Os filhos ficam mesmo bem quando os deixamos no jardim-de-infância?

É importante que toda a gente assuma que para uma criança e que para os seus pais ir para a creche/escola (mesmo que não seja a primeira vez) representa uma grande transição.

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Existem crianças para quem a adaptação à creche ou jardim-de-infância não se faz em apenas dois ou três dias @design.sandraf

Ana,

Preciso das competências de quem estudou educação de infância e recebeu muitas crianças num primeiro dia de jardim-de-infância para me ajudar a perceber aquela frase com que se procuram consolar os pais dos filhos que ficam na escola/creche a chorar.

A que frase me refiro? “Ah, depois, ele ficou óptimo”, como se mal dobrássemos a esquina tudo se resolvesse.

Deixá-los naquela angústia parte-nos o coração e estraga-nos o dia, mas a verdade é que, na maioria dos casos, quando chegamos para os ir buscar estão mesmo bem.

O que se passa realmente naquelas horas?


Querida Mãe,

Como educadora disse essa frase tantas vezes, mas como mãe senti-a de uma maneira completamente diferente. Este ano, o Jardim Infantil o Pinhão fez uma publicação que me tocou especialmente, e que começava com “Dias duros estes... Dias duros para as crianças e para nós”, referindo-se aos primeiros dias de escola.

Tocou-me porque, na maior parte dos casos – como em tantos outros assuntos — julgamos que se só dissermos coisas positivas, só sentiremos coisas positivas. Que se dermos espaço à dor, à zanga e ao descanso (que, curiosamente, entra na lista das coisas “perigosas”), vamos ficar zangados, doídos para sempre, e se pararmos cederemos à preguiça eterna.

É importante que toda a gente assuma que para uma criança e que para os seus pais ir para a creche/escola (mesmo que não seja a primeira vez) representa uma grande transição. Sim, mãe, há miúdos que adoram ir e se adaptam lindamente e garanto-lhe que os pais desses miúdos vão também adorar a escola porque – sejamos honestos – quem é que não precisa de umas horas longe deles, desde que se saiba que estão felizes e contentes?

Mas existem crianças para quem a adaptação não se faz em apenas dois ou três dias. E, dentro desse grupo, há de facto aqueles que se angustiam no momento físico da separação, mas logo de seguida entram numa de “longe da vista, longe do coração”, e que ficam então verdadeiramente entusiasmados e entretidos.

Para outros, vai sendo por ondas ao longo do dia – quando estão mais cansados ou aborrecidos, ou por exemplo aparece a mãe de um outro menino e começam a chorar ou ficam mais calados.

E há os casos mais extremos, em que estão aflitos todo o dia. Mas aqui é que está o cerne da questão: os pais adoram quando os seus filhos estão bem e adoram ouvir que, depois, ficou bem. Ao contrário de teorias conspirativas nenhum pai fica ofendido ou com ciúmes. Desenganem-se, estamos cansados demais!

Mas o fundamental é que a afirmação corresponda à verdade e não seja apenas dita para “calar” a ansiedade dos pais. E mais: temos de saber que a educadora está, de facto, a “ver” o nosso filho e não apenas a assumir que só porque parou de chorar “está bem”. Quando temos a sorte de a educadora dos nossos filhos ser assim, quando nos diz “Depois ficou bem!”, é um alívio enorme e ajuda-nos a ter mais força para os momentos, naturais, mas por vezes angustiantes, de choro durante a despedida.

Beijinhos!


O Birras de Mãe, uma avó/mãe (e também sogra) e uma mãe/filha, logo de quatro filhos, separadas pela quarentena, começaram a escrever-se diariamente, para falar dos medos, irritações, perplexidade, raivas, mal-entendidos, mas também da sensação de perfeita comunhão que — ocasionalmente! — as invade. E, passado o confinamento, perceberam que não queriam perder este canal de comunicação, na esperança de que quem as leia, mãe ou avó, sinta que é de si que falam.

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