Galatrixa: um vinho do acaso e de um chef

Um branco orgulhoso de ser madeirense, nasceu nos jardins de um pequeno hotel com vista para o mar. É a primeira incursão do chef Octávio Freitas nos vinhos, mas não será a última.

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O chef e agora produtor de vinho Octávio Freitas a vindimar nos socalcos da Calheta. André Ferreira

Era para ser uma casa de férias, depois evoluiu para uma pequena unidade hoteleira, cresceu como enoturismo e agora tem um “filho”, o Galatrixa.

O primeiro vinho da Octávio Freitas Winery, é um branco produzido a partir de castas tipicamente madeirenses – o Verdelho, a Malvasia Fina e o Folgasão –, que nasceu apressado. “Estas vinhas foram plantadas em 2020, e um ano depois já deram três toneladas de uvas”, espanta-se o chef Octávio Freitas, que em gestos largos, irrequietos, que parecem abraçar a sala do Desarma, o restaurante de fine dining que lidera no hotel Four Views Baía, no Funchal, conta a história deste Galatrixa.

Primeiro, o nome: nasce de uma troca de letras da palavra lagartixa, um pequeno lagarto endémico do arquipélago madeirense. Um regionalismo que pretende vincar a identidade madeirense deste vinho. “Ela é a primeira a provar as uvas, é por isso natural que dê o nome ao vinho”, ri-se o produtor, que se socorreu da consultadoria do enólogo Tito Brazão e do engenheiro agrónomo Gonçalo Caldeira para concretizar “este sonho”. “Sempre me interessei por vinhos. Foi sempre uma coisa que quis fazer e agora estão aqui 1750 garrafas”, diz, pensando já nos próximos membros da família Octávio Freitas Winery: o Cagarra Branco e o Massaroco Rosé. Serão três mil garrafas do primeiro, à volta de duas mil do segundo. Mas já lá vamos.

Os socalcos onde nasceu este Galatrixa, a 200 metros do mar. DR
Galatrixa é um regionalismo linguístico de lagartixa, uma espécie endémica do arquipélago da Madeira. Sandra Costa / BRAVA
O rótulo tem relevo, a fazer lembrar a pele de uma lagartixa. Sandra Costa / BRAVA
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Os socalcos onde nasceu este Galatrixa, a 200 metros do mar. DR

O Galatrixa nasce por acaso. Em 2016, Octávio Freitas adquiriu uma propriedade agrícola com cerca de um hectare na Calheta (30 Km a Oeste do Funchal). A ideia, conta ao Terroir, era construir uma casa de férias, como tantas outras que existem naquela zona. “O terreno estava em socalcos e, à medida que foi sendo desmatado, percebi que existia ali muito potencial”, recorda. A casa de férias passou assim a ser um projecto de uma unidade hoteleira, próxima da natureza, e nasceu o Socalco Nature Calheta.

O espaço é uma reserva agrícola, o que obrigava a cultivar 80 por cento do terreno. O que plantar? Bananeiras? Não. “Decidi plantar vinha, e aqui estamos”, diz, vincando que o Galatrixa é totalmente produzido com uvas dos jardins do Socalco Nature Calheta. “Os terrenos estavam a descansar há anos, e isso ajuda a explicar uma produção destas logo no primeiro ano”, refere, acrescentando: “tenho muito orgulho neste vinho, que está intimamente associado ao Socalco”. Mas a sério que foram plantadas em 2020? É “incrível”, diz o chef, mas assim foi.

As 2700 videiras foram plantadas uma a uma pelo chef executivo do Four Views Hotels, que posicionou o vinho numa gama média-alta. A garrafa custa 48 euros e, para lá do rótulo com relevo a fazer lembrar a pele de uma lagartixa, do vidro 100 por cento reciclado e da rolha de cortiça totalmente natural, oferece – seguindo a nota de prova – um vinho cristalino com coloração cítrica, com um ligeiro herbáceo que vai buscar à casta Verdelho. Com uma acidez presente, mas equilibrada, o Galatrixa mostra-se fresco, envolvente e bastante persistente na boca. É produto de uma exposição solar extrema, que nasce junto ao mar (ali a menos de 200 metros) e que durante a noite, graças ao desenho da encosta, guarda o calor do dia.

“É uma estufa natural”, sintetiza Octávio Freitas, que, entretanto, adquiriu outras vinhas, uma na Boaventura (costa Norte da ilha) e outra ali ao lado, nos Prazeres, de onde saíram o Cagarra Branco (Verdelho e Malvasia Fina) e o Massaroco Rosé, feito a partir de Tinta Negra.

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