Para onde foi o Orçamento Participativo de Lisboa?

O site do OP de Lisboa está online, como se continuasse a existir em 2023 e tivesse existido uma edição em 2022. Mas os conteúdos referem-se apenas ao OP de 2021 da anterior gestão camarária.

Em 2022, sem aviso nem pré-aviso, não tivemos aquele que era considerado um dos melhores Orçamentos Participativos (OP) de Portugal (a par do de Cascais): o OP de Lisboa. E o mesmo irá ocorrer em 2023... O facto de o PSD estar na liderança de ambas as câmaras municipais indica que podemos estar perante não um bloqueio ideológico mas estarmos a encontrar uma suspensão deliberada que, a curto prazo, poderá levar ao fim do OP de Lisboa imitando neste ocaso processos semelhantes na Europa e no Brasil que acabaram por levar a esse triste desfecho. Nada indica – ainda – que estejamos perante a execução de uma estratégia deliberada para, em Lisboa, esvaziar e provavelmente encerrar esta iniciativa participativa na cidade. Mas é preciso estarmos vigilantes.

Sei que nas Grandes Opções do Plano a Câmara Municipal de Lisboa inscreveu a intenção de "proceder a uma avaliação da exequibilidade do Orçamento Participativo de Lisboa, concretamente dos projectos aprovados nas edições da última década e ainda por concretizar, bem como rever as metodologias de implementação, monitorização e participação das próximas edições do programa".

A frase "avaliação da exequibilidade" causa alguma perplexidade: o actual executivo está a avaliar o cancelamento de alguns dos projetos que ainda não foram executados? Se sim: quais? É preciso responder a esta pergunta com transparência e considerar o impacto que isso terá no espírito participativo dos cidadãos que apresentaram e votaram nas propostas.

Por outro lado, esta frase não pode ser apresentada como algo de novo ou único: era isso precisamente que já se fazia em todas as edições do OP. Não é algo novo que vai substituir o que já existia. Se por "metodologias" se pensa em rever o processo de votação: parece-me muito bem: sempre acreditei que este devia ser revisto e, em particular, no sentido de permitir votações apenas aos moradores na cidade. De permeio, bem que se podem criar mecanismos que garantam a unicidade do voto e ponderar a introdução do voto preferencial e, sobretudo, reduzir as verbas máximas de cada projecto por forma a simplificar a sua passagem à prática e a rapidez da sua execução.

No documento das Grandes Opções do Plano encontramos, também, uma referência muito lacónica a um "retomar o orçamento participativo escolar". Esta referência é intrigante porque conheço apenas o "Orçamento Participativo das Escolas" organizado pelo Ministério da Educação, ou seja, algo que não é organizado nem financiado pela Câmara Municipal de Lisboa. A aparição da frase parece assim estar fora de contexto uma vez que este se realizaria nas escolas de Lisboa mesmo se a CML se opusesse ao mesmo... Se, pelo contrário (como é mais provável) se referem ao piloto do OP Escolar (apenas 4 propostas em 4 escolas com pouco menos de 40 mil euros: o que era pouco) então será de saudar porque dada a dimensão da verba é incompreensível porque não foram estas propostas ainda executadas.

Imune a todas estas questões e dúvidas está, contudo, o site do OP de Lisboa que continua no ar como se continuasse a existir em 2023 e tivesse existido uma edição em 2022. Mas os conteúdos referem-se apenas ao OP de 2021 ainda na altura da anterior gestão camarária: depois da tomada de posse do novo executivo o site congelou no tempo. De recordar que em 2021 o OP já tinha uma verba de apenas metade do seu valor histórico máximo de 5 milhões de euros, repartidos por dois grupos de projetos: "Propostas de projetos que envolvam empreitadas de obras públicas cujo montante seja inferior a € 150.000" e "Propostas de projetos que envolvam a aquisição ou locação de bens móveis, ou aquisição de serviços de valor inferior a €75.000" o que já era manifestamente escasso e contraditório às recomendações dos peritos internacionais.

Até 15 de Março (data em começava nas edições anteriores o ciclo participativo) a CML tem ainda tempo para lançar o ciclo participativo do OP Lisboa de 2023 mas o facto de ter inscrito apenas 50 mil euros e sob a alínea "processo" indica que não haverá OP 2023 mas apenas revisão do processo do mesmo. E se dúvidas houvesse bastava ler o documento das Opções do Plano da CML para perceber que o grande foco vai ser executar os projectos de edições anteriores e não dar continuidade ao OP em 2023. E se for lançado um OP 2023 será com que verba total? Os mesmos 2,5 milhões de euros ou num regresso aos 5 milhões? Quanto longe estará da verba de 2 a 3% de alguns OP no mundo e dos 5% do orçamento total de investimento sugeridos por alguns peritos?

Já sabemos que não tivemos em 2022 um OP em Lisboa. E que é improvável que tenhamos em 2023. Se teremos ou não nos anos seguintes é algo que depende apenas de nós – cidadãos de Lisboa – e da vontade do actual executivo. A seguir: com expectativa.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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