Dar à luz em cenário de guerra, na última maternidade que resiste, em Donetsk

Há sacos de areia empilhados diante das janelas do centro materno-infantil de Pokrovsk, a 40 quilómetros da linha da frente da guerra, no Leste da Ucrânia. “Já aconteceu várias vezes assistirmos a partos durante bombardeamentos”, contou um médico à Reuters. O número de partos de bebés prematuros disparou desde o início da guerra.

Viktoriya Sokolovska, de 16 anos, no interior da maternidade, em Donetsk, Ucrânia. Ela deu, entretanto, à luz uma menina saudável que baptizou de Emília MARKO DJURICA/REUTERS
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Viktoriya Sokolovska, de 16 anos, no interior da maternidade, em Donetsk, Ucrânia. Ela deu, entretanto, à luz uma menina saudável que baptizou de Emília MARKO DJURICA/REUTERS

A apenas 40 quilómetros da linha da frente da guerra, em Donetsk, mantém-se em funcionamento a única e última maternidade de toda a região que ainda está sob controlo ucraniano. No interior do edifício, em Pokrovsk, dezenas de mulheres enfrentam a natural ansiedade pré-parto e o stress provocado pela guerra, na iminência de um ataque que tenha capacidade de destruir o edifício e as vidas nele contidas. Diante das janelas do centro materno-infantil, há sacos de areia empilhados. “Já aconteceu várias vezes assistirmos a partos durante bombardeamentos”, refere o médico obstetra Ivan Tsyganok, em entrevista à Reuters.

Katya Buravtsova, de 35 anos, tem no colo o filho quando a Reuters visita a maternidade, a 13 de Julho. Illiusha nasceu prematuro, após parcas 28 semanas de gestação. “Teria zero chances de sobrevivência se não fosse pelo centro”, garante o médico Tsyganok. “Tomámos conta dele 24 horas por dia.” Se não tivesse dado à luz na maternidade, Buravtsova “podia ter tido o parto num celeiro”, à semelhança de outras mulheres da cidade Kurakhove, que foi bombardeada.

O nascimento prematuro de Illiusha ainda é uma excepção à regra, na Ucrânia, mas a tendência está a inverter-se. Desde o início da guerra, a 24 de Fevereiro, 19 dos 115 bebés que nasceram na maternidade, em Pokrovsk​, foram prematuros — uma taxa de 16,5%. A Organização Mundial da Saúde estima que, em anos anteriores, a mesma taxa rondava os 9%. Associados ao stress causado pelo conflito estão outros problemas na gestação, nomeadamente a insuficiência placentária, que consiste numa transferência deficitária de oxigénio e nutrientes da mãe para o feto.

Viktoriya Sokolovska, de 16 anos, aguardava o momento de dar à luz quando a Reuters visitou Pokrovsk​. “A guerra está a deixar-me muito nervosa”, lamentou. Temia que o seu nervosismo afectasse o bebé, mas tal não aconteceu. Emilia nasceu perfeitamente saudável.

Fachada da Maternidade de Pokrovks, em Donetsk, leste da Ucrânia. O centro serve uma população de 340 mil pessoas, de acordo com dados fornecidos à Reuters pelo governo regional de Donetsk
Fachada da Maternidade de Pokrovks, em Donetsk, leste da Ucrânia. O centro serve uma população de 340 mil pessoas, de acordo com dados fornecidos à Reuters pelo governo regional de Donetsk MARKO DJURICA/REUTERS
Sacos de areia estão empilhados diante das janelas da Maternidade
Sacos de areia estão empilhados diante das janelas da Maternidade MARKO DJURICA/REUTERS
Médico Ivan Tsyganok, 56 anos, no interior da Maternidade de Pokrovsk, em Donetsk. Tsyganok teme que o stress causado pela guerra conduza a um aumento de partos prematuros - um medo que é sustentado pelos dados perliminares de um estudo que foi partilhado com a Reuters
Médico Ivan Tsyganok, 56 anos, no interior da Maternidade de Pokrovsk, em Donetsk. Tsyganok teme que o stress causado pela guerra conduza a um aumento de partos prematuros - um medo que é sustentado pelos dados perliminares de um estudo que foi partilhado com a Reuters MARKO DJURICA/REUTERS
Katya Buravtsova, 35 anos, pega no colo o seu filho Illiusha no interior da Maternidade. O bebé nasceu prematuramente, após 28 semanas de gestação
Katya Buravtsova, 35 anos, pega no colo o seu filho Illiusha no interior da Maternidade. O bebé nasceu prematuramente, após 28 semanas de gestação MARKO DJURICA/REUTERS
Bebé Illiusha descansa na Maternidade onde nasceu prematuro, com apenas 28 semanas de gestação. Graças a uma incubadora e aos cuidados recebidos no hospital, ele encontra-se de boa saúde
Bebé Illiusha descansa na Maternidade onde nasceu prematuro, com apenas 28 semanas de gestação. Graças a uma incubadora e aos cuidados recebidos no hospital, ele encontra-se de boa saúde MARKO DJURICA/REUTERS
Maria descansa no interior da Maternidade Pokrovsks, na região de Donetsk. Os médicos notam que o stress provocado pelo conflito tem impacto sobre a gravidez
Maria descansa no interior da Maternidade Pokrovsks, na região de Donetsk. Os médicos notam que o stress provocado pelo conflito tem impacto sobre a gravidez MARKO DJURICA/REUTERS
O médico Ivan Tsyganok, 56, no seu gabinete, na Maternidade de Pokrovsk. "Às vezes temos de assistir o parto durante bombardeamentos", diz o médico à Reuters. "O parto é um processo que não pode ser interrompido"
O médico Ivan Tsyganok, 56, no seu gabinete, na Maternidade de Pokrovsk. "Às vezes temos de assistir o parto durante bombardeamentos", diz o médico à Reuters. "O parto é um processo que não pode ser interrompido" MARKO DJURICA/REUTERS
Uma enfermeira no interior da cozinha da Maternidade de Pokrovsk. As salas de parto são afastadas das paredes exteriores do edifício
Uma enfermeira no interior da cozinha da Maternidade de Pokrovsk. As salas de parto são afastadas das paredes exteriores do edifício MARKO DJURICA/REUTERS
Enfermeiras no interior da Maternidade, que fica a 40 quilómetros de distância da frente de guerra mais próxima
Enfermeiras no interior da Maternidade, que fica a 40 quilómetros de distância da frente de guerra mais próxima MARKO DJURICA/REUTERS
Elena Derdel, 33 anos, vigia a sua filha Vanhelia no interior da Maternidade. Desde 24 de Fevereiro, quando estalou a guerra, 19 em 115 bebés nasceram prematuros - uma taxa (16,5%) mais alta do que nos anos anteriores
Elena Derdel, 33 anos, vigia a sua filha Vanhelia no interior da Maternidade. Desde 24 de Fevereiro, quando estalou a guerra, 19 em 115 bebés nasceram prematuros - uma taxa (16,5%) mais alta do que nos anos anteriores MARKO DJURICA/REUTERS
Katia Morozova, 29 anos, segura no colo a sua filha Evgenia, no interior da Maternidade, em Donetsk
Katia Morozova, 29 anos, segura no colo a sua filha Evgenia, no interior da Maternidade, em Donetsk MARKO DJURICA/REUTERS
Marina Tupata, 26 anos, observa a sua bebé Sofia, com seis dias de vida, a ser examinada pelos médicos no interior da Maternidade
Marina Tupata, 26 anos, observa a sua bebé Sofia, com seis dias de vida, a ser examinada pelos médicos no interior da Maternidade MARKO DJURICA/REUTERS
Irina Budakova, 24 anos, segura nos braços o seu filho de dois dias, que ainda não tem nome
Irina Budakova, 24 anos, segura nos braços o seu filho de dois dias, que ainda não tem nome MARKO DJURICA/REUTERS
Iryna Salamatina, 36 anos, beija o filho Anton, no interior da Maternidade
Iryna Salamatina, 36 anos, beija o filho Anton, no interior da Maternidade MARKO DJURICA/REUTERS