Notou um olhar vago? Isto é o que vai conseguir se perguntar ao paciente se tem banda larga

Perguntar aos utentes sobre o acesso às tecnologias e a fiabilidade dos seus sistemas digitais não é suficiente nem esclarecedor para o médico.

Foto
As pessoas estão primeiro que tudo, mesmo onde há o digital Adriano Miranda

Provavelmente, se o utente não for um perito ou conhecedor do mundo digital, se estiver longe das idades das gerações Millenial, Z ou Alpha, ficará a olhar para o médico com um estranho olhar vago — “Mas o que é que ele/a quer dizer com isso de banda larga?”

Vale sempre a pena medir a literacia em saúde dos nossos pacientes, para ver se eles conseguem aceder, compreender e usar a informação que o profissional de saúde lhe transmite, mas temos de avançar com mais capacidade para os rastreios da literacia digital.

Muito se tem refletido sobre a saúde digital. As palavras ecoam de forma contínua, como que um rugido de necessidade premente, impaciente e permanente para o mundo da inteligência artificial, realidade aumentada e realidade virtual que se instala todos os dias nas nossas vidas. Mas há ainda muito a fazer, não apenas para medir essa satisfação ou insatisfação, mas para saber e adaptar ao que os pacientes efetivamente desejam para a sua saúde. E sobretudo para a sua melhor adesão e decisão responsável e acertada.

Perguntar aos utentes sobre o acesso às tecnologias e a fiabilidade dos seus sistemas digitais não é suficiente nem esclarecedor. É preciso criar estratégias para os envolver e avaliar a sua relação com os novos gadgets e com a Internet. Pergunte-lhes antes por estes 10 pontos, se efetivamente desejar criar uma conexão de maior de continuidade com o ambiente digital e um acesso à saúde através do digital:

1) Se tem um telemóvel onde possa fazer o download de uma aplicação (uma app);

2) Se usa e-mail e qual é o mais atual;

3) Se consegue descarregar uma aplicação;

4) Se consegue navegar nessa aplicação ou num site orientador para a sua saúde;

5) Se, por acaso, consegue mexer na câmara do telemóvel (e se tem efetivamente câmara);

6) A que horas prefere ser contactado;

7) Se não lhe faz diferença terem uma conversa por telefone de seguimento de um determinado problema (desde que possa ser seguido à distância);

8) Se lhe poderá interessar receber uma informação e um link com mais dados;

9) Se prefere que grave diretamente a sua voz com alguma informação sobre a sua saúde, medicação ou cuidados;

10) Se, no final disto tudo, também prefere uma boa regularidade do contacto presencial.

Esta preocupação do acesso à saúde digital já resultou de um estudo feito com um grupo de investigadoras — no qual me incluo — com o título “Saúde Digital em Tempo de Pandemia”. Neste trabalho foram medidas as perceções de cerca de 300 participantes sobre a relação com o digital antes e durante a pandemia. Os resultados andaram muito próximos de todos os estudos feitos a nível internacional e aprendemos que as pessoas querem a relação e a conexão interpessoal, mesmo que estejam numa relação de saúde digital.

As pessoas estão primeiro que tudo, mesmo onde há o digital, com os seus conhecimentos, muitas vezes básicos, mas suficientes para estarem aptas a fazer novas aprendizagens, adquirirem novos conhecimentos, capacidades e modelarem as suas atitudes num caminho em que certamente o olhar será menos vago.

Mas a verdade é que literacia em saúde, com a sua preocupação enorme em conseguir fazer compreender, aceder e usar de forma ajustada os recursos de saúde, fortalece todas as partes envolvidas na prestação de melhores cuidados promotores de saúde e preventivos da doença.

É preciso apostar na literacia em saúde.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

Sugerir correcção
Comentar