E para nós, jovens?

Não chegamos ao fim do mês com dinheiro, não conseguimos juntar o mínimo para termos uma almofada confortável. Não somos valorizados.

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Ben Weber/Unsplash

A precariedade ganhou um lugar tão enraizado dentro do espectro de jovens licenciados que, hoje em dia, é considerado completamente natural viver com dinheiro contado até ao fim do mês, arrendar uma casa com taxas de esforço maiores do que é suposto, inserirmo-nos no mercado de trabalho pelas portas do trabalho não qualificado, sem perspectiva de melhoria ou de valorização dos nossos conhecimentos adquiridos ao longo de anos de estudo numa determinada área.

Faço parte do grupo de jovens empregados e assalariados, entro para as estatísticas da DGES como licenciada empregada nas estatísticas do meu curso de licenciatura. Entro nessa pequena estatística para dizer que em 100, somos 96,3 empregados, o que não é negativo — mas em que condições e em que áreas? Das pessoas que conheço desse tempo, incluindo-me aqui, não há uma pessoa que exerça funções na nossa área de especialização.

Dir-me-ão os mais arrojados e irmãos da descrença em cursos superiores, que um curso em Estudos Portugueses não abre portas para nada. Neste momento, junto-me a eles e a minha descrença une-se com a da maioria das pessoas, mas não me consigo conformar.

Inseri-me no mercado de trabalho em part-time, numa multinacional de hotelaria e restauração fast food no final do curso, como tantos outros que trabalham para “ganhar um trocos”. Hoje sou subchefe de operações nesse mesmo estabelecimento, a par com o desenvolvimento da dissertação de mestrado.

Apesar de pertencer a um grupo restrito de jovens que têm um vínculo laboral a termo incerto, com um cargo intermédio de chefia, num país onde se torna tão difícil trabalhar, não me considero nem sortuda nem estável.

Não chegamos ao fim do mês com dinheiro, não conseguimos juntar o mínimo para termos uma almofada confortável. Não somos valorizados. Tentamos iniciar a nossa vida e mal conseguimos pagar a electricidade, a água, a renda, a alimentação.

A incerteza une-se à descrença, que se une à precariedade. Por ter dito que me encontro num cargo intermédio de chefia, muitos pensarão que talvez o salário não seja mau, talvez as condições sejam boas e encontro-me aqui a escrever sobre precariedade sem razão nenhuma.

Licenciei-me numa área de letras, da cultura, da literatura e da língua e por mais que queira não existem cargos dentro da minha área onde me aceitem para trabalhar. Ora por não ter experiência, ora por só ser licenciada, ora por não aceitar estágios não remunerados (porque todos temos contas para pagar), ora por ter 24 anos e a minha experiência laboral ser nesta multinacional.

Entretanto, o meu salário vai descer. Vou passar a receber em média menos dez euros do que recebia até à data, por causa da actualização dos escalões de IRS. Com o Governo a aclamar a subida do salário mínimo e a actualização dos escalões, é incompreensível como passarei a receber menos dez euros dentro do meu salário que fica abaixo dos salários médios nacionais.

Mas dez euros nem seria muito com a subida do subsídio de alimentação. Pois, pasmem-se: não recebo subsídio de alimentação. A minha empresa, tal como tantas outras nesta área, alega que nos garante alimentação diária em género. Numa cadeia de fast food. Irónico.

A nossa experiência no mercado de trabalho não tende a melhorar, não tem perspectiva de mudança nem de crescimento.

Para quem, como eu, se vê preso a um vínculo laboral precário que não nos traz garantias nem satisfação, mas que quer manter-se aqui, no país onde cresceu e sempre viveu, que tanto estudou para trabalhar numa área completamente diferente e não especializada, o futuro tem de passar por nós.

A nossa voz não pode ser do conformismo e de olharmos para o nosso futuro sem perspectiva e com esta descrença que se nos põe à frente dos olhos.

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