Cartas ao director

Carta aberta a Carlos Moedas

Caro presidente Carlos Moedas, digiro-lhe esta missiva na qualidade de participante do primeiro Conselho de Cidadãos de Lisboa (CCL). Uma iniciativa da sua autoria, prometedora, e que poderia ter inaugurado uma nova forma de fazer cidade na nossa Lisboa.

Quero antes de mais deixar bem claro que o CCL foi profícuo em ideias e propostas, o seu resultado é que foi pífio. Não confundamos, portanto, a beira da estrada com a Estrada da Beira.

No dia em que se completavam dez meses da primeira edição do Conselho de Cidadãos de Lisboa (CCL), 14 de Março, e após meses de silêncio, receberam os participantes um e-mail da Câmara Municipal de Lisboa (CML) com o estado da execução das propostas e que se resumia a uma campanha de sensibilização, que se nota claramente que já havia sido concebida antes, pois nem a chancela do CCL tem, e ao planeamento de um jardim em cada esquina como motor de arrefecimento. Recordo, a este propósito, que o tema proposto para edição inaugural do CCL foram as alterações climáticas. Este e-mail que os participantes receberam só existiu porque este jornal questionou a edilidade sobre o estado das propostas saídas do primeiro CCL.

O teor do e-mail enviado pela CML é deveras revelador do que a autarquia não fez com as propostas, cerca de meia centena, e termina de uma forma absolutamente inqualificável. Informa os participantes, e passo a citar, de que "quanto às outras áreas resultantes das vossas propostas, como todos sabem, a CML não tem capacidade de implementar todas." Recordar-se-á certamente senhor presidente de que nos dias de trabalho do primeiro CCL quer o engº. Carlos Moedas, quer outros responsáveis da câmara admitiram que muitas das propostas eram de fácil execução, bastando para o efeito articular os diferentes departamentos e serviços municipais.

Nas vésperas da segunda edição do CCL quero com esta carta, acima de tudo, que a autarquia a que preside se comprometa com os participantes deste e de outros conselhos de cidadãos de Lisboa a executar as suas propostas e não a gorar as expectativas dos participantes, liquidando de um só golpe o que creio ser o modelo futuro de governação local. Desta primeira experiência do CCL ficou claro que os cidadãos de Lisboa não podem confiar as suas ideias ao presidente Carlos Moedas.

Bruno Antunes, Lisboa

Justiça a duas velocidades

Em qualquer Estado de direito democrático, a lei é supostamente igual para todos os cidadãos, independentemente do estatuto social e económico. Em Portugal, por força de códigos processuais arcaicos, as coisas não acontecem assim, pelo que a lei tem um cunho muito diferente consoante a capacidade económica do cidadão julgado.

Um cidadão pobre que cometa um crime vê o seu processo correr célere e ser condenado sem poder recorrer da sentença por falta de meios. Se o processo correr contra alguém com dinheiro, tudo muda, pois o recurso a grandes advogados e a existência de imensos mecanismos processuais, que travam o processo, vai adiando a resolução de decisões, que, em inúmeras ocasiões, envolvem milhões de euros. É caso para dizer que temos duas justiças, a da gazela, para os pobres, e a da tartaruga, para os poderosos.

Manuel Alves, Lisboa

Marcelo e o PSD

Independentemente de alguns alertas de Marcelo Rebelo de Sousa poderem ter alguma razão, os termos em que ultimamente tem falado em público relativamente ao governo PS demonstram que o PR procederá à dissolução do Parlamento logo que sinta que o PSD ganhará as eleições. E se António Costa, considerando que os encontros semanais privados com o PR deveriam ser usados para estas pertinentes chamadas de atenção, se sentir desrespeitado e se demitir? Afinal o que pretende Marcelo?

Manuel Morato Gomes, Senhora da Hora

Águas mornas

A conversa não é fácil nem sequer muito clara. Discute-se uma eventual diluição da fronteira entre territórios políticos, uma terra de ninguém entre "esquerda" e "direita". Para João Miguel Tavares, será uma espécie de "terra prometida" que o deus do bom senso reservou aos liberais, o povo eleito. É aí que se vai construindo o discurso equilibrado merecedor de constituir o evangelho socioeconómico que nos levará à redenção enquanto projecto de sociedade. Apesar de normalmente tomar banho com água muito quente, até posso concordar com parte substancial do discurso de João Miguel Tavares.

O problema é quando a nossa reflexão é feita em abstracto, principalmente se formos pessoas com uma vida razoavelmente confortável, que, apesar da inflação e dos salários baixos, ainda conseguimos pagar as contas e ter dinheiro de sobra ao fim do mês para comprar um livro ou ir a uma sala de teatro. É que há uma multidão que não se pode dar a estes "luxos”. São os tais deserdados que nunca tiveram herança que não fosse fome e miséria. São os tais que, apesar de trabalharem, não conseguem ganhar dinheiro suficiente para pagar a renda de casa e para poder comer decentemente uma vez por outra. E o tempo é curto.

A morte de Rui Nabeiro veio lembrar a todos nós que a solução se encontra na redistribuição da riqueza. Não há que abominar o capitalismo. Há que abominar os abutres, as sanguessugas e os vampiros que se aproveitam da nossa incapacidade para encontrarmos o tal lugar sem fronteiras onde todos seremos (mais ou menos) felizes.

Rui Silvares, Cova da Piedade

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