Rio Ave afunda um FC Porto que deixa fugir a liderança

Vila-condenses mostraram grande competência a explorar debilidades do FC Porto e uma tremenda eficácia a finalizar. “Dragões” deixam fugir liderança da Liga à 4.º jornada.

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Guga e Bruno Costa num lance disputado a meio-campo Reuters/PEDRO NUNES

É raro o FC Porto sofrer três golos. É mais incomum ainda se forem na Liga portuguesa. É quase inédito se forem de uma equipa que luta para não descer. E mais estranho ainda quando essa equipa aproveita quase tudo o que cria. Mas o Rio Ave fez da quimera uma realidade e bateu o FC Porto, neste domingo, por 3-1.

Com este resultado, os portistas, com menos um ponto do que o Sp. Braga e em igualdade com o Benfica, podem deixar os “encarnados” (jogo em atraso) escaparem na tabela, enquanto o Rio Ave soma a primeira vitória no campeonato.

O resultado, que muitos considerariam roçar a utopia, construiu-se com alguns desenhos tácticos interessantes do Rio Ave a explorarem limitações do sistema portista, mas também com uma eficácia brutal da equipa de Luís Freire. Em suma, viu-se um “cocktail” de competência e eficácia extremas dos vila-condenses.

O Rio Ave chegou ao intervalo a vencer por 3-0 quando o valor de golos esperados (xG) lhe daria, em tese, apenas 0,7 – prova de que os vila-condenses marcaram golos cuja probabilidade de sucesso era baixa, ao contrário do FC Porto, que desperdiçou lances de alta hipótese de sucesso, nomeadamente um penálti.

Dedo de treinador

O Rio Ave levou para este jogo um 5x4x1 que facilmente se transformava em 3x4x3, com muita presença ofensiva. E a via era quase sempre semelhante: saída curta com dois centrais bem abertos, obrigando o trio pressionante do FC Porto (Taremi, Pepê e Evanilson) a esticar-se muito em largura – algo que, por exemplo, o Sporting não conseguiu fazer.

Com a primeira linha de pressão portista tão larga, o Rio Ave alternava duas saídas: ou ligava por dentro (e corria o risco de numa perda ter a defesa muito aberta, mas, correndo bem, obrigava o FC Porto a dar espaço entre sectores promovido pela falta de acompanhamento dos médios portistas), ou saía com os alas, seduzindo os laterais portistas a “abafarem” em pressão. Aí, abria-se espaço atrás dos laterais do FC Porto, que depois era explorado insistentemente.

Fosse por qualquer destas vias, os vila-condenses foram tendo vários lances de transições, até porque a principal limitação de qualquer 4x4x2 losango é a dificuldade de defender a largura sem criar espaço excessivo na zona central.

Esta leitura táctica, que poderia ter corrido mal em caso de perdas em zona de construção, acabou por correr bem no plano ofensivo. Aos 22’, o Rio Ave conseguiu essa ligação interior após atrair Otávio à pressão e um passe vertical desmontou todo o bloco portista, descoordenado.

Ronaldo saiu em apoio frontal e arrastou Pepe, deixando livre o espaço do central para aparecer Aziz a finalizar. Este foi, curiosamente, um desenho parecido com um que Conceição muito explorou nos anos em que tinha Marega e Aboubakar/Soares.

Aos 33’, uma perda do FC Porto em zona defensiva voltou a ter aproveitamento do Rio Ave, que teve Pedro Amaral a finalizar ao segundo poste num cruzamento em que João Mário defendeu muito por dentro e não foi compensado a preceito por Bruno Costa.

Pouco habituado a ter tantos adversários atrás dos seus médios, o FC Porto estava com clara dificuldade em segurar o Rio Ave, tendo, ofensivamente, dificuldade em fazer ligações interiores – Otávio, essencial neste sistema, esteve muito apagado e a equipa praticamente só criava lances por cruzamentos e bolas paradas (Evanilson teve até um golo anulado por fora-de-jogo).

Até que aos 43’ uma segunda bola ganha pelo Rio Ave permitiu a Pedro Amaral ganhar a dividida com João Mário e cruzar para a cabeça/ombro de Aziz.

Apesar de ter mais bola e de rematar mais, o FC Porto estava a contas com uma eficácia brutal do Rio Ave, que não justificava três golos, mas justificava, pelo menos, a vantagem pela forma como interpretou as lacunas do sistema portista – prejudicado também pela parca intensidade, com o FC Porto algo apático sem bola (o GoalPoint diz mesmo que a equipa nunca tinha feito apenas uma falta na primeira parte deste que Conceição é treinador).

FC Porto com criativos

Para a segunda parte já não regressaram Bruno Costa, Evanilson e João Mário, mas entraram Galeno, Verón e Martínez. O FC Porto levava, assim, o jogo para um plano mais técnico, contando com o natural recuo do Rio Ave.

Galeno criou vários lances, um dos quais que acabou, aos 60’, com mão na bola e penálti assinalado por sugestão do VAR. Bateu Taremi e a bola foi à trave. Nada corria bem ao FC Porto, nem mesmo quando as probabilidades estavam a favor, e este momento tirou claramente o ímpeto que a equipa mostrava desde que tinha saído das cabines.

Além da descrença, ter “desbloqueadores”, apesar de colocar a equipa mais imprevisível pela via individual, também a coloca mais refém da inspiração dos craques e pouco colectiva na forma de atacar.

Essa anarquia levou o jogo para o prisma do desespero em vários momentos, com o FC Porto a apostar mais no número de atacantes do que no engenho para os utilizar da melhor forma – até porque um 3-0 para recuperar não é convidativo a grandes demoras na criação de jogadas.

E pouco mais se passou a nível de oportunidades claras de golo, mesmo com a crescente presença ofensiva do FC Porto. Só aos 90+3’ os portistas reduziram, num cabeceamento de Martínez, até porque Jonathan já tinha salvado uma outra oportunidade do espanhol.

Esse ímpeto ainda lançou a dúvida, sobretudo num lance falhado por Otávio em boa posição, mas era demasiado tarde.

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