Como Alberto I do Mónaco elegeu o mar profundo açoriano como laboratório natural

Centenário da morte de Alberto I vai ser comemorado com visita a Portugal do actual Príncipe do Mónaco. Antigo monarca fez várias expedições ao mar dos Açores produzindo uma grande quantidade de informação científica importante até hoje.

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Nas suas expedições ao Açores, Alberto I estudou os cetáceos Rui Soares

O príncipe Alberto I do Mónaco (1848-1922) e as suas ligações com Portugal e os Açores vão ser recordadas durante uma visita do Príncipe Alberto II do Mónaco a Portugal, esta semana. Alberto I, que foi príncipe do Mónaco entre 1889 e 1922, elegeu o mar profundo dos Açores como laboratório natural. Esse interesse permitiu um conhecimento científico “sem paralelo”, deixando “um lastro de informação científica extremamente relevante e actual”, diz Filipe Porteiro, do Instituto de Investigação em Ciências do Mar – Okeanos, da Universidade dos Açores.

“No fundo, os Açores eram um jardim de águas profundas para o príncipe”, explica o investigador, recordando o bisavô de Alberto II do Mónaco, que realiza uma visita a Portugal, com passagem por Ponta Delgada, nos Açores, e por Lisboa, na quinta e na sexta-feira, para assinalar o ano do centenário da morte de Alberto I.

O mar dos Açores foi a região de eleição para os trabalhos do bisavô de Alberto II, avança Filipe Porteiro. Entre 1885 e 1915 Alberto I comandou 29 campanhas oceanográficas em quatro navios, 13 das quais nos Açores.

As viagens decorreram ao longo de 30 anos e “o mar das ilhas foi estudado vezes sem conta, por todos os seus navios”, relata Filipe Porteiro. “O príncipe veio aqui de forma regular e sistemática. E a equipa dele, constituída pelos melhores cientistas da época, investigou tudo, em profundidade, desde os cetáceos, as caravelas-portuguesas, até aos corais, esponjas, passando pelos peixes mais exóticos do oceano profundo.”

“Hoje, muita da nossa investigação assenta também no conhecimento produzido por ele e pela sua equipa”, acrescenta o investigador, destacando que o príncipe fez nos Açores inúmeras “descobertas”, cuja “dimensão” só recentemente se percebeu.

A última campanha oceanográfica de Alberto I do Mónaco foi uma pequena viagem no Mediterrâneo em 1915. A I Guerra Mundial impossibilitou-o de prosseguir, refere Filipe Porteiro, autor de publicações sobre a importância das campanhas oceanográficas do príncipe para o conhecimento do Mar dos Açores.

Em 1896, numa das campanhas oceanográficas realizada aos Açores, o príncipe monegasco descobriu, a sudoeste das ilhas do Faial e do Pico, o banco Princesa Alice. Trata-se de “o maior banco de pesca dos Açores”, segundo Filipe Porteiro, uma descoberta reconhecida de grande importância por oferecer novos recursos pesqueiros à frota açoriana, e reconhecida pelo Rei D. Carlos. Seis anos mais tarde, o príncipe localizou a fossa do Hirondelle, com a profundidade máxima de 3200 metros, situada entre as ilhas Terceira e S. Miguel.

Ciência e amizades

“O príncipe teve quatro navios ao seu serviço. Foi sempre melhorando a sua frota, até em termos tecnológicos, o que permitia aceder a fundos de cinco mil metros de profundidade”, explica o especialista.

Além de pioneiro na exploração do oceano profundo, os Açores foram também “o local de eleição” na questão da meteorologia. O coronel português Afonso Chaves foi o seu principal colaborador, além de amigo do príncipe. Com o apoio científico do príncipe, Afonso Chaves criou um serviço de meteorologia na região.

O príncipe “era uma pessoa multifacetada e com uma empatia muito grande”, realça Filipe Porteiro, salientando que tinha nos Açores “muitos amigos”, tendo incluído na sua equipa açorianos. Segundo o investigador, essa ligação aos Açores “ainda perdura”, já que Ricardo Serrão Santos, ex-ministro do Mar e investigador na área de biologia marinha da Universidade dos Açores, é o vice-presidente do comité científico do Instituto Oceanográfico do Mónaco, recorda.

O Departamento de Oceanografia e Pescas da Universidade dos Açores possui uma base de dados com a informação zoológica publicada nos resultados das campanhas do príncipe.

Na quinta-feira, Alberto II vai ser recebido por Pedro Nascimento Cabral, presidente da Câmara de Ponta Delgada, na praça Gonçalo Velho Cabral e, acompanhado por José Manuel Bolieiro, presidente do Governo Regional açoriano, visita no Museu Carlos Machado a exposição temporária Albert I - Príncipe do Atlântico│O Príncipe Albert I de Mónaco e os Açores, antes de uma reunião com o chefe do executivo.

Na sexta-feira, em Lisboa, no Museu de Marinha, o monarca participa na inauguração de uma exposição de homenagem aos laços entre o príncipe Alberto I do Mónaco (1848-1922) e o Rei D. Carlos I de Portugal (1863-1908). A mostra, intitulada O Amigo Oceanógrafo Alberto I do Mónaco e Portugal 1873-1920, é organizada pelo Comité Alberto I - 2022, propondo um percurso inédito dedicado aos laços entre o monarca monegasco e Portugal.

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