Há três hospitais privados que em 2021 só fizeram partos por cesariana

Taxa de cesarianas nos hospitais privados (65,9%) é mais do dobro da registada nos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde.

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Os dados agora divulgados confirmam que o padrão de altas taxas de cesarianas nos privados e do sector social persistiu em 2021 Manuel Roberto

Já se sabia que há hospitais privados que fazem quase todos os partos por cesariana. Mas esta segunda-feira a Entidade Reguladora da Saúde (ERS) publicou os dados das 61 instituições de saúde que fizeram 75.468 partos em 2021 em Portugal continental, entre públicas, privadas e do sector social, e divulgou o número e taxa de cesarianas de cada uma. E a monitorização da ERS permite perceber que em 2021 três unidades privadas fizeram 100% dos partos por cesariana — o Hospital Particular de Viana do Castelo (31 partos), o Hospital Privado da Boa Nova, em Matosinhos (23), e o Hospital Privado de Vila Real (17).

Na lista agora divulgada pela entidade reguladora destacam-se ainda outros estabelecimentos onde quase todos os partos foram feitos por cesariana — é o caso da Casa de Saúde de S. Lázaro, em Braga (60 dos 63 partos), da clínica da Santa Casa da Misericórdia de Espinho (78 dos 81 partos) e do Hospital da Luz de Aveiro (86 dos 100 partos), só para dar alguns exemplos.

Em teoria, estes perfilam-se todos como candidatos a fechar as portas, se a intenção já manifestada pelo ministro da Saúde se vier a concretizar. Em Janeiro, o ministro Manuel Pizarro disse que serão encerradas as maternidades privadas que não cumprirem as regras que a Direcção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (SNS) vai definir “até Abril”. No início do ano, em entrevista à SIC, o director executivo do SNS, Fernando Araújo, já tinha adiantado que estava em curso o trabalho de definição de “regras transversais a todo o sistema de saúde para garantir qualidade e segurança”, as quais poderiam levar ao fecho de blocos de parto privados, uma decisão que compete em última instância ao ministro da Saúde.

“Há blocos de partos privados que fazem 40 a 50 partos por ano. Fazem eventualmente um parto por semana e com taxas de cesariana de 100%. Eu tenho dúvida se serão blocos de partos ou blocos cirúrgicos, o que é bem diferente”, descreveu então Fernando Araújo, sem identificar os locais em causa.

Mas a elevada taxa de cesarianas observa-se igualmente em hospitais privados que fazem muitos partos. Os dados agora divulgados pela ERS confirmam que o padrão de altas percentagens de cesarianas nos estabelecimentos privados e do sector social persistiu em 2021, ano em que ascendeu a 65,9%, enquanto nas unidades públicas foi menos de metade (30,7%).

É um padrão que faz com que a taxa de cesarianas em geral em Portugal dispare para um total de 37,5%, muito acima do que é recomendado pela Organização Mundial de Saúde. E enquanto o tipo de cesariana mais frequente nos hospitais privados e do sector social foi a programada (49%), nos hospitais públicos as urgentes foram as mais comuns (53,9%).

Apesar de haver muitas unidades privadas a fazer partos, mais de 80% foram realizados nos hospitais do SNS (60.759), 43,4% dos quais na região de Lisboa e Vale do Tejo, e 34,5 no Norte, segundo o balanço da ERS. O Norte é a região onde há mais blocos de parto privados e do sector social.

Registadas três mortes maternas

A entidade reguladora contabiliza em 2021 também o número de óbitos fetais e neonatais (até 28 dias de vida) em Portugal continental — 321 —, um rácio de mortes por nascimento da ordem dos 0,42%, que é mais elevado nas regiões de Lisboa e Vale do Tejo (0,52%) e no Alentejo (0,45%). Segundo os dados a que a ERS teve acesso, nesse ano houve três mortes maternas em Portugal continental.

Aprofundando a análise, a ERS avaliou a acessibilidade das mulheres em idade fértil considerando os 61 blocos de parto, e levando em conta vários indicadores, como a distância das maternidades e o rácio de médicos especialistas em obstetrícia e ginecologia. Concluiu que cerca de 91% das mulheres em idade fértil usufruem de um nível de acesso “médio ou alto”, mas que para mais de 8% o acesso é “baixo” e uma franja reside mesmo a uma distância superior a 60 minutos de viagem, por estrada, um problema que se concentra sobretudo nas regiões do Norte, do Alentejo e do Algarve.

“Considerando só a oferta dos 39 centros de nascimento do SNS, a população com acesso baixo ou a uma distância excessiva altera-se muito pouco, mas a população com um nível de acesso alto reduz-se de 64% para cerca de 30%, com as regiões de saúde do Norte, Centro e Lisboa e Vale do Tejo a sofrerem as maiores alterações.” Quanto à população com nível de acesso baixo, “esta aumenta de 6,3% para 6,6%, e as mulheres que residem a uma distância excessiva (superior a 60 minutos) passa de 2,3% para 2,4%”, especifica.

Destacando que este trabalho se integra numa análise mais abrangente e aprofundada que está a realizar na área da obstetrícia, a ERS refere que vai continuar a monitorizar a prestação de cuidados de saúde “tendo por foco não apenas a realização de partos no SNS, mas também o acesso a cuidados de vigilância materno-fetal e o acesso a serviços de urgência de obstetrícia no SNS”. Com Lusa

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