto
O THC promove “uma procura pelo macho que não é comum”, fora da época tipicamente reprodutiva shironosov/Getty Images

Pode a cannabis alterar a resposta sexual feminina? Sim, sugere um estudo levado a cabo por Flávia Costa e Susana Sá, da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, e Bruno Fonseca, da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto.

O grupo de investigadores quis descobrir qual a resposta dada pelo cérebro de ratos fêmea ao delta-9-tetrahidrocanabinol (​THC), a substância psicoactiva da cannabis, quando associado às hormonas femininas, ou como é que o sistema endócrino (que liberta hormonas) e o endocanabinóide (o mesmo de actuação das drogas) se relacionavam.

Já era sabido que as variações hormonais provocam alterações no cérebro. E que o sistema endocanabinóide provoca alterações hormonais. Os investigadores também já sabiam que o THC provocava uma “activação de comportamento” nos machos, mas acreditavam que o mesmo não iria acontecer no caso das fêmeas. “Reparamos que não é bem assim: o THC acaba por promover uma proactividade, uma procura pelo macho que não é comum.” Por outras palavras, é como se aumentasse o desejo sexual — caso os ratos tivessem desejo sexual.

Susana Sá explica que os ratos fêmea têm “comportamento sexual numa fase do ciclo em que está tudo conjugado para que haja reprodução”. O que acaba por acontecer, como reportam no estudo The effects of delta-9-tetrahydrocannabinol administration in the regulation of female rat sociosexual behaviour, publicado no European Journal of Neuroscience, é que o THC “vai sobrepor-se a este sistema regulado e promover a procura pelo macho numa altura em que não era suposto isso acontecer”.

Quando o rato fêmea já está “motivado” na procura, o THC não tem tanta acção, salvaguarda a investigadora. É, resume, um “desarranjo” que acontece na fase em que não é suposto a fêmea procurar o macho, e que se tornou (literalmente) visível pela quantidade de visitas que as fêmeas fizeram aos machos sob o efeito da substância (a experiência permitia que os ratos viajassem). “A procura é até de uma forma mais despreocupada”, descreve.

Ainda é “um bocadinho precoce” dizer que este comportamento se pode repetir em humanos. A investigadora refere que “os mecanismos neuronais serão exactamente os mesmos”, mas “o comportamento das mulheres não é igual”. Apesar de ser imprevisível adiantar o que os mecanismos neuronais vão desencadear a nível comportamental, os investigadores acreditam que poderão resultar “no aumento da libido de forma não pensada”.

No futuro, o grupo de investigação quer perceber que alterações comportamentais aconteceriam com doses mais altas de THC, mais “aproximadas da realidade”. “As hormonas dadas aos animais estavam em maior concentração do que a quantidade de THC. E isso não foi leviano. Queríamos perceber como é que até uma dose pequena, que se poderia considerar uma dose de vez em quando, teria resposta”, diz Susana Sá. Mas, na realidade, a quantidade consumida vai aumentando, e é essa aproximação que querem testar.

Os investigadores querem ainda perceber como é que a “a toma da droga pela mãe acaba por impactar estes circuitos no desenvolvimento do cérebro de uma cria”, bem como o desenvolvimento dos “mecanismos de aprendizagem e memória” nas gerações seguintes.

Sugerir correcção
Ler 2 comentários