Em Espanha, o desemprego jovem está a diminuir (e os contratos a melhorar)

Alteração laboral feita há nove meses pelo Governo socialista espanhol está a reverter as medidas que facilitavam a contratação e o despedimento.

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Em Espanha, o desemprego jovem está a diminuir Desola Lanre-Ologun/Unsplash

Uma reformulação nas leis laborais de Espanha levou a um aumento de 142% de jovens trabalhadores com contrato de trabalho efectivo, num país onde as taxas de desemprego e subemprego têm estado entre as mais altas da Europa desde a crise financeira global.

O aumento é uma prova de que a alteração laboral feita há nove meses pelo Governo socialista está a reverter as medidas que facilitavam a contratação e o despedimento e que tinham entrado em vigor depois da crise de há uma década — as regras foram elogiadas na altura como as responsáveis por colocar o país numa situação de baixo custo e competitiva, mas também foram criticadas por minarem direitos dos trabalhadores e levarem muitos jovens espanhóis a emigrar.

As taxas de desemprego jovem, que chegaram a mais de 55% nos anos depois da crise financeira, caíram para 31% no terceiro trimestre — contra uma taxa de desemprego geral de 12,6%, de acordo com o Gabinete Nacional de Estatística.

O desemprego jovem é um problema crónico nos países do sul da Europa. Um em cada quatro jovens estava desempregado em Itália durante o Verão, de acordo com o Eurostat.

Os números do Eurostat mostram também que em Portugal a taxa de desemprego jovem se fixa nos 15,9%, mais alta do que a média europeia, que está nos 13%. Também por cá este número baixou e ficou abaixo dos valores registados antes da pandemia.

A Grécia, onde as taxas de desemprego jovem são semelhantes às de Espanha, quer reduzir a taxa de desemprego para 18% em 2030 e está a apresentar verbas para despesas com pensões e saúde para reduzir os custos laborais, bem como programas de formação especiais.

Ainda que as taxas de desemprego jovem tenham melhorado em Espanha com a recuperação económica depois da crise financeira, no Verão de 2021 sete em cada dez jovens com menos de 24 anos tinham um contrato temporário. A taxa caiu 13 pontos percentuais no terceiro trimestre de 2022, depois dos novos regulamentos laborais, tornando a Espanha melhor neste campo do que economias mais ricas, como os Países Baixos ou a Itália.

“Tenciono poupar dinheiro”

A revisão laboral, negociada com empregadores e sindicatos e introduzida em Março acabou com a maioria dos trabalhos temporários, numa tentativa de criar estabilidade laboral e reduzir a taxa de desemprego. Antes, os empregadores usavam os contratos temporários como uma rede de segurança em tempos de crise.

"Encontrar um apartamento vai ser mais fácil agora", disse Cristina Garcia, 24 anos, que conseguiu o seu primeiro contrato efectivo como recepcionista numa multinacional em Madrid, em Setembro.

O caso de Cistina é anormal em Espanha, onde apenas 4% das pessoas entre os 16 e os 24 anos conseguiram sair da casa dos seus pais na primeira metade de 2022, de acordo com o Conselho da Juventude de Espanha. Segundo o Eurostat, a média da União Europeia é sair de casa aos 26,5 anos, um ano mais cedo se forem mulheres; em Portugal, o país da UE em que os jovens saem mais tarde de casa dos pais, tal só acontece aos 33,6 anos.

Ainda assim, os jovens dizem que as coisas estão a mudar.

Depois de cinco anos a trabalhar como informático numa empresa de tecnologia em Madrid, Sami Khalaf, 28 anos, assinou o seu primeiro contrato efectivo em Fevereiro. "Tenciono poupar dinheiro, vejo as coisas de forma diferente", disse Khalaf, que saiu da casa dos pais há alguns meses.

Contratos estáveis podem aumentar a confiança do consumidor e a vontade de gastar, referiu Raymond Torres, economista do grupo de investigação Funcas, em Madrid. Torres afirmou que a força do mercado espanhol tem sido um dos pilares da inesperada resiliência económica do país durante um período de fraqueza global.

Antes da reforma laboral, a taxa de contratos temporários, que na última década esteve em cerca de 25% dos trabalhos, resultou numa mudança de panorama nos empregos, contribuindo para a taxa de desemprego geral.

"Temos que acabar com a ideia que a introdução de jovens no mercado de trabalho tem de ser feita através de contratos instáveis", afiançou Joaquin Perez-Rey, secretário de Estado do ministério do Emprego e Economia Social — o gabinete que desenhou a mudança laboral, à Reuters.

As reformas laborais de Março incluíram uma cláusula controversa que tornava mais fácil a atribuição de contratos efectivos a trabalhadores sazonais como os do turismo e agricultura. Esses trabalhadores estão elegíveis para benefícios quando não estão a trabalhar, mas não são contabilizados como desempregados, uma vez que podem ser chamados a qualquer altura pelo seu empregador.

O número destes chamados contratos de trabalho intermitentes, assinados por pessoas com menos de 24 anos, cresceu cinco vezes até Novembro, sendo essa a faixa etária como uma das que mais tinham esse tipo de contratos.

"Se isto é melhor ou pior do que ter vários contratos de trabalho temporários é debatível", disse Miguel Angel Malo, professor de Economia da Universidade de Salamanca, referindo-se aos contratos intermitentes.

O sistema de licenças espanhol, introduzido na maioria do mercado laboral durante a pandemia, também impulsionou a contratação efectiva, afirmou Adrian Todoli, professor de direito laboral da Universidade de Valência.

"Os empregadores agora sabem que podem confiar nestes mecanismos se houver uma crise, como aconteceu com a pandemia", referiu Todoli.

Cristina Garcia diz que o seu contrato de quatro horas e meia diárias dá-lhe o suficiente para começar a procurar um apartamento com o seu companheiro. "Quero trabalhar aos fins-de-semana para ganhar um pouco mais, mas fiz as contas e conseguimos."

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