A contínua violação dos direitos humanos em Marrocos

O relatório da Human Rights Watch é avassalador: percorre as várias técnicas de vigilância ilegal intimidação, fabricação de provas, prisões arbitrárias, tortura e julgamentos injustos.

Marrocos foi ontem submetido pela 4.ª vez a um dos mecanismos mais relevantes do Conselho de Direitos Humanos da ONU: o Exame Periódico Universal em matéria de Direitos Humanos. Serão conhecidas adiante as conclusões da sessão sobre a situação do país que é responsável pela proteção e a promoção dos Direitos Humanos dentro das suas fronteiras internacionalmente reconhecidas e no território não autónomo do Sara Ocidental, que ocupa ilegalmente desde 1975.

O que distingue a atual situação é sobretudo a intensificação da violação de Direitos Humanos em Marrocos e no Sara Ocidental, a sua sofisticação por parte dos aparelhos repressivos do Estado e a impunidade com que os seus responsáveis são beneficiados.

O relatório da Human Rights Watch é avassalador: percorre as várias técnicas de vigilância ilegal (com, entre outros, o uso alargado do programa de espionagem Pégasus), intimidação, fabricação de provas (incluindo de natureza sexual e financeira), prisões arbitrárias, tortura e julgamentos injustos. E chama a atenção para que às vagas sucessivas de repressão da imprensa independente, que deixou de existir, e dos respetivos jornalistas, se junta, como face da mesma moeda, um “eco-sistema mediático” apoiado, protegido e utilizado pelo regime para intimidar, caluniar e semear a confusão, tanto interna, como externamente.

Embora na Constituição marroquina de 2011 esteja consagrado que “o poder judiciário é independente do poder legislativo e do poder executivo”, o primeiro mantém-se sob o controlo do regime através do funcionamento do Conselho Superior do Poder Judiciário, presidido pelo Rei, que tem o poder de nomear metade dos seus membros, e que é o chefe do poder executivo.

Relativamente ao Sara Ocidental, o facto de ainda não se ter respeitado o direito à autodeterminação, como determinam a Carta e as resoluções fundacionais da ONU, constitui a primeira violação de Direitos Humanos. Em consequência, os casos dos presos políticos saharauis, em particular os do chamado “grupo de Gdeim Izik”, que foram condenados a pesadíssimas penas por crimes que não cometeram e continuam a ser alvo de represálias nas prisões marroquinas onde se encontram, a longas distâncias das suas famílias; os dos jovens jornalistas e ativistas que têm desaparecido, sido intimidados, presos e torturados; o da ativista e defensora dos Direitos Humanos Sultana Khaya, mantida com a sua mãe e irmã em prisão domiciliária, sem qualquer acusação, entre novembro de 2020 e junho deste ano, onde foi periodicamente agredida, violada, despojada de alimentação e água potável, pelas forças de segurança marroquinas, falam por si e têm merecido a atenção internacional.

Não é por acaso, e constitui um verdadeiro escândalo, que Marrocos continue a barrar sistematicamente o acesso ao território ocupado do Sahara Ocidental a jornalistas, investigadores, juristas, advogados, parlamentares de todo o mundo e à própria ONU, como reconhece o último relatório de António Guterres ao Conselho de Segurança (3/10/2022): “O Gabinete do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (OHCHR) não pôde realizar quaisquer visitas ao Sara Ocidental pelo sétimo ano consecutivo, apesar de múltiplos pedidos.”

As autoras escrevem segundo o novo acordo ortográfico

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