Pedro Cabrita Reis: “Agora desenho mulheres porque sou um artista clássico”

Escultor e pintor abre em Águeda o ciclo O Desenho como Pensamento com o seu cabinet d’amateur, uma profusa selecção de trabalhos de desenho expandido a várias técnicas e linguagens.

neg nelson garrido - 18 janeiro 2022 - PORTUGAL, Santa Maria da Feira - Programa da Temporada Portugal-Franca - O artista plastica, Pedro Cabrita Reis (na foto), nas instalacoes da Corticeira Amorim, na apresentacao das suas esculturas, As Tres Gracas, Eufrosina, Aglaia e Talia, de cortica, que vao estar expostas no Museu do Louvre (Paris), no Jardim das Tulherias.
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Pedro Cabrita Reis junto às Três Gracas, que expôs em 2022 junto ao Museu do Louvre, em Paris Nelson Garrido
MR - Manuel Roberto - 31 de Janeiro de 2023 - Portugal - Agueda - Exposição de Pintura - O Desenho como pensamento - Cabrita Reis
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L'Origine du monde (une autre) é uma das obras de Pedro Cabrita Reis na exposição no Centro de Artes de Águeda Manuel Roberto

Em trânsito entre Menorca, onde em Junho irá inaugurar uma nova galeria com uma mostra individual, e Madrid, onde, no final deste mês, apresentará novos auto-retratos na ARCO, Pedro Cabrita Reis falou ao telefone com o PÚBLICO sobre a sua exposição em Águeda. E revelou apresentar aí alguns trabalhos inéditos, entre os quais a sua nova série dedicada às mulheres e a sua visão d’A Origem do Mundo, “d’aprés Courbet”.

Em Águeda, mostra pela primeira vez desenhos a grafite de mulheres. O que o levou a tratar agora este tema?
Porque sou um artista clássico (risos). Ao longo da história da arte, desde a época clássica até à história contemporânea, passando pela moderna, os artistas clássicos abordam muitos temas: a natureza, os retratos, os corpos… Eu desenhei esta série de mulheres, Femmes, já em 2020. Estavam nos meus armazéns, e nunca as tinha mostrado. E como gosto particularmente dessa série, decidi mandá-las emoldurar, e levei-as para Águeda. É um inédito, uma coisa que nunca tinha feito. Não sei se irei continuar, ou repetir, ou fazer outras coisas. Mas gostei de o fazer, por nenhuma razão em particular. Devo confessar que não me sinto identificado, de forma alguma, com agendas alegadamente políticas, seja de género ou outras. Organizei, aliás, na Fundação Vieira da Silva, em 2019, como curador, talvez a primeira exposição em Portugal de artistas exclusivamente mulheres, tendo sido, na altura, crucificado. Mas não sigo qualquer tipo de agenda, sigo apenas a minha vontade. Mas porque é que pintei mulheres? A história da arte está cheia de temáticas diversas, e uma delas é as mulheres: mães, mais novas, mais velhas… É um tema que me interessa.

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Série Femmes na exposição no Centro de Artes de Águeda Manuel Roberto

E continua a fazer auto-retratos.
Sim. Os mais pequenos, a aguarela, são de 2022. Durante os anos mais recentes, dediquei-me a pintar paisagens – fiz, aliás uma exposição na Galeria Miguel Nabinho [Pinturas de paisagem, Lisboa, 2021] só com elas. Mas sempre tive um retorno permanente à questão do retrato. Agora, estes auto-retratos têm um enfoque inédito, que é serem auto-irónicos. São retratos em que me represento mais como máscara do que propriamente uma representação do rosto. Desde o Verão do ano passado que tenho pintado furiosamente retratos, ou melhor, figuras, corpos, que são um desenvolvimento dos auto-retratos que estão agora em Águeda, e que já tinham alguns tons de uma certa “alucinação”. São cabeças de figuras quase enlouquecidas, esses meus novos retratos que continuo a fazer e que mostrarei, pela primeira vez, na ARCO [Madrid] no final deste mês.

Os auto-retratos serão algum exercício de introspecção?
Não. Ando a dar-me conta de que estou a envelhecer rapidamente, ao ver-me ao espelho como uma espécie de criatura, por um lado, irascível, por outro, senil, enlouquecida. E pronto.

Também mostra em Águeda a “sua” A Origem do Mundo...
Sim, e é também a primeira vez que a mostro. É uma pintura que sempre apreciei, desde muito jovem. A Origem do Mundo [1866] do Courbet é uma paisagem. Ora, tendo em conta o meu interesse pela paisagem, e pela pintura do próprio Courbet – gosto muito da pintura daquela altura, o Delacroix, o Courbet, o Degas e por aí fora... Além da história deliciosa que a envolve, passando por ter pertencido ao [psicanalista Jacques] Lacan, é uma pintura que sempre me interessou. A história de arte é um encadeado. As coisas estão sempre ligadas: para trás, para os lados e para a frente… É um entretecer de teias, caminhos, situações. Renova, volta atrás, pica, analisa, refaz, etc... Nada está fora do alcance de um artista qualquer. Veja-se, por exemplo, a magnífica sequência que o Picasso fez d’As Meninas do Velázquez. Continuo a achar interessante olhar para a história da arte e utilizá-la como informação, como aprendizagem para trabalhar, para reiniciar. Estou agora no Museu do Prado a aprender. Espero levar daqui algumas lições.

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