Milhares de professores na rua: “É incrível esta adesão. A classe despertou”

O líder do Stop diz-se surpreendido com a adesão à manifestação de professores. Ministro diz que uma “mentira” de André Pestana esteve na base desta manifestação.

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Milhares de professores estão concentrados em frente à Assembleia da República Daniel Rocha

Milhares de professores juntaram-se este sábado à tarde no largo da Assembleia da República, em Lisboa, o destino final de uma manifestação que partiu do Marquês de Pombal e encheu as ruas da capital.

Estão na rua a dizer "não" e a exigir "respeito" pela sua profissão. No geral são mais jovens do que os participantes que costumam marcar presença nas manifestações das grandes organizações sindicais. E também mais autónomos, aguerridos e diversificados.

Não há bandeiras de sindicatos, mas abundam os cartazes improvisados em folhas de papel e pedaços de cartão: "Professores unidos jamais serão vencidos"; "Sou professora, só peço o que me falta há muito tempo: respeito"; "Professores em união para salvar a educação"; "Não à municipalização". De repente aparecem lenços brancos (de papel) nas mãos de quase todos os presentes. Acenam como eles como quem diz adeus, enquanto uma atrás de outra se repetem as palavras de ordem visando o ministro João Costa: “Demissão”; “Está na hora, está na hora, de o ministro ir embora”; “Vai-te embora”.

André Pestana, líder do Sindicato de Todos os Profissionais da Educação (Stop), que marcou a manifestação, disse ao PÚBLICO que foi "completamente surpreendido por esta adesão tão grande". "É incrível. E com tanta garra, porque a classe despertou", salientou.

Esta manifestação é o culminar de uma semana de greve convocada pelo Stop. E daqui saíram duas decisões. A primeira é a de manter todos os pré-avisos de greve para as próximas semanas, entre 17 e 23 de Dezembro, 26 e 31 de Dezembro e também de 2 a 6 de Janeiro. Sendo que ficou nas mãos das escolas a decisão de avançar ou não com a paralisação. Para dia 27 de Dezembro está marcado um encontro nacional para decidir como será a feita a greve em Janeiro, quando as aulas arrancarem para o início do 2.º período.

Os alunos também marcaram presença. Francisco, um aluno de 13 anos, do Porto, discursou para os milhares de manifestantes: "Não sei quando o mundo vai acabar, mas sei que a escola pública devia existir até esse momento. Estou aqui por todos os professores, que é a profissão mais importante de todas."

Desilusão com os sindicatos tradicionais

Foi a perspectiva avançada pelo Ministério da Educação que poderia haver concursos a nível municipal que funcionou como gota de água para Maria, educadora de infância numa escola de Massamá, Sintra. "Se isso acontecer a autonomia dos professores é posta em causa", explica. Tem outras reclamações, como a contagem integral do tempo de serviço que foi congelado na altura da troika e foi tudo isto que a levou a sair à rua neste sábado.

Nenhum dos outros sindicatos de professores se fez representar na manifestação e, por mais que uma vez, sobraram vaias para o líder da Federação Nacional de Professores, Mário Nogueira.

“Os professores estão muito desiludidos com os sindicatos [tradicionais], comenta Ricardo Silva, professor há 34 anos e dirigente de um dos movimentos independentes que surgiram na contestação a Maria de Lurdes Rodrigues. “Há compromissos muitos obscuros. No tempo da gerigonça praticamente não houve acções de rua, quando esta acabou voltaram logo. E isto não pode ser, a luta dos professores não pode ser comandada de fora”, justifica.

Frisando que aquilo que transmite é “o sentir de quem está no terreno”, este docente de História testemunha que existe “um grande cansaço entre os professores”. “É o que se sente mais na sala de professores”.

Ao contrário de outras greves convocadas pelas principais estruturas sindicais de professores, os docentes não desapareceram das suas escolas durante a acção que decorreu entre 9 e 16 de Dezembro, último dia do 1.º período. Concentraram-se frente aos portões, fizeram cordões humanos, empunhando cartazes improvisados e tentando esclarecer os pais sobre as razões deste protesto.

Ministro diz-se "animado"

O ministro da Educação, João Costa, foi recebido com fortes vaias nas escolas que visitou nesta semana e acabou a apelidar o dirigente do Stop André Pestana de “mentiroso”, garantindo que não há um processo de municipalização em curso. "Isso é falso. O líder do sindicato que convoca esta greve sabe que é falso. Já lhe foi dito olhos nos olhos que é falso, mas ele insiste em mentir e por isso só podemos repudiar uma campanha assente na mentira, na desinformação e na manipulação da opinião dos professores", afirmou.

Ao PÚBLICO, André Pestana disse que o ministro "vai ter de responder na justiça" pelo insulto. "Mas a melhor resposta é esta", afirma, apontando para o mar de gente que tem à frente.

Em entrevista ao programa 360 da RTP3 após a manifestação, João Costa disse que está “animado e com vontade de continuar o trabalho que tem sido feito de valorização da vida dos professores”. E apontou como uma das razões para a manifestação de sábado a “campanha de mentiras” que circulou pelas redes sociais, dando conta de que os professores iriam passar a ser contratados pelas câmaras municipais. “O dirigente sindical que convocou esta manifestação estava determinado a mentir”, repetiu de novo dirigindo-se a André Pestana, coordenador do Sindicato de Todos os Professores.

As duas maiores estruturas sindicais de professores, Fenprof e FNE, e outros oito sindicatos independentes não aderiram a esta greve, que segundo o líder da Federação Nacional de Professores, Mário Nogueira, é uma acção “absolutamente radicalizada”. Esta plataforma sindical optou inicialmente por convocar uma manifestação para 4 de Março, mas entretanto ameaçaram já convocar uma greve de 18 dias, por distritos, no início do 2.º período lectivo se o ministério não recuar em algumas das propostas para a revisão do modelo de recrutamento e mobilidade.

Notícia actualizada às 21h30. Acrescenta declarações de João Costa à RTP3

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